Descrição de chapéu The New York Times

Jovens não querem voltar para os escritórios no pós-pandemia

Surgiu um conflito de gerações entre eles e colegas que apreciam mais trabalhar no escritório do que o trabalho remoto; superar essa divisão pode exigir flexibilidade

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Nelson D. Schwartz Coral Murphy Marcos
Nova York | The New York Times

David Gross, executivo em uma agência de publicidade sediada em Nova York, reuniu seus comandados via Zoom este mês para uma mensagem que ele e seus sócios estavam ansiosos por transmitir: era hora de pensar em voltar ao escritório.

Gross, 40, não estava seguro de como seus empregados, muitos na casa dos 20 e 30 anos, receberiam a ideia. A resposta inicial —um completo silêncio— não foi encorajadora. E aí um jovem sinalizou que tinha uma pergunta. “Vai ser obrigatório?”, ele questionou.

Sim, a presença no escritório seria obrigatória três dias por semana, foi a resposta.

E foi assim que começou uma conversa complicada na Anchor Worldwide, a empresa de Gross, que está sendo reproduzida no momento em muitas empresas, grandes e pequenas, espalhadas pelos Estados Unidos. Embora trabalhadores de todas as idades tenham se acostumado a trabalhar de longe e evitar a cansativa jornada de casa para o escritório, os mais jovens desenvolveram apego especial pela nova maneira de operar.

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Uma lacuna geracional surgiu entre aqueles que valorizam o trabalho presencial e os que veem vantagens no home office - Albert Tercero/The New York Times

E em muitos casos, a decisão de voltar opõe gestores mais velhos, que consideram trabalhar no escritório a ordem natural das coisas, a subordinados mais jovens que passaram a considerar o trabalho remoto como completamente normal nos 16 meses transcorridos desde que a pandemia surgiu. Alguns novos contratados jamais foram ao local de trabalho de seus empregadores.

“Francamente, eles não sabem o que estão perdendo, porque temos uma cultura forte”, disse Gross. “O desenvolvimento e a produção de trabalho criativo requerem colaboração face a face. É difícil fazer uma reunião de ‘brainstorm’ via Zoom”.

Alguns setores, como os bancos e as companhias financeiras, estão adotando linha mais dura e insistindo no retorno do pessoal, mais jovem e mais velho igualmente. Os presidentes-executivos de gigantes de Wall Street como o Morgan Stanley, Goldman Sachs e JPMorgan Chase sinalizaram que esperam ter seu pessoal de volta às suas baias e escritórios nos próximos meses.

Outras companhias, especialmente as de tecnologia e mídia, estão mostrando mais flexibilidade. Por mais que Gross deseje o retorno do pessoal de sua agência de publicidade, ele se preocupa com reter jovens talentos em um momento no qual o giro de pessoal cresce, e por isso deixou claro que existe espaço para acomodação.

“Estamos em um setor verdadeiramente progressivo, e há empresas que adotaram o trabalho completamente remoto”, ele explicou. “Temos de definir a questão em termos de flexibilidade”.

Em uma pesquisa recente do Conference Board, 55% dos entrevistados da geração Y, definidos como pessoas nascidas entre 1981 e 1996, questionaram a sabedoria de retornar ao escritório. Entre os membros da geração X, nascidos entre 1965 e 1980, 45% tinham dúvidas sobre voltar ao escritório, enquanto apenas 36% dos integrantes da geração baby boom, nascidos entre 1946 e 1964, tinham restrições parecidas.

E a ascensão da variante delta do coronavírus, nos últimos dias, pode alimentar a relutância a retornar, entre os trabalhadores de todas as idades.

“Entre as gerações, a Y é a mais preocupada com sua saúde e bem-estar psicológico”, disse Rebecca Ray, vice-presidente executiva de capital humano do Conference Board. “As companhias farão bem em oferecer o máximo possível de flexibilidade”.

Matthew Yeager, 33, deixou seu emprego como desenvolvedor de web em uma empresa de seguros em maio, depois que esta o informou de que ele precisava voltar ao escritório, com a elevação dos índices de vacinação em sua cidade, Columbus, Ohio. Ele limitou sua busca de emprego a oportunidades que oferecessem trabalho 100% remoto, e em junho começou a trabalhar para uma empresa de contratação e recursos humanos de Nova York.

“Foi difícil porque eu realmente gostava de meu emprego e das pessoas com quem trabalhava, mas não queria perder a flexibilidade de poder trabalhar remotamente”, disse Yeager. “O escritório oferece muitas distrações, que são removidas quando você trabalha de casa”.

