Descrição de chapéu Financial Times

Navio encalhado no Canal de Suez ameaça desordenar transporte e comércio internacional

Fila de navios bloqueados deve causar atrasos e agravar a escassez de contêineres na Ásia

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David Sheppard Harry Dempsey
Londres e Cairo | Financial Times

O Canal de Suez está bloqueado, depois do encalhe de um dos maiores navios porta-contêineres do planeta, o que representa o corte de uma artéria vital do comércio internacional e ameaça desordenar por dias o sistema mundial de transportes.

O porta-contêineres Ever Given, cujo comprimento quase equivale à altura do Empire State, um dos edifícios mais altos de Nova York, está atravessado na ponta sul do canal. Rebocadores realizam esforços frenéticos para libertá-lo.

A empresa Evergreen Marine, de Taiwan, que opera o navio, anunciou nesta quarta-feira (24) que ele havia ingressado no Canal de Suez, vindo do Mar Vermelho, às 8h da terça-feira (23), horário da Europa Oriental ou 3h pelo horário de Brasília.

“A cerca de seis milhas náuticas [por volta de 11 quilômetros] da ponta sul do canal, acredita-se que o navio tenha enfrentado uma forte e repentina rajada de vento, o que fez com que ele se desviasse de seu curso e encalhasse acidentalmente”, anunciou a Evergreen em um comunicado distribuído por email.

Porta-contêineres Ever Given, cujo comprimento quase equivale à altura do Empire State Building, está atravessado na ponta sul do canal desta terça
Porta-contêineres Ever Given, cujo comprimento quase equivale à altura do Empire State Building, está atravessado na ponta sul do canal desta terça - Reuters

A cada dia, 50 navios atravessam os 193 quilômetros do Canal de Suez, construído entre 1859 e 1869 para conectar o Mediterrâneo ao Mar Vermelho e à Ásia.

Samir Madani, da TankerTrackers, que rastreia petroleiros, disse que poucas horas depois do bloqueio já havia 10 milhões de barris de petróleo cru e derivados parados perto das entradas sul e norte do canal.

Além do petróleo cru que flui do Oriente Médio para a Europa e América do Norte, o canal se tornou, nos últimos anos, uma rota importante para o transporte de petróleo russo rumo à Ásia.

“O canal é um gargalo importante no comércio mundial”, disse Madani. “Se eles conseguirem liberar o navio rapidamente, o impacto será minimizado, mas qualquer bloqueio prolongado teria consequências severas, afetando os preços do petróleo e os custos de transporte marítimo, forçando os porta-contêineres a tomarem a rota muito mais longa em torno da África."

O fluxo total de petróleo pelo canal e pelo sistema de oleodutos a ele associado, o Sumed, respondeu por quase 10% do petróleo transportado por via marítima no planeta em 2018, de acordo com a Administração de Informações sobre Energia dos Estados Unidos. Cerca de 8% do comércio de gás natural liquefeito do planeta também passou pelo canal naquele ano.

O petróleo cru padrão Brent, a referência do mercado internacional, subiu em cerca de 1%, para US$ 61,35 por barril, nesta quarta-feira, em Londres. Os preços estavam sob pressão esta semana, refletindo preocupações crescentes com relação à eventual queda na demanda causada pelas novas restrições sociais adotadas para combater o coronavírus na Europa.

O canal também é uma artéria essencial para o transporte de bens de consumo e matérias-primas. Quase 50% dos navios que passaram pelo canal em fevereiro eram porta-contêineres, de acordo com a Suez Canal Authority.

Osama Rabie, diretor da Suez Canal Authority, disse que esforços estavam sendo realizados para desencalhar o navio, mas não ofereceu uma projeção quanto à demora para que isso aconteça.
Corretores e analistas de navegação disseram que o bloqueio ameaça causar atrasos nos portos da Europa por dias, e exacerbar a escassez de contêineres na Ásia, que conduziu a uma disparada no valor dos fretes.

“É um imenso problema, já que literalmente tudo que vem da Ásia para a Europa passa por lá”, disse Philip Edge, presidente-executivo da Edge Worldwide Logistics, uma companhia britânica de frete.

O setor está observando atentamente a situação para determinar qual será a demora em resolvê-la. A estimativa atual é de pelo menos dois dias.

“Quanto maior a demora, pior a situação será”, disse Lars Jensen, presidente-executivo da Seaintelligence Consulting.

Jensen acrescentou que “isso tem o potencial de criar gargalos” nos portos europeus na semana que vem, já que navios atrasados estarão parados nos portos ao mesmo tempo em que chegam outras embarcações, dentro de seus cronogramas, vindas de outras áreas, e também existe o risco de atrasos no retorno de contêineres desesperadamente necessários para a China.

Existe potencial para um desordenamento ainda maior, porque o sistema mundial de navegação está distendido ao seu limite, por conta da alta no número de pedidos de bens causada pela pandemia, em um momento em que contêineres estão no lugar errado como resultado de cortes de serviços nos dias iniciais da pandemia.

Como resultado, o custo de transporte de bens da Ásia para a Europa atingiu um recorde de alta nos últimos meses, e os fretes mundiais já são três vezes mais altos do que o nível que tinham um ano atrás.

Peter Sand, principal analista de navegação da Bimco, disse que ainda não havia sinais de que navios estivessem sendo redirecionados para a rota em torno do Cabo da Boa Esperança, mas ele diz que está “seguro de que veremos alguns redirecionamentos, como parte da gestão de risco” pelas companhias de navegação.

O Ever Given, que navega sob bandeira panamenha, foi lançado em 2018 e tem pouco menos de 400 metros de comprimento, e 59 metros de largura, e estava a caminho de Roterdã, na Holanda, de acordo com o Marine Traffic, um site que acompanha o tráfego marítimo.

Uma foto de uma escavadeira trabalhando para libertar o navio foi publicada no Instagram por uma marinheira que supostamente estava em um dos navios presos por trás do Ever Given.

Julianne Cona, que postou a imagem, é descrita no LinkedIn como segunda assistente de engenharia, natural de Nova York.

“O navio à nossa frente encalhou ao atravessar o canal e agora está atravessado”, escreveu Cona. “Parece que vamos ficar presos aqui por algum tempo."

Traduzido originalmente do inglês por Paulo Migliacci

Erramos: o texto foi alterado

O canal de Suez tem até 225 metros de largura, e não 225 quilômetros, como constava na versão original da infografia, já corrigida.

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