Lojistas com ponto no Extra reclamam de processo de retirada

Franquias foram avisadas da rescisão unilateral do contrato; GPA nega impedimento de acesso a lojas

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Brasília

Imagine chegar para mais um dia de trabalho e encontrar a loja trancada com correntes, que impedem o acesso tanto dos funcionários quanto dos clientes. Foi o que aconteceu na quinta-feira (13), com os franqueados da fabricante de colchões Ortobom, no Extra Alcântara, no Rio de Janeiro (RJ), no Extra Montese e no Extra Mister Hull, ambos em Fortaleza (CE). A mesma coisa já havia ocorrido no último dia 5 no Extra da Avenida Vasco da Gama, em Salvador (BA), e no final de dezembro com o Extra Niterói.

O motivo para a atitude inusitada foi a rescisão unilateral do contrato de locação do Extra com os lojistas que têm pontos nas galerias que dão acesso aos hipermercados, ou nos estacionamentos das lojas.

Depois que o Extra, controlado pelo GPA (Grupo Pão de Açúcar), vendeu em outubro seus pontos para o Assaí (cujos principais acionistas são os mesmos do GPA), o GPA Malls, responsável pela locação dos espaços, começou um processo de esvaziar os hipermercados, o que passa pela rescisão unilateral dos contratos com os lojistas que tinham negócios nas galerias.

Isso porque as lojas do Extra serão, na sua maioria, reformadas para se tornarem pontos da bandeira de atacarejo Assaí. Em troca, segundo apurou a Folha, o GPA vem oferecendo uma indenização considerada irrisória pelos lojistas: 10% das vendas do primeiro semestre de 2021, um período fraco em vendas por conta da pandemia.

portão branco com cadeado, com fachada em azul escrito Ortobom ao fundo, escrito Ortobom
Unidade do Extra Alcântara, no Rio, fecha acesso da Ortobom aos funcionários da loja e aos clientes - Ortobom

"Mas todos os nossos franqueados estão com o aluguel e demais obrigações contratuais em dia. Eles não podem impedir o acesso, se a própria loja do Extra continua funcionando", disse à Folha o diretor comercial da Ortobom, Rubens Francisco Dias Filho. Os casos das lojas acorrentadas foram resolvidos com a administração de cada loja, perante a ameaça de chamar a polícia.

"Os contratos de locação são com a Ortobom, não com os franqueados. Mas eles enviaram aos lojistas um aviso de que o aluguel estava vencido para desocuparem a loja em 30 dias", afirma Dias, que tem 22 lojas em hipermercados Extra. Segundo ele, a medida é uma maneira de intimidação aos lojistas.

Quem também vem observando essa prática é a Casa do Pão de Queijo. Com 20 franquias em lojas do Extra, a empresa informou que foi afastada das negociações de indenização pelo GPA Malls. "Ficamos muito incomodados com o processo, muito rápido e avassalador. Mas eles não quiseram que a bandeira interferisse. Simplesmente não me atendem no GPA", disse à Folha o diretor de expansão da Casa do Pão de Queijo, Ricardo Bertucci.

Um franqueado da Casa do Pão de Queijo do Extra Anhanguera recebeu uma proposta de indenização de R$ 38 mil, equivalente a 10% do que ele investiu no negócio, e foi avisado 15 dias antes do fechamento do hipermercado. "Eles estavam lá uma vida inteira", diz Bertucci. "Era o ganha-pão de um casal".

Não existe garantia de que, depois de encerrada a reforma do ponto, o lojista possa voltar na administração Assaí. Para alguns franqueados da Casa do Pão de Queijo, por exemplo, foi informado que a empresa não pretende reservar espaços para galeria.

Quem resolveu se manter nos Extras desde novembro começou a enfrentar desconforto físico. O ar-condicionado dos ambientes foi desligado, o acesso ao estacionamento foi bloqueado e até o uso do banheiro foi impedido.

prateleiras brancas vazias em corredor de hipermercado
Prateleiras vazias em hipermercado Extra, às vésperas de ser fechado - Ortobom

Ainda assim, alguns lojistas resistem. A Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes) confirma ter recebido queixas de associados quanto ao processo. Em Belo Horizonte, uma franqueada da Cacau Show acionou a Justiça para manter a operação, mesmo com a unidade do Extra fechada.

Além de Ortobom, Casa do Pão de Queijo e Cacau Show, a Folha apurou que o embate com o Extra atinge franqueados de outras grandes marcas, como Giraffas, Rei do Mate, Oakberry e O Boticário. Nem todos concordam em falar, temendo represálias por parte do GPA Malls, com quem ainda estão em negociação.

"Os clientes estão sendo muito prejudicados: as lojas foram fechadas ou estão com vendas comprometidas, já que o próprio Extra não repõe mais os estoques. As propostas de indenização são pífias, e nem de longe cobrem todos os prejuízos", diz o advogado Daniel Cerveira, que representa algumas redes na negociação com o GPA Malls.

Além disso, afirma Cerveira, a comunicação do GPA foi falha: não foi instituído um comitê para receber os locatários dos espaços e preparar a transição para o encerramento das operações. "Uma conduta passível de ser criticada", afirma. Segundo ele, a atitude não condiz com a de uma empresa que preza pelos conceitos ESG —de governança ambiental, social e corporativa.

Outro Lado

Questionada pela reportagem, a empresa informou, por meio da sua assessoria de imprensa, que "não está impedindo parceiros e lojistas de acessar seus espaços".

De acordo com a companhia, em outubro de 2021 foi comunicado o fim do hipermercado Extra. "Das 103 lojas da rede, 70 pontos comerciais serão convertidos em Assaí, e as demais 33 unidades serão transformadas em outros formatos do GPA ou fechadas", informou a empresa.

Leia a nota enviada à Folha na íntegra:

O GPA esclarece que, independentemente do encerramento das atividades do Extra Hiper, sempre prezou e continuará prezando pelo relacionamento com seus parceiros lojistas, e que a proposta apresentada a eles leva em consideração as características contratuais e as eventuais intervenções que poderão acontecer nos espaços com o novo empreendimento. Vale esclarecer que, neste momento, as negociações estão sendo realizadas pelo GPA, empresa responsável pela gestão das galerias das unidades de hipermercados, individualmente com cada lojista. Nos próximos meses, o GPA fará a cessão desses contratos para o Assaí.

Em relação aos lojistas que permanecerão após a abertura do Assaí, a expectativa é que eles tenham um aumento de fluxo significativo, de pelo menos duas vezes mais quando comparado ao que era registrado anteriormente. Por fim, o tempo que essas 70 unidades negociadas com o Assaí ficarão fechadas depende do cronograma de obras da empresa atacadista, o que ainda será definido e combinado com cada lojista.

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