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Bioeconomia brasileira no centro do mundo

Nossos olhos para o amanhã não podem se descuidar das respostas fundamentais do agora

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Paulo Hartung

Presidente-executivo da Ibá, membro do conselho do Todos Pela Educação, ex-governador do Estado do Espírito Santo (2003-2010/2015-2018)

Marcello Brito

Presidente da ABAG (Associação Brasileira de Agronegócio)

Em uma época de emergência climática, estamos vivenciando o surgimento de um novo mundo, que exige ações consistentes, claras e integradas entre países, empresas e sociedade, no sentido de criar soluções concretas para os desafios da construção de um futuro sustentável.

Nossos olhos para o amanhã, no entanto, não podem se descuidar das respostas fundamentais do agora, especialmente no Brasil, como os gritantes problemas da crise da pandemia, os crimes ambientais na região amazônica, a situação dos povos tradicionais que ali vivem, abaixo da linha da pobreza, e o imperativo da geração de emprego e renda para os brasileiros, principalmente os jovens.

O cidadão, que nasce nesta nova dinâmica planetária, ambientalmente mais consciente e preocupado com o futuro, exige ações. Por isso, a realização no Brasil da quarta edição do Fórum Mundial da Bioeconomia (World Bioeconomy Forum) não poderia ser mais emblemática e oportuna.

Após três edições na Finlândia, trabalhamos em conjunto para que o Brasil fosse o centro do debate de uma nova economia, mais verde e mais sustentável. É muito simbólico a Amazônia ser a sede do maior evento sobre bioeconomia do mundo. Face a uma imagem ambiental arranhada, esse gesto mostra que o País tem em seu DNA o protagonismo para liderar a discussão e, assim, traduzir potencial em ganhos para sua população.


Cabe reconhecer o esforço do Estado do Pará em viabilizar essa parceria que o torna anfitrião de evento internacional inédito na Amazônia. No coração da floresta, o encontro, que reunirá pesquisadores, investidores e organizações da sociedade, haverá de iluminar tema tão premente e que pode, em seu ensejo, ajudar a frear o desmatamento que vem ocorrendo.

É a chance de mostrar o nosso diferencial para o mundo, ao mesmo tempo em que podemos endereçar soluções para esta região que vive um lamentável paradoxo. Embora represente 60% do território nacional com natureza de inestimável riqueza, abriga mais de 25 milhões de brasileiros que vivem com baixo IDH, em meio a um enorme déficit de infraestrutura básica, como saúde, saneamento, educação e comunicação.

A bioeconomia tem o extraordinário potencial de mudar esse cenário. Cuidamos do meio ambiente, deixando de lado o antigo modelo predatório de se fazer negócios, e cedemos espaço ao desenvolvimento sustentável, que oferece amplo leque de opções para a sociedade.

Pode trazer empregos e melhoria de renda ao povo, assim abrindo caminho para o crescimento da região e, consequentemente, o avanço do País. A Associação Brasileira de Bioinovação (ABBI) estima que o Brasil tenha um potencial adicional ao seu PIB de US$ 53 bilhões por ano, com o mercado verde.

Não é preciso reinventar a roda, mas identificar e potencializar tudo aquilo que já existe de positivo. A própria região amazônica já conta com produtos e moléculas que são destaques mundiais, desenvolvidos com base em pesquisas na floresta, inclusive por centros de excelência como a Embrapa que tem nove unidades na Amazônia Legal, para as áreas farmacêuticas, cosmética e alimentícia, dentre outras.

Alguns exemplos mais conhecidos são os insumos e óleos amazônicos para o setor cosméticos, a frutas e amêndoas tropicais como a castanha do Brasil, o dendê, o cupuaçu e o açaí. Este último ganhou o mundo e, atualmente, movimenta US$1 bilhão por ano.

