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Estrangeiros compram ações pontuais na B3 e recomendam cautela com Brasil em 2022

Com pregão em baixa, esses investidores colocaram R$ 2,6 bi em ações brasileiras neste início de 2022; riscos fiscal e político à frente incomodam

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São Paulo

As restrições impostas pela variante ômicron e o aumento previsto para os juros nos Estados Unidos, somados às incertezas sobre a política econômica no Brasil em meio à disputa eleitoral, têm feito com que os investidores continuem se desfazendo de papéis na Bolsa de Valores neste início de ano.

Em 2022, até 10 de janeiro, o Ibovespa, principal índice de ações, já acumula uma queda de aproximadamente 3%, após acumular perdas de quase 12% no ano passado.

No entanto, chama a atenção o fato de o movimento ter maior participação de brasileiros. Enquanto o investidor de varejo local tem preferido vender suas ações diante do cenário desafiador que se desenha à frente, alguns estrangeiros tem optado por uma postura mais paciente —até por conta do nível em que se encontra o câmbio, favorável a esse grupo.

Homem foto painel eletrônico Bolsa Valores São Paulo
Homem fotografa painel eletrônico na Bolsa de Valores brasileira, a B3, em São Paulo - Amanda Perobelli - 3.abr.2019/Reuters

Dados B3 apontam que neste ano, até 6 de janeiro, os estrangeiros aportaram cerca de R$ 2,6 bilhões em ações na B3, após já terem encerrado 2021 com um saldo líquido da ordem de R$ 70,7 bilhões, sem considerar as ofertas públicas iniciais (IPO) e subsequentes (follow-on) de ações.

Com o movimento, a participação dos estrangeiros no mercado local passou de cerca de 50,2% em dezembro para 52,5% na quinta-feira (6). Já a fatia das pessoas física passou de 18,6% para 15,7% no mesmo intervalo.

Parte dos brasileiros estaria migrando principalmente para renda fixa, considerada mais segura no cenário de instabilidade local, e de retorno crescente conforme avança a taxa básica de juros, a Selic.

"Já tem algum tempo que o investidor brasileiro parece mais cético, reduzindo as posições em Bolsa, enquanto o estrangeiro tem de certa forma mantido essa alocação, se aproveitando principalmente quando o dólar começa a se valorizar", diz Adauto Lima, economista-chefe da gestora global Western Asset.

Entre as preferências no radar do estrangeiro, costumam se destacar nomes do setor financeiro, como grandes bancos e seguradoras, além das grandes exportadoras de commodities.

Em relatório publicado nesta segunda-feira (10), os analistas do Bank of America (BofA) David Beker, Paula Andrea Soto e Carlos Peyrelongue dizem que mantêm uma visão positiva para 2022 em relação aos grandes bancos brasileiros e aos nomes mais dependentes da dinâmica econômica global, como exportadoras de carne, petróleo e alumínio.

"O portfólio reflete nossa preocupação com os juros mais altos nos Estados Unidos, as eleições e os desafios macroeconômicos no Brasil", dizem os especialistas do banco americano, que tem uma visão neutra para o mercado brasileiro, com a preferência na América Latina cabendo neste momento ao México, por sua maior proximidade com a economia americana.

Por aqui, Bradesco e Porto Seguro, bem como Usiminas, PetroRio e JBS, estão entre as ações prediletas do BofA na América Latina para os próximos 12 meses.

"Conforme o mercado passa por uma reprecificação para incorporar os custos de capital maiores [reflexo da alta da taxa de juros], avaliamos que os grandes bancos e as seguradoras são boas opções em termos relativos, e ainda em preços atraentes", afirmam os analistas do BofA.

Mas a medida que o ano avança, as projeções se tornam mais cautelosas.

Os analistas do banco americano assinalam também que o comportamento da Bolsa brasileira deve seguir sob intensa volatilidade ao longo de 2022.

Eles preveem que a taxa Selic será elevada até 10,75% pelo BC (Banco Central) nas próximas reuniões do Copom (Comitê de Política Monetária), o que tende a drenar recursos da Bolsa para a renda fixa.

"O movimento em direção a uma taxa de juros de dois dígitos já deu início a uma rotação de saída das ações no Brasil que pode estar apenas no início", diz o relatório do BofA.


Maurício Nakahodo, economista sênior do MUFG (Mitsubishi UFJ Financial Group), aponta que, pelos cálculos da instituição financeira, a taxa de juros básica, a Selic, deve chegar até 12,25% em meados de maio.

Ainda assim, prossegue, não deve ser o suficiente para impedir uma desvalorização adicional do real frente ao dólar, diante das incertezas no âmbito doméstico por conta das eleições.

"Anos eleitorais sempre trazem incertezas a respeito da condução da política econômica a partir do próximo ano, independentemente de quem seja eleito, o que pode amenizar o fluxo estrangeiro", afirma o economista sênior.

O banco prevê a cotação da moeda em R$ 5,80 em dezembro de 2022, ante a mediana de R$ 5,60 do mercado indicada pelo relatório Focus do BC.

Segundo Nakahodo, o banco central dos Estados Unidos deve iniciar o ciclo de aperto monetário ainda durante o primeiro semestre, o que tenderá a provocar um fortalecimento do dólar contra a maior parte das demais divisas globais, na esteira da migração de investidores para o mercado americano.

Lima, da Western, acrescenta ainda que o fato de o Brasil não conseguir apresentar um crescimento econômico robusto ao longo dos últimos anos também pode contribuir para manter o estrangeiro um pouco mais cauteloso com o país nos próximos meses.

"O Brasil não consegue entrar em uma dinâmica de retomada de crescimento, o que acaba afastando o investidor estrangeiro", afirma o economista.

"Os mercados emergentes vêm se tornado mais baratos tanto em relação a países desenvolvidos, como também ante as médias históricas. Temos visto um aumento contínuo do prêmio de risco, mas os ventos contrários macroeconômicos pedem um pouco de paciência para uma postura mais otimista", afirma Vinicius Malhães da Silva, vice-presidente sênior e gestor de mercados emergentes da Pimco.

Silva acrescenta que a deterioração dos fundamentos e a desancoragem das expectativas macroeconômicas servirão como amplificadores para o aumento da volatilidade e a redução da confiança já naturalmente esperada para o período eleitoral.

"Nesse sentido, as eleições de 2022 se mesclam com o horizonte de mais médio prazo, à medida que os custos de normalização tanto de política monetária como de política fiscal estão aumentando e só serão totalmente conhecidos depois que um novo governo for eleito", diz o gestor da Pimco.

Ele acrescenta que, embora o arcabouço macro brasileiro tenha se mostrado resiliente a distintas crises recentes, vê oportunidades muito mais especificas e pontuais do que estruturais a favor de ativos no mercado local pelos próximos trimestres.

"Acreditamos que os prêmios de risco mais elevados refletem uma clara piora das expectativas e elevação da incerteza, mas não necessariamente a totalidade dos diferentes cenários futuros possíveis."

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