Congresso promulga parte de PEC dos Precatórios sob protestos de senadores

Sessão é marcada por forte discussão entre os presidenciáveis Simone Tebet e Rodrigo Pacheco, que chefia o Senado

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Brasília

Após acordo fechado na noite anterior para o fatiamento da proposta, o Congresso Nacional promulgou nesta quarta-feira (8) a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) dos Precatórios, aposta do governo para poder pagar o Auxílio Brasil de ao menos R$ 400 a 17 milhões de famílias até dezembro de 2022.

O trecho a ser promulgado, no entanto, garante apenas parte do espaço necessário no Orçamento para atender às despesas extras previstas para o ano que vem, incluindo o novo programa social.

As partes em comum promulgadas abrem uma folga de R$ 62,2 bilhões no próximo ano. Outros R$ 48,6 bilhões ainda dependerão da votação de outra PEC na Câmara e no Senado.

A sessão de promulgação foi marcada por uma série de manifestações contrárias dos senadores, que apontaram rompimento do acordo durante a votação no Senado. Os parlamentares questionaram a promulgação de dois artigos, sem as alterações feitas pelos senadores, que retiram a vinculação dos gastos pelo governo federal. Assim, alegam que a PEC poderia abrir brecha para o governo gastar livremente os recursos.

Ao deixar a Câmara nesta quarta, Lira afirmou que há "toda uma boa vontade da Câmara de produzir um texto que foi feito e um acordo que foi feito com o presidente Rodrigo Pacheco só para promulgação do que tinha de texto convergente."

"Nós não usamos a PEC dos Precatórios para fins eleitoreiros, eu não sou candidato a presidente da República", disse. "Nós estamos fazendo o máximo de esforço possível para fazer a apensação dessa matéria e votar ela na terça-feira, para serem apreciadas todas as alterações que o senado honrosamente fez."

"Agora, o fato de a Câmara fazer um texto, o Senado não é obrigado a concordar, e a Câmara no mérito não tem nenhum acordo de manutenção do texto do Senado. O que há é uma boa vontade tanto da Presidência quanto dos deputados de analisar as alterações feitas pelo Senado e votar na terça-feira direto no plenário, foi o acordo que foi feito."

​A PEC dos Precatórios que foi aprovada na Câmara alterava a regra de cálculo do teto de gastos, que limita o avanço das despesas à inflação, e fixava um limite para o pagamento de dívidas judiciais da União, contra as quais já não cabe mais recurso.

O texto sofreu modificações no Senado, o que tornava necessária uma nova votação pelos deputados.

Na terça-feira (7), os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), anunciaram um acordo para promulgar a parte da PEC que ficou inalterada. Isso incluiria a mudança no teto de gastos, mas não o limite para pagamento de dívidas judiciais.

O acerto prevê que a proposta que criará o subteto para os precatórios, como são chamadas as dívidas judiciais, deve ser apreciada novamente pela Câmara na próxima terça-feira (14). Depois, o texto precisará passar novamente pelo Senado.

Portanto, foi promulgado apenas um dos dois pilares da PEC. A alteração no cálculo do teto já entra em vigor imediatamente. Mas, para impedir uma forte expansão de despesas, foi determinado um limite do efeito dessa medida agora (em dezembro).

O texto promulgado estabelece que as despesas em 2021 podem subir em R$ 15 bilhões, a serem usados em vacinas, na área de saúde e social.

Outro ponto promulgado prevê o parcelamento de dívidas que os municípios têm com a União.

Para concluir a análise da PEC, o governo precisa aprovar na Câmara a medida que cria um limite para quitação de precatórios, além do trecho determinando que o efeito da PEC no Orçamento seja usado somente para cobrir despesas obrigatórias (que aumentaram diante da alta da inflação), do Auxílio Brasil e da desoneração da folha de pagamentos.

A equipe econômica conta com o espaço de R$ 106,1 bilhões para conseguir acomodar todas as despesas previstas para 2022.

Para assegurar a ampliação do Auxílio Brasil, o governo precisa de R$ 51,1 bilhões adicionais.

Outros R$ 48,6 bilhões serão destinados à correção de benefícios sociais pela inflação, à ampliação do teto de gastos de outros poderes (devido à mudança na regra) e ao ajuste nos mínimos constitucionais de saúde e educação.

Há ainda uma fatura extra de R$ 5,3 bilhões para bancar a prorrogação da desoneração da folha de pagamento para empresas, medida já acertada entre governo e Congresso Nacional.

A promulgação parcial da PEC, apenas com a mudança no teto de gastos, em tese viabiliza a ampliação de R$ 51,1 bilhões pretendida no Auxílio Brasil, segundo um integrante da equipe econômica.

No entanto, como os R$ 62,2 bilhões são insuficientes para cobrir todos os gastos programados, a necessidade de revisar também as despesas obrigatórias poderia impor um corte drástico nas discricionárias, que incluem custeio e investimentos públicos.

Segundo apurou a Folha, o governo vai enviar um ofício ao relator-geral do Orçamento de 2022, deputado Hugo Leal (PSD-RJ), justamente para ressaltar a necessidade de revisar os gastos obrigatórios, mas ainda avalia se fará isso antes ou depois da votação da segunda PEC.

Os técnicos afirmam, porém, que a composição final vai depender do próprio relator, um vez que os ofícios não têm o poder de alterar a proposta orçamentária, como ocorreria com o envio de uma mensagem modificativa.

O prazo de encaminhamento de uma mensagem modificativa se encerrou na terça-feira (7) com a votação do relatório preliminar do Orçamento de 2022, limitando os instrumentos do governo para alterar a proposta.

