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inflação juros

Se o IGP-M reflete alta de commodity e câmbio, como pode ser usado para reajustar aluguel e conta de luz?

Indicador é desses rastilhos de pólvora inflacionários que podem acabar batendo também no IPCA

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Roberto Dumas

Professor do Insper

O índice geral de preços-mercado bateu 4,10% no mês de maio comparado com 1,51% no mês anterior. Com essa alta, nos últimos 12 meses, o índice alcançou mais de 37%. Mas por que esse descolamento entre IGP-M e IPCA?

Não que o IPCA, índice utilizado para a meta de inflação do Banco Central e determinado pelo Conselho Monetário Nacional, esteja comportado, mas por que essa discrepância?

O IGP-M é composto por 3 diferentes índices: O IPC com peso de 30%, que mede o índice de preços ao consumidor de famílias que recebem de 1 a 33 salários mínimos e cesta com 388 produtos, o IPA (Índice de Preços ao Produtor Amplo) com peso de 60%, que mede a evolução de preços no atacado e commodities, as matérias-primas (aqui já deu para entender) com 431 produtos e o INCC (Índice Nacional da Construção Civil) com peso de 10%.

Ocorre que graças ao apetite voraz chinês, a demanda por commodities no mercado internacional explodiu, levando o preço de algumas commodities subirem quase 21% só em maio, como o caso do minério de ferro, 10,48% o milho, 18,65% a cana de açúcar e 3,74% o preço da soja.

Essas commodities respondem por mais de 65% de todo o IPA, que atingiu 5,23% em maio e 50.2% em 12 meses.

E aonde devemos nos preocupar, além de saber que grande parte dos aluguéis são indexados ao IGP-M? Aí vem a história do jabuti. Colocaram-no na árvore, muitos não sabem como, e decidem que já que ele está lá e o mercado aceita, deixemo-nos sozinho.

Não é bem assim. O IGP-M passou a ser adotado como índice de reajuste de aluguel há mais de 30 anos (1989), quando o governo ainda profanava o índice de preços ao consumidor.

Como forma de limitar a influência do governo no reajuste dos aluguéis, via “ajustes criativos” no IPC, o mercado passou a adotar o IGP-M calculado pela FGV (Fundação Getulio Vargas) e apartado de influências políticas.

Entretanto, se analisarmos à luz da credibilidade do nosso IPC-A, esse jabuti já pode descer da árvore, pois como ajustar o aluguel por um indicador que é altamente influenciado pela cotação do nosso câmbio e commodities no mercado internacional?

Poder-se-ia dizer que o proprietário prefere o IGP-M, mas isso seria uma falácia.

Uma vez que o câmbio se aprecia e as commodities caem, o IGP-M pode ficar negativo —apesar de os contratos de aluguéis geralmente não permitirem reajustes negativos.

Além disso, é sabido que a volatilidade, entenda-se aí o risco, se aplica para ambas as partes, o proprietário e o inquilino.

Voltemos ao nosso mundo econômico, no entanto. Será que poderíamos considerar um choque de oferta esse aumento no preço das commodities, que se traduziu muito bem no IGP-M?

De certa forma, sim, mas como disse no começo desse artigo, existem idiossincrasias no Brasil, que podem formar alguns rastilhos de pólvora inflacionário, batendo também no IPCA.

Mesmo com várias renovações de concessão de distribuidoras de energia, utilizando o IPCA como índice de reajuste, uma grande parte das distribuidoras de energia elétrica ainda tem suas tarifas atreladas ao IGP-M.

Maior IGP-M, maior custo de energia elétrica, o que encarece todo o processo produtivo manufatureiro e de serviços.

Some-se a isso a possibilidade de termos de acionar termelétricas emergências, a um custo de tarifa de R$1,000/Mwh, dado o baixo nível dos reservatórios atualmente, o aumento do IGP-M, pode, sim, acabar influenciando toda a cadeia do IPCA.

Para a autoridade monetária resta apenas continuar com sua política contracionista de aumentos paulatinos de juros, de modo a minimizar flutuações excessivas do nível do produto.

Muitos advogam um aumento imediato para a taxa de juro Selic para 6.5%, o que equivaleria a uma taxa de juro nominal neutra (nem estimula e nem reprime a economia). Entretanto, esse movimento faria sentido em outra épocas, como por exemplo, quando o Brasil adotou a âncora cambial para debelar uma inflação acumulada de 1980 a 1994 de 12 trilhões percentuais. Os tempos agora são outros e a patologia macroeconômica da hiperinflação foi controlada, felizmente. Podemos considerar que esse período triste da nossa história, trouxe melhores e quanto à condução da nossa política monetária, condizente com inflações quase de primeiro mundo.

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