Yeager disse que gostaria da opção de trabalhar remotamente em quaisquer postos que ele vier a considerar no futuro. “Mais empresas deveriam oferecer oportunidades para que as pessoas trabalhem e sejam produtivas da melhor maneira que podem”, ele disse.

Embora essa divisão por idades tenha levado os gestores a buscar maneiras de persuadir os contratados mais jovens a retornar ao escritório, existem outras distinções. Muitos trabalhadores que têm filhos ou outras responsabilidades de cuidar de terceiros se preocupam sobre deixar de trabalhar em casa quando os planos de retorno à escola ainda estão em dúvida, uma consideração que afetou as mulheres de maneira desproporcional durante a pandemia.

Ao mesmo tempo, mais que uns poucos trabalhadores mais velhos recebem com agrado a positividade de trabalhar em casa, depois de anos em seus cubículos, enquanto pessoas na casa dos 20 anos sonham com a camaradagem de um escritório e o dinamismo de um ambiente urbano.

Ainda assim, que tantos jovens estejam trabalhando de casa é uma reversão de hábitos bem estabelecidos, disse Julia Pollak, economista do trabalho no mercado online de emprego ZipRecruiter.

“A norma por muito tempo foi a de que, nos escritórios, o trabalho remoto era reservado ao pessoal mais velho e mais confiável”, ela disse. “É interessante a rapidez com que os trabalhadores jovens se adaptaram a isso”.

Quando trabalham separados, os empregados mais jovens perdem a oportunidade de desenvolver contatos, encontrar mentores e ganhar experiência ao observar de perto o trabalho dos colegas, dizem gestores veteranos.

Em alguns casos, membros mais velhos da geração Y, como Jonathan Singer, 37, advogado imobiliário em Portland, Oregon, se veem defendendo o retorno antecipado aos escritórios diante de colegas mais jovens e céticos, que se acostumaram a trabalhar de casa.

“Como gestor, é realmente difícil desenvolver coesão e coleguismo sem que as pessoas estejam juntas em base regular, e é difícil orientar alguém sem estar no mesmo lugar que a pessoa”, disse Singer. Mas persuadir os colegas mais jovens a ver as coisas dessa maneira não vem sendo fácil.

“Com a força que os trabalhadores ganharam, e a prova de que eles são capazes de trabalhar de casa, é difícil empurrar o creme dental de volta para dentro do tubo”, ele disse.

Por medo de perder mais um subordinado, em um mercado de trabalho onde existe escassez de pessoal, Singer permitiu que um jovem colega trabalhe de casa um dia por semana, sob o entendimento de que a questão seria retomada no futuro.

“Tornou-se impossível dizer não ao trabalho remoto”, explicou Singer. “Simplesmente não vale a pena correr o risco de perder um bom trabalhador por causa de uma postura doutrinária de que as pessoas precisam estar no escritório”.

Amanda Diaz, 28, se sente aliviada por não precisar voltar ao escritório, ao menos por enquanto. Ela trabalha para a Humana, uma operadora de planos de saúde, em San Juan, Porto Rico, mas vem realizando seu trabalho de casa, em Trujillo Alto, a cerca de 40 minutos de carro do escritório.

A Humana oferece ao pessoal a opção entre trabalhar no escritório ou de casa, e Diaz disse que continuaria a trabalhar remotamente enquanto tivesse escolha.

“Pense em todo o tempo que você perde se preparando para trabalhar e se deslocando para o trabalho”, ela disse. “Em lugar disso, uso essas duas horas ou pouco mais para preparar um almoço saudável, me exercitar ou descansar”.

Alexander Fleiss, 38, presidente-executivo da Rebellion Research, uma empresa de administração de investimentos, disse que alguns empregados haviam resistido a voltar ao escritório. Ele espera que o exemplo dos colegas e o medo de perder promoções por falta de interação pessoal com a chefia convençam as pessoas a voltar.

“As pessoas podem perder seus empregos por conta da seleção natural”, disse Fleiss. Ele disse que não se surpreenderia se trabalhadores começarem a processar empresas caso sintam ter sido demitidos por se recusarem a voltar ao escritório.

Fleiss também tenta persuadir os membros de sua equipe que estão trabalhando em projetos a voltar ao escritório chamando a atenção deles para os aspectos positivos da colaboração face a face, mas muitos dos trabalhadores ainda prefeririam continuar a interagir via Zoom.

“Se é o que eles querem, é o que eles querem”, ele disse. “Hoje em dia não há como forçar qualquer pessoa a fazer qualquer coisa. Só podemos insistir”.

Traduzido originalmente do inglês por Paulo Migliacci

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