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Dólar alto e demanda fazem agrotóxicos ilegais avançarem no Brasil

Entidades veem aumento do contrabando proveniente do Paraguai como ameaça à saúde

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Ribeirão Preto

As fronteiras do Brasil com o Paraguai ficaram fechadas a maior parte do ano passado devido à pandemia, mas seja por meio de grandes carregamentos ou mesmo por pequenos contrabandistas, cada vez mais agrotóxicos ilegais têm invadido o país.

Para o mercado, isso tem ocorrido devido à forte produção da agricultura nacional e, em 2020, à forte alta apresentada pelo dólar, que impulsionaram o contrabando, que entra no país principalmente pelos estados do Paraná e Mato Grosso do Sul, seguindo rota já feita pelo tráfico de drogas e de armas e os atravessadores de cigarros ilegais.

Dados de associações de combate ao contrabando e de órgãos de segurança mostram como tem se dado esse incremento da ilegalidade nas fronteiras brasileiras.

A PRF (Polícia Rodoviária Federal) apresentou, durante um seminário sobre o cenário nas regiões fronteiriças, dados que mostram que as apreensões de agroquímicos chegaram a 90 toneladas até outubro, ante as 60 toneladas de todo o ano de 2019. Houve também altas em apreensões de armas, cigarros, cocaína, maconha e de veículos.

Já um levantamento do FNCP (Fórum Nacional Contra a Pirataria e a Ilegalidade) mostra que o prejuízo anual do setor produtivo nacional tem crescido devido ao avanço do mercado ilegal, que já ocupa o sexto posto no ranking de contrabandos.

Enquanto em 2017 a soma das perdas do setor produtivo e da evasão fiscal chegou a R$ 3,1 bilhões, o montante alcançou R$ 8,9 bilhões no ano seguinte e R$ 11,23 bilhões, em 2019. Com isso, fica atrás apenas de vestuário, higiene pessoal (perfumaria e cosméticos), combustíveis, bebidas alcoólicas e cigarros.

“A justificativa sempre é preço. O produto legal paga imposto e tem de ter certificação de órgãos reguladores, enquanto o ilegal ignora tudo isso. Dependendo da composição, ele fica mais barato ainda, porque burla inclusive a composição correta”, disse o presidente do FNCP, Edson Vismona.

O crescimento nas entradas irregulares de agrotóxicos no país é visto por ele como algo “extremamente sensível” para a saúde. “A gente simplesmente não sabe o que está na nossa mesa. Os produtos regulados não são regulados por acaso.”

É um mercado que, de acordo com agentes de segurança ouvidos pela Folha, se profissionalizou a partir de 2009, com a entrada de grandes contrabandistas.

E esse crescimento tem sido refletido em operações policiais e de órgãos governamentais nos últimos anos no país.

imagem mostra agrotóxicos dentro de embalagens plásticas
Parte de lote de 100 kg de agrotóxicos apreendidos em operação em Pato Bragado (PR) - Divulgação/PF

Só no Paraná, as apreensões de agrotóxicos pela PRF nos últimos dois anos somaram 24,2 toneladas.

Em fevereiro, nos fundos falsos de um carro, a PRF apreendeu 70,6 quilos de agrotóxicos com um homem de 70 anos em Ibiporã (PR).

Ele comprou a carga em Salto del Guayra, no Paraguai, por US$ 1.600 (R$ 6.946, pelo câmbio médio da época), e revenderia o quilo da substância por R$ 250 em Assaí (PR) --o que resultaria em R$ 17.650.

Outros mil litros de agrotóxicos foram apreendidos em outubro em Santa Terezinha de Itaipu, também no Paraná, por policiais militares.

Em dezembro, a PF (Polícia Federal) fez operação no noroeste do estado para desarticular uma quadrilha que atuava no contrabando de cigarros e agrotóxicos. Foram apreendidos 900 quilos de agrotóxicos, além de 1.200 caixas de cigarros.

Já o Ministério da Agricultura coordenou uma ação que resultou na apreensão de 6,1 toneladas, também no Paraná, em 2019, na operação Westcida. Nove pessoas foram presas e as multas aplicadas passaram de R$ 1 milhão.

Em duas ações entre setembro e outubro de 2020, 79 toneladas de fertilizantes e 37 mil litros de agrotóxicos ilegais (fraudados e contrabandeados) foram descobertos.

Quase a totalidade (77,4 toneladas de fertilizantes e 31,8 mil litros de agrotóxicos) foi encontrada em operação conjunta com a PRF em Rondonópolis (MT), em setembro.

No mês seguinte, houve, segundo o ministério, a primeira ação nacional conjunta entre os programas de vigilância em defesa agropecuária para fronteiras internacionais e de segurança de fronteiras e divisas na região de Ponta Porã e Dourados (MS), que apreendeu 5.236 litros e 1,6 tonelada de agrotóxicos ilegais.

Além das questões tributárias envolvendo o contrabando de agrotóxicos, um grande risco para a saúde é o desconhecimento da origem e do manuseio desses químicos, na avaliação de Luciano Stremel Barros, presidente do Idesf (Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras).

Isso porque, normalmente, as substâncias são transportadas de forma concentrada e diluída apenas no destino do produto.

“Uma diferença no contrabando dos agrotóxicos é que eles chegam à mesa das pessoas sem que elas tenham a menor ideia da origem. O dólar alto impulsionou essa tentativa de baratear custos e isso tudo é muito preocupante”, disse.

O avanço do contrabando mostra também que o fato de as fronteiras terem sido fechadas —foram reabertas em outubro— foi pouco representativo frente ao cenário do mercado ilegal.

A maioria das grandes cargas passam pelo lago de Itaipu, e não por locais como a Ponte da Amizade, onde a fiscalização é constante.

Apesar disso, e de a ponte ter ficado fechada por quase sete meses, foram feitas no ano passado 62 apreensões em Foz do Iguaçu e Guaíra, ambas cidades fronteiriças, segundo a Receita Federal.

Mesmo na área de abrangência da delegacia de Foz do Iguaçu a queda geral de apreensões foi de apenas 3% no acumulado até outubro, com um total de produtos irregulares que somam R$ 444,5 milhões.

Vismona alega que, embora tenha havido muitos avanços nas ações coordenadas nas fronteiras, o lago de Itaipu precisa ser controlado, para que seja possível combater com mais eficiência o contrabando.

De acordo com o Ministério da Agricultura, as operações têm sido integradas com agências estaduais de defesa agropecuária, secretarias estaduais da Agricultura, órgãos ambientais e polícias.

Agrotóxicos ilegais são produtos proibidos, que entram de forma clandestina no país ou falsificados, roubados e vencidos, conforme o ministério.

Já a avaliação da PRF é a de que houve investimentos em tecnologia e a contratação de novos agentes, que têm permitido o avanço da fiscalização.

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