Um incrível case é do cacau, que tem na Amazônia, mais precisamente no Pará o maior produtor nacional. De exportador desse produto o Brasil passou a ser importador. Hoje, com a implementação de modelos de SAF —sistemas agroflorestais com o cacau mostram a potencialidade de crescimento dessa indústria como um exemplo socioambiental ao mundo, envolvendo indígenas, quilombolas e cooperativas como o projeto da Cooperativa Agrícola Mista de Tomé-Açu (Camta), que conseguiu uma inédita certificação de origem ao cacau brasileiro, com todo o sistema rastreado, assegurando a produção sustentável da cadeia.

Além desse potencial, o Brasil também já ostenta histórico de projetos de bioeconomia fora da região amazônica. Há outros trabalhos de muito sucesso fincados na economia verde e consolidados com muito investimento em tecnologia e inovação, como são os casos da cana-de-açúcar e do eucalipto.

Pioneiro no uso de biocombustíveis, o Brasil alcançou a posição de segundo maior produtor mundial de etanol. No Brasil, 45% da matriz energética é renovável, enquanto a média mundial é de 3%. E o setor sucroalcooleiro está trabalhando para ampliar esse indicador, com o Renovabio e a negociação das CBios, onde cada título representa uma tonelada de carbono de emissão evitada ao comercializar biocombustíveis no lugar daqueles de base fóssil.

O setor de árvores cultivadas, por sua vez, movimenta 1,2% do PIB nacional e tem os olhos voltados para o futuro. Planta, colhe e replanta, comumente em terras antes degradadas pela ação humana. Oferecem mais de 5 mil produtos e subprodutos, entre os quais papéis, pisos laminados, celulose, viscose, biocombustível, carvão vegetal.

As empresas brasileiras de papel e celulose são voluntariamente certificadas pelos principais selos internacionais, algumas há mais de 20 anos, na vanguarda do que hoje conhecemos como ESG (social, meio ambiente e governança, na sigla em inglês).

São exemplos que geram renda, fortalecem a economia, conservam o meio ambiente e colocam o Brasil como destaque mundial nestes segmentos. Mas o crescimento de atos ilícitos na Floresta Amazônica, por mais distante que estejam das positivas operações antes mencionadas, fragilizam o Brasil no tabuleiro global e subtraem vantagens competitivas daquelas empresas que atuam dentro da lei, preservando o meio ambiente, cuidando dos colaboradores e das comunidades vizinhas.

Já vemos diversos movimentos internacionais questionando as cadeias de fornecimento, como em consultas públicas europeias, nos trabalhos preparatórios da COP26, como no Diálogo Florestal, Agricultura Comércio de Commodities (FACT) e o recém-criado Forest Positive Coalition of The Consumer of Goods de empresas de bens de consumo preocupadas com seus fornecedores e o desmatamento.

As notícias indicam, inclusive, que o presidente dos EUA, Joe Biden, assinará uma ordem executiva para que o governo revise suas cadeias de fornecimento.

O Brasil tem cases de bioeconomia já reconhecidos, possui uma imensa riqueza natural, profissionais e tecnologia de ponta para liderar essa virada verde. Temos credenciais de sobra: a maior floresta tropical do planeta; a maior biodiversidade do mundo; um potente e sustentável agronegócio que alimenta 1,2 bilhão de pessoas mundo afora e produz fibras, como celulose para tecidos, embalagens, tissues e papel, consumidos por 3 bilhões de pessoas.

Exportamos tecnologia do etanol de cana e produzimos aço verde, a partir de carvão vegetal. Nessas frentes e com uma matriz energética que é das mais limpas, contribuímos no combate às mudanças climáticas e ajudamos a construir a economia de baixo carbono.

Precisamos de ações concretas para reverter a imagem ambiental internacional do Brasil. Para isso, é necessário estabelecer metas e brecar o desmatamento, prioritariamente.

Paralelamente, combater as queimadas e a grilagem de terras, para, então, pavimentar caminho sólido de crescimento, hoje, da economia do amanhã, incluindo o povo amazônico e criando empregos para a juventude nacional. Que o Fórum Mundial de Bioeconomia no Brasil seja um ponto de convergia e a retomada de um modelo ESG de desenvolvimento dentro das expectativas da sociedade nacional e internacional.

​Nos vemos em Belém.

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