Argentina e Uruguai brigam por flexibilização da tarifa na comemoração de 30 anos do Mercosul

País se isola mais ainda, pois Brasil e Paraguai também defendem revisão da regra

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Buenos Aires

A Argentina destoou dos demais países-membros do Mercosul ao rejeitar uma flexibilização da Tarifa Externa Comum (TEC), demanda de Brasil, Uruguai e Paraguai, na abertura da cúpula que merca os 30 anos do bloco, nesta sexta (26).

O presidente argentino, Alberto Fernández, afirmou que "não crê nesse instrumento" e propôs a formação de comissões para estudar o assunto.

As reações de Brasil e Paraguai foram duras, mas diplomáticas, enquanto o presidente do Uruguai, Luis Lacalle Pou, afirmou de modo mais enfático que "o Uruguai não tem tempo" e que "precisa destas mudanças".

Visivelmente irritado, Fernández retomou a palavra ao final da rodada de discursos e afirmou que "não quer ser um peso para ninguém". "Acabemos com essas ideias, se creem que o Mercosul é uma âncora, que saiam do barco e tomem outro. Para mim é uma honra ser parte do bloco."

As propostas de flexibilização do bloco serão debatidas em abril, num encontro de chanceleres, com a Argentina como anfitriã.

Presidente argentino Alberto Fernandez em cerimônia em homenagem às vítimas da ditadura; nesta sexta, ele abriu o encontro do Mercosul
Alberto Fernandez em cerimônia nesta semana que homenageou as vítimas da ditadura; nesta sexta, ele abriu o encontro do Mercosul - Juan Mabromata/AFP

Fernández abriu o encontro reforçando a "dificuldade de governar" dos países do bloco por conta da pandemia e seus efeitos na economia. Com relação à flexibilização da TEC, o mandatário disse: "não acreditamos que a redução da tarifa externa comum seja o instrumento para resolver os nossos problemas".

Fernández afirmou que a proposta do país é que a redução aconteça "por meio de uma revisão racional e pragmática, com maior objetividade e com a preocupação para a geração de empregos". "O sentido de nossa integração é construir uma agenda comum."

Já o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) disse que "a regra de consenso não pode ser uma arma de veto permanente", defendendo a revisão da TEC.

 O presidente Jair Bolsonaro ao lado dos ministros Paulo Guedes e Ernesto Araújo durante a reunião de Cúpula do Mercosul
O presidente Jair Bolsonaro ao lado dos ministros Paulo Guedes e Ernesto Araújo durante a reunião de Cúpula do Mercosul - Marcos Corrêa/PR

O presidente brasileiro destacou a importância da revisão das taxas comuns do bloco, proposta pelo Brasil, e afirmou que deseja ver isso sendo discutido em breve. Bolsonaro defendeu que os "resultados [da mudança] devem ser os de atrair investimentos e renda, para que possamos participar nas cadeias mundiais de valor, e superar com urgência as dificuldades da pandemia".

Lacalle Pou também afirmou que as mudanças devem ocorrer rápido. "O Uruguai precisa muito avançar no sentido dessa flexibilização. Não há tempo de formar comissões, o mundo vai mudando muito rápido. Precisamos fazer isso com o Mercosul, mas com mais velocidade", disse.

Além do presidente uruguaio, os demais chefes de estado também rebateram a ideia de criação de comissões e novas discussões, pedindo celeridade ao pedido de flexibilização do Mercosul.

Pou também falou que a lentidão do bloco foi a responsável pela demora no fechamento do acordo do Mercosul com a União Europeia, cobrando a resolução dos obstáculos que travam as negociações.

Em resposta, Fernández tomou a palavra ao final da rodada de discursos e reagiu às críticas dos demais países. "Não quero ser a âncora de ninguém", disse, referindo-se a Lacalle Pou. O presidente argentino afirmou que, se para o uruguaio o Mercosul parece ser uma carga, "é melhor que abandone o barco".

A crise sanitária foi foco da fala do presidente paraguaio, Mario Abdo Benítez, que pediu colaboração entre os países para conseguir mais vacinas.

"A quantidade de vacinas que temos em nossos países é hoje ínfima diante das necessidades. Precisamos agir juntos para evitar a tragédia que essa pandemia vem sendo para nossos países", defendeu.

O presidente do Chile, Sebastián Piñera, afirmou que o processo de vacinação é fundamental, mas pediu "que os países continuem tratando do enfrentamento da pandemia internamente", e lembrou que a chanceler Angela Merkel (Alemanha) afirmou que as novas variantes podem ser consideradas "uma nova pandemia".

O presidente da Bolívia, Luis Arce, reforçou o desejo da Bolívia de, por fim, passar a fazer parte do Mercosul como membro pleno, vem participando como estado associado há sete anos. "Devemos aprofundar nosso estatuto de cidadania de Mercosul, para facilitar o trânsito de nossos cidadãos e de produtos."

De modo digital, Fernández falou desde o salão do museu do Bicentenário, anexo à Casa Rosada, em Buenos Aires. A seu lado estavam o chefe de gabinete, Santiago Cafiero, e o chanceler Felipe Solá. Diante dele, em telas diferentes, os demais mandatários.

Fernández também fez um balanço positivo do aniversário de 30 anos do bloco, nesta sexta, período "em que caminhamos desde a rivalidade até a cooperação".

Além da comemoração, foi apresentado um estatuto para ampliar direitos de cidadãos do Mercosul, que permitam facilitar seu trânsito e fixação de residência nos países do bloco. Também se propôs um "observatório da qualidade da democracia". A proposta foi da Argentina, e a ideia é avaliar como o sistema vem funcionando, em termos práticos, nos países do bloco.

Como se trata de um evento comemorativo e não de uma reunião regular do Mercosul, não houve um documento final. A próxima reunião deve ocorrer no final do semestre, também tendo a Argentina como anfitriã.

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