Bolsonaro defende derrubar próprio veto por MEIs, e governo pode prorrogar regularização de dívidas

Presidente falou ainda sobre portaria que pode atender 75% dos pequenos e microempresários contemplados no projeto

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Brasília

O presidente Jair Bolsonaro (PL) demonstrou nesta segunda-feira (10) ser favorável à derrubada do próprio veto ao projeto que permitiria a repactuação de débitos tributários para MEIs (microempreendedores individuais) e empresas do Simples Nacional. Depois, ele disse ainda que o governo deve editar uma portaria para atender 75% dos pequenos e microempresários que eram contemplados no projeto de lei vetado por ele na semana passada.

O presidente não deu detalhes do conteúdo da portaria. Nos bastidores, técnicos do Planalto e da Economia afirmam desconhecer ato administrativo sobre o tema que já tenha sido concluído e esteja pronto para publicação.

Até agora, a Folha apurou que as discussões vão na direção de prorrogar o prazo para as empresas regularizarem seus débitos com o Fisco até 29 de abril, dando tempo para que o Congresso derrube o veto à lei do Refis.

O presidente Bolsonaro durante cerimônia no Planalto - Adriano Machado-9.dez.21/Reuters

A medida depende de uma resolução do Comitê Gestor do Simples Nacional, composto por representantes do governo federal, dos estados, dos municípios e do Sebrae.

"Hoje, com o Paulo Guedes conversado, devemos ter uma portaria de hoje para amanhã, onde atende a 75% desses pequenos e microempresas. E daí, a outra parte, o complemento final, ou fica através de um projeto de lei complementar, desde que tramite de forma urgente, urgentíssima, no Parlamento, ou então o Parlamento derruba o veto", disse o presidente em entrevista à TV Jovem Pan.

Oficialmente, o Ministério da Economia não informa qual será a solução para o impasse.

O chefe do Executivo já havia sinalizado, mais cedo, ser favorável à derrubada pelo Congresso do veto. "Fui obrigado a vetar a renegociação das dívidas das pequenas e microempresas. Isso logicamente teve um estresse entre eu e a equipe econômica, no bom sentido", disse Bolsonaro.

Na avaliação de auxiliares do presidente, caso algum ato saia mesmo pela pasta de Guedes, seria uma forma de constranger o ministro, que deixou Bolsonaro em uma "saia justa" ao pedir o veto.

A ideia de prorrogar o prazo para as empresas regularizarem seus débitos com o governo vem sendo discutida nos bastidores e daria tempo às companhias até que o Congresso derrube o veto ao Refis.

Hoje, a data-limite para ficar em dia com o Fisco é 31 de janeiro, idêntico ao prazo para as companhias optarem pelo regime simplificado de tributação.

Segundo fontes da área econômica, a proposta é que o Comitê Gestor do Simples Nacional edite uma resolução prorrogando o calendário de regularização de dívidas até 29 de abril de 2022 para todas as empresas que fizerem a opção até o próximo dia 31 de janeiro.

Esse expediente já foi usado em outros anos, como em 2021, quando a regularização foi estendida até 17 de fevereiro. O objetivo era dar tempo para as empresas quitarem débitos pendentes —a existência de dívidas pode levar à exclusão do regime.

A área econômica chegou a cogitar prorrogar o prazo de adesão ao Simples Nacional. No entanto, essa alternativa se mostrou inviável, pois a data é prevista na lei complementar que criou essa modalidade.

Por isso, seria necessário aprovar um projeto de lei complementar para alterar a data-limite da opção, segundo duas fontes do Ministério da Economia, o que é difícil diante do recesso legislativo —as atividades do Congresso serão retomadas em fevereiro.

O deputado Marco Bertaiolli (PSD-SP), que foi o relator da proposta do Refis na Câmara, afirmou que a Frente Parlamentar do Empreendedorismo, com mais de 200 integrantes, já tem "posição definida" em relação à derrubada do veto. "É a única saída que vejo para resolver isso", afirmou.

A proposta é de autoria do vice-líder do governo, senador Jorginho Mello (PL-SC). À Folha, ele disse que o ministério de Paulo Guedes tem de "encontrar uma solução para o problema que eles criaram".

"Eu assinei o que eles [técnicos da Economia] escreveram. Como é que agora vai vetar?", queixou-se o aliado de Bolsonaro. Mello prometeu derrubar o veto, em acordo com o governo.

Caso o Congresso derrube o veto, o governo precisará implementar medidas de compensação exigidas pela LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal), dado que o valor de perda de receitas não foi previsto no Orçamento de 2022.

No âmbito da Receita Federal, a renúncia é estimada em R$ 1,2 bilhão. Já no caso da PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional), responsável pela cobrança de débitos já inscritos na dívida ativa, a renúncia seria de R$ 489 milhões em 2022.

Para cumprir a LRF, o governo precisaria editar alguma medida de aumento de tributos ou ampliação do alcance de algum imposto já existente. Só depois da adoção de medida de compensação é que os benefícios da negociação surtiriam efeito.

Pelo texto aprovado no Congresso, as micro e pequenas empresas pagariam uma entrada de 1% a 12,5% do valor da dívida, conforme o grau de perda de receitas durante a crise provocada pela pandemia de Covid-19.

Além disso, elas teriam descontos entre 65% e 90% nos juros e multas e de 75% a 100% nos encargos e honorários advocatícios, também de acordo com o impacto da crise em seus caixas.

Nas discussões que antecederam o veto total da lei, a Economia sugeriu um veto parcial para evitar que empresas com aumento de arrecadação (e, portanto, não impactadas negativamente pela crise provocada pela pandemia) pudessem se beneficiar do programa.

O veto parcial limitaria a renúncia a R$ 200 milhões, facilitando a tarefa do presidente de bancar alguma medida de compensação, como exige a LRF.

No entanto, técnicos da área jurídica do Planalto identificaram, nas últimas horas antes do prazo para o veto, quinta-feira passada (6), que o presidente estaria impedido de conceder benefício fiscal em ano eleitoral.

O próprio presidente vem admitindo essa possibilidade em entrevistas, alegando que não pode correr o risco de ficar inelegível no ano em que concorrerá à reeleição.

Procurado pela reportagem, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) disse que "pode se configurar como vedada a gratuidade do benefício —com ausência de contrapartida pelo beneficiário— e se for descartada a execução prévia em exercício anterior, conforme previsto no artigo 73, parágrafo 10, da Lei das Eleições".

"Porém, cabe ressaltar que essas questões são analisadas individualmente pela Justiça Eleitoral", disse o tribunal. O TSE não informou se fora procurado formalmente pela Presidência ou pelo Congresso a respeito do tema.

A decisão do governo de vetar integralmente a proposta gerou mal-estar entre o Palácio do Planalto e a equipe do ministro Paulo Guedes (Economia).

Durante sua live semanal na quinta-feira (6), Bolsonaro demonstrou contrariedade com a orientação de membros da equipe econômica em favor do veto ao texto.

"Como são as coisas, né? O cara querendo que eu vetasse o Simples Nacional", disse Bolsonaro na ocasião, aparentando não saber que a transmissão havia começado.

A declaração foi inicialmente recebida como indicativo de que Bolsonaro sancionaria o projeto, contrariando a Economia. Mas os obstáculos da lei eleitoral acabaram se impondo, levando o presidente a não colocar sua assinatura na sanção da proposta.

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