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Coronavírus, o debate econômico

Trump quer punir a China devido ao coronavírus

Iniciar uma nova fase de guerra comercial em meio a uma retração econômica global e uma pandemia, não nos parece muito inteligente

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Roberto Dumas Damas Daniel Passos Miraglia

Essa pandemia tem afetado a economia da maioria dos países e também tem sido um argumento fértil para novas ameaças entre EUA e China. É bem provável que as nações sairão da mesma mais nacionalistas, protecionistas e populistas.

Nas últimas décadas, a China tornou os EUA maiores e logrou manter vivo “o sonho americano”. Várias empresas norte-americanas e outras multinacionais, foram para a China fazer "outsourcing" ou simplesmente manufaturarem seus produtos lá a um preço bem mais barato e depois reexportá-los para os EUA. Isso possibilitou que as famílias norte-americanas tivessem um poder de compra maior, dado o acesso a produtos mais baratos.

Não estamos dizendo que os norte-americanos não deveriam dar suporte as empresas locais. Mas existem diferentes formas de fazer isto. Ajudar um segmento econômico, que não é mais competitivo, garantindo 100 mil empregos em detrimento de 328 milhões de norte-americanos, que teriam de comprar bens mais caros se produzidos localmente, não nos parece eficiente.

Donald Trump e Xi Jinping durante evento em Pequi, - Nicolas Asfouri - 11.out.19/AFP

Será que se a Apple produzisse seus equipamentos 100% nos EUA, alguém compraria um iPhone por US$3.000? O mesmo raciocínio é válido para Tesla, ou a enorme presença da Starbucks na China, além de milhares de empresas norte-americanas e outras internacionais que estão no país asiático.

Difícil acreditar que alguém do PCChinês ou outra instância do governo chinês tenha colocado uma arma na cabeça desses presidentes de empreas norte-americanas obrigando-os a montarem suas plantas de manufaturas na China. Isso foi uma decisão dos próprios norte-americanos. Quer Trump goste ou não.

Os EUA iniciaram uma guerra comercial com a China, assim que Trump tomou posse, para diminuir seu déficit comercial. Ora, déficit comercial não se diminui com políticas fiscais expansionistas, como as estabelecidas por Trump.

Quando uma nação poupa menos e apresenta maiores déficits fiscais, acabará enfrentando maiores déficits externos. Desde que Trump assumiu, nota-se claramente que as importações vindas da China diminuíram, mas as importações vindas do México e do resto do mundo aumentaram.

Agora Trump quer impor tarifas/sanções adicionais na China, como forma de punição pela Covid-19. Independente do vírus ser proveniente de laboratório ou da natureza, o que muito provavelmente nunca será completamente esclarecido, uma nova escalada das tensões comerciais entre EUA e China poderá enterrar de vez uma recuperação em V da economia mundial.

A China responderá com as armas econômicas que tem, incluindo aqui uma possível desvalorização de sua própria moeda frente ao dólar e um possível rompimento da fase 1 do acordo comercial fechado no final de 2019.

Iniciar uma nova fase de guerra comercial em meio a uma retração econômica global e uma pandemia, não nos parece muito inteligente. No entanto, temos plena consciência de que em política e em política econômica, nem sempre a inteligência é vencedora. Nosso cenário base de protecionismo, nacionalismo e populismo, ao que parece, já está ganhando força mesmo antes do fim da pandemia. Infelizmente, isso não é nada bom para a economia mundial.

Roberto Dumas Damas

É professor de economia do Insper, mestre em economia pela Universidade de Birmingham, na Inglaterra, e mestre em economia pela Universidade Fudan, na China

Daniel Passos Miraglia

Mestre em Finanças pela Business School São Paulo e pela Fundação EOI da Espanha

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