Salvar as companhias aéreas não é questão de protecionismo ou ideologia

Enquanto Brasil patina no socorro às companhias, EUA e Alemanha anunciam ajuda

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Salvatore Milanese

O setor de transporte aéreo de passageiros, um dos mais castigados pela pandemia, é a expressão do que de mais moderno e insubstituível a economia globalizada produziu.

Segmento estratégico, gigantesco e vital, pois não só permite a qualquer cidadão do mundo circular pelos continentes como é essencial para viabilizar o comércio e a logística mundiais.

No ano passado, as dez maiores companhias aéreas transportaram mais de 1,5 bilhão de passageiros, empregaram mais de 850 mil pessoas e faturaram US$ 357 bilhões.

Ante a pandemia, o governo alemão não teve dúvidas em tomar a frente para salvar a Lufthansa, pois já tinha separado € 100 bilhões para socorrer empresas do país.

Sétima maior companhia no mundo em passageiros transportados —145 milhões em 2019 —, a Lufthansa faturou US$ 43 bilhões no ano passado, dando lucro e empregando 135 mil funcionários. Mas, com a pandemia assolando a Europa, deixou no chão 95% de seus 760 aviões e começou a perder € 1 milhão por dia, ameaçando demitir milhares de funcionários.

O WSF, fundo de apoio à economia, fez um pacote de € 9 bilhões para evitar que a companhia pedisse concordata. A ajuda prevê emissão de € 300 milhões em novas ações, a serem compradas pelo governo, que assume participação de 20% na empresa e passa a ter dois assentos no conselho de administração, vetando a distribuição de dividendos e colocando limites aos salários e bônus da diretoria.

Some-se ainda uma injeção de € 5,7 bilhões, sem direito a voto, para ajudar a empresa a reposicionar o caixa.

O banco público alemão KfW ainda encabeçou a estruturação de empréstimo sindicalizado, com o prazo de três anos, para suprir capital de giro no valor de € 3 bilhões. Com essa atitude, o governo alemão deixou claro que não vai deixar a Lufthansa, antes da pandemia saudável e lucrativa, perecer ou ser comprada a “preço de banana”.

Com um volume de menos de US$ 1 bilhão a ser dividido entre as três maiores companhias aéreas brasileiras, o pacote louvável do BNDES é insuficiente, porque ainda não dá para prever o tamanho do buraco em suas contas.

Tampouco parece razoável pensar que o mercado possa colocar 40% desse valor. A que taxa? Quanto tempo vai levar para levantar esse dinheiro?

Sem dor e sem ideologia, a alternativa é fornecer o caixa de que precisam. Adicionalmente, o governo poderia dar dinheiro para capital de giro até a situação se estabilizar e se tornar sócio, saindo quando o mercado se estabilizar e as ações voltarem a crescer. A salvação dessa parte importante da logística brasileira não pode depender do mercado.

Enquanto o Brasil patina no socorro às companhias, em abril os EUA disponibilizaram US$ 25 bilhões para dez empresas aéreas. Grande parte será injetada nas companhias desde que não demitam e outra virá na forma de empréstimo de longo prazo, a taxas baixíssimas, dando ao governo americano bônus de subscrição de ações para lucrar com a alta das ações quando o mercado se recuperar.

Os casos europeu e americano ilustram bem como governos centrais decidem atuar para proteger interesses estratégicos, postos de trabalhos e a estabilidade da economia de seus países.

O que acontecerá com um país de extensões continentais como o Brasil, por exemplo, se as maiores companhias aéreas brasileiras quebrarem? Como dimensionar o impacto na economia? A população acabaria isolada do mundo até que as linhas de conexão (slots) fossem reestabelecidas, quem sabe até por concorrentes estrangeiras?

Salvar as empresas aéreas brasileiras não é uma questão de protecionismo ou ideologia. Existe tecnologia financeira comprovada e segura para agir, e rapidamente, nesses casos extremos. Não há mais tempo a perder!

Salvatore Milanese

Sócio fundador da Pantalica Partners

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