A votação da segunda PEC, complementando o espaço fiscal para o ano que vem, também contribuiria para deixar o cenário mais confortável para acomodar as despesas.

A sessão foi marcada por protestos de alguns senadores, que não concordavam com o texto que seria promulgado. A senadora Simone Tebet (MDB-MS), que lançou na mesma data a sua candidatura à presidência da República, disse que houve uma ruptura do acordo firmado durante a votação da matéria no Senado. Afirmou que o texto promulgado não continha as amarras que impedem o governo de gastar livremente os recursos. A parlamentar acrescentou que o acordo previa a vinculação dos gastos com o programa social e ações de seguridade social.

"Nós vamos promulgar e o espaço fiscal de quase R$ 60 bilhões, fruto da mudança temporal para dezembro no cálculo, esse espaço fiscal fica solto, ele vai ficar lá em um artigo dependendo de votação da Câmara dos Deputados", afirmou a parlamentar.

"Veja: eu não estou tratando da Câmara; eu estou tratando de um acordo que foi feito aqui para que nós déssemos os votos necessários, que o governo não tinha, para poder aceitar avançar nessa questão", completou.

Ela pediu a exclusão desses dois artigos.

O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) afirmou que seria legal promulgar a parte de consenso entre as duas Casas. No entanto, apontou que os ajustes redacionais feitos para adequar o texto final resultaram em mudanças de mérito.

"O que não cabe num ajuste redacional pós-aprovação é mudar o conteúdo aprovado no Senado", afirmou.

Em seguida, houve uma forte discussão entre Simone Tebet e Rodrigo Pacheco, também pré-candidato à presidência da República.

"Lamento muito que vossa excelência não tenha honrado o compromisso feito com os líderes dessa Casa. Nós, sob o seu aval, garantimos os votos para o presidente da República e o governo, no compromisso avalizado por vossa excelência, que não iria fatiar", disse a senadora.

Pacheco depois respondeu que não havia feito acordo nenhum com a senadora e levantou a hipótese de que a manifestação de Tebet tinha cunho eleitoral.

"Eu não estou conhecendo a sua arguição de descumprimento de acordo", afirmou.

"Não é possível que a gente fique o tempo inteiro em discussão política com cunho sabe-se lá o que, inclusive eleitoral, para poder desmoralizar senador dessa Casa. Eu não vou polemizar mais", completou.

Por causa da discussão no plenário, quando muitos questionaram a possibilidade de os deputados federais ignorarem as mudanças dos senadores, o presidente da Câmara Arthur Lira se recusou a fazer o discurso que havia programado. Lira também estava presente acompanhando a sessão.

"Senhor presidente Rodrigo Pacheco, eu queria lhe pedir permissão. Eu não vou ler o meu discurso, que estava pronto, que está em cima da mesa, por achar que ele ficou desconectado com o momento que vivemos no plenário do Senado Federal, com mil desculpas", afirmou e em seguida acrescentou que vai colocar em pauta na próxima terça-feira a votação da PEC apensada, como havia se comprometido.

Após a sessão, o líder do governo, Fernando Bezerra (MDB-PE), afirmou que há uma sinalização dos deputados de que dois itens alterados pelos senadores serão acatados. Um deles é a transformação do Auxílio Brasil em programa permanente. O outro ponto é a vinculação, item que se tornou essencial para os senadores e motivo da discussão.

Por outro lado, Bezerra afirmou que há resistência de alguns deputados em relação ao escalonamento do pagamento do Fundef - fundo de educação - prevendo percentuais das dívidas que serão pagos ano a ano. Os parlamentares argumentam que seria mais adequado abrir margem de manobra para o Tesouro arcar com essas dívidas de acordo com as circunstâncias.

No entanto, esse encaminhamento já foi aprovado pela Câmara dos Deputados.


Entenda os principais pontos promulgados


1) Mudança no indexador do teto de gastos

O que é o teto:
Regra constitucional aprovada em 2016 que limita o aumento da maior parte das despesas federais à inflação do ano anterior

Como é hoje:
o teto é corrigido pela inflação medida pelo IPCA em 12 meses até junho do ano anterior

Com fica:
o valor é recalculado, retroativamente, com base no IPCA de janeiro a dezembro; na prática, isso amplia o teto

2) Refis a municípios

O que diz a PEC:
possibilidade de municípios parcelarem dívidas com a União caso aprovem reformas da Previdência locais

Condições:
Municípios terão que comprovar mudanças específicas nas regras previdenciárias. Uma delas é que os servidores municipais não poderão pagar alíquotas menores que os servidores da União


O que ainda precisa ser votado na Câmara e no Senado

1) Teto para pagamento de precatórios

O que é precatório:
dívidas da União já reconhecidas pela Justiça e sem possibilidade de recurso

Como é hoje:
precatórios inscritos no Orçamento são pagos

Como fica:
é criado um valor máximo a ser quitado no ano (cálculo usa como base o montante pago em sentenças judiciais em 2016 e corrige esse número pela inflação); os precatórios que ficarem fora desse limite deverão ser pagos em outros anos

2) Vinculação de despesas liberadas após a PEC

O que diz a PEC:
Senado quer que os R$ 106 bilhões a serem autorizados após a conclusão de toda a PEC sejam usados apenas em algumas despesas

Lista de despesas:
Gastos obrigatórios (aposentadorias, pensões e despesas atreladas à inflação), Auxílio Brasil e desoneração da folha de pagamentos


Erramos: o texto foi alterado

Versão anterior deste texto se referiu ao Auxílio Brasil como auxílio emergencial. O texto foi corrigido.

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