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Correção do Orçamento depende de acordo com Congresso e novo projeto de lei

Outra opção é cortar gastos com a máquina com risco de paralisar atividades

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São Paulo

A aprovação de um Orçamento para 2021 com despesas subestimadas, como para pagamentos da Previdência Social e do seguro-desemprego, dá ao governo duas opções, sendo a mais provável uma combinação de vetos com o envio de um projeto de lei ao Congresso que reduza emendas parlamentares.

Outra saída seria promover um corte nas despesas com a manutenção da máquina pública praticamente pela metade, colocando o país sob risco de descontinuidade na prestação de alguns serviços, descumprimento dos mínimos constitucionais com saúde e educação e de responsabilização de gestores públicos, incluindo o presidente da República.

O Congresso aprovou na última quinta-feira (25) o projeto de Orçamento de 2021 com cortes em diversas despesas classificadas como obrigatórias para destinar recursos para emendas parlamentares. Entre as despesas com as quais os parlamentares passaram a prever gastos menores estão ainda abono salarial e subsídios para crédito agrícola.

Como o Orçamento já estava com despesas subestimadas por conta da falta de atualização do valor do salário-mínimo, governo e especialistas em contas públicas avaliam que haveria necessidade de um corte de despesas de pelo menos R$ 30 bilhões.

Além disso, a peça orçamentária traz irregularidades, como previsão de adiamento de despesas e outros mecanismos para que seja possível burlar o teto de gastos.

Geraldo Julião Junior, ex-secretário-adjunto da Secretaria de Orçamento Federal do antigo Ministério do Planejamento, afirma que o melhor caminho para o governo seria um acordo político que permita ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) vetar alguns gastos, garantir que os vetos não sejam derrubados pelo Congresso e enviar ao Legislativo um projeto de lei de crédito complementar para recompor as despesas subestimadas.

“A insegurança maior é para o presidente, mas também para os gestores”, afirma Julião. “Há uma discussão se, ao não vetar, estaria validando aquilo que o Congresso fez. Para o presidente, tem a questão do crime de responsabilidade. Na forma que está esse Orçamento está não é executável, então, terá de ser alterado.”

Segundo Julião, um corte nas despesas obrigatórias nesse patamar (R$ 30 bilhões) poderia deixar os gastos com saúde e educação abaixo dos mínimos constitucionais.

O Executivo também teria de lidar com um “shutdown” do governo, sendo que o Brasil não possui legislação que oriente quais serviços devem fechar primeiro, como ocorre nos Estados Unidos. Com isso, haveria nova margem para responsabilização dos gestores.

Ele explica que a lei não permite desconsiderar o texto aprovado e enviar uma nova proposta de Orçamento. Além disso, os vetos dependem de como as despesas foram detalhadas, pois há risco de derrubar uma emenda e prejudicar toda uma linha de programação do Orçamento.

A economista Esther Dweck, ex-secretária de Orçamento Federal, afirma que a decisão do Congresso é fruto dos problemas gerados pela regra do teto de gastos. Ela diz ainda que os investimentos federais e os gastos com a máquina ficam em risco –pode faltar dinheiro para funcionamento de órgãos públicos, como agências de antedimento do INSS, e despesas básicas como abastecimento de veículos e pagamentos de fornecedores e terceirizados.

Ela afirma que uma saída para o governo seria pedir novamente a decretação de estado de calamidade e executar parte do orçamento de alguns ministérios por crédito extraordinário fora do teto, como no caso da saúde e em algumas áreas sociais.

“A gente sabia que o teto, em dois ou três anos, ia chegar nesse limite. Isso mostra a combinação de um Congresso que quer ter um tipo de ação sobre o Orçamento e uma regra que amarra completamente isso”, afirma Dweck.

Carlos Kawall, diretor do ASA Investment e ex-secretário do Tesouro Nacional, também afirma que o governo não pode funcionar com um orçamento de pouco mais de R$ 50 bilhões para despesas não-obrigatórias e vê o risco de “shutdown”.

“Você teria a ameaça de chegar em determinado momento e não conseguir executar despesas mínimas de manutenção da máquina pública. Para não falar de investimentos. Você joga R$ 50 bilhões para emendas, que são obras com critérios meramente políticos e, em troca disso, paralisaria o investimento da União, que já é bastante pequeno”, afirma.

Kawall avalia que a solução técnica passará por algum tipo de recomposição das despesas obrigatórias, provavelmente via projeto de lei. Mesmo assim, o episódio passa uma mensagem de falta de compromisso com agenda de ajuste fiscal, reformas econômicas e também em relação às prioridades geradas pela pandemia.

“É uma manobra orçamentária para desrespeitar o arcabouço fiscal e gastar mais com interesses políticos eleitorais. Além do aspecto fiscal, mostra um dissintonia do Congresso e da cúpula do governo com o momento que o país está vivendo, de caos ligado à pandemia”, afirma.

“E há risco de saída da equipe econômica. Acho que as pessoas que estão lá não vão ficar dispostas a compactuar com esse tipo de coisa. Essa é outra preocupação que esse episódio trouxe. Muitos já saíram.

Gil Castello Branco, fundador e secretário-geral da Associação Contas Abertas, afirma que o Orçamento aprovado mistura irregularidades como pedaladas, contabilidade criativa e tentativa de driblar a regra do teto de gastos.

Para corrigir essas distorções, é necessário acordo com o Congresso para manutenção de vetos e o envio de um projeto de lei para recompor despesas.

“Está se criando uma forma de abrir um buraco no teto, mas de forma artificial”, afirma Castello Branco.

“O Orçamento foi aprovado com parâmetros econômicos descalibrados, o que por si só já gera uma distorção. Veio ainda o ataque dos parlamentares aos recursos do Orçamento. As distorções foram muitas.”

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