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Mauro Rochlin

Juros, inflação e eleições

Política monetária fica sobrecarregada quando governos desrespeitam regras básicas de responsabilidade fiscal

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Mauro Rochlin

Doutor em Economia (UFRJ) e professor da FGV (Fundação Getulio Vargas)

A taxa de inflação, medida pelo IPCA, atingiu a marca de 10% em 2021. É a segunda vez em quase duas décadas que o indicador alcança dois dígitos.

Apesar desse mau resultado, os prognósticos para este ano são melhores. O relatório Focus do Banco Central, arauto do mercado financeiro, prevê que a taxa de 2022 será de cerca de 5%.

No Brasil, a estratégia de combate à inflação é concentrada no poder dissuasório da política monetária. Desde 1999, o país adota uma política de juros conhecida como Regime de Metas de Inflação (RMI). A premissa desse modelo é a de que a taxa de juros dos títulos do governo —a taxa Selic— se constitui no principal instrumento de política anti-inflacionária.

Sede do Banco Central em Brasília - Adriano Machado - 29.out.2019/Reuters

O argumento é que a atratividade desses títulos afeta a decisão de consumir (ou de poupar) da população, o que tem forte impacto no comportamento dos preços. O modelo relaciona a alta dos juros à queda do consumo, e, por consequência, à queda dos preços.

Baseado nesse pressuposto, o Banco Central iniciou, em maio do ano passado, um ciclo de alta da Selic. Partindo de um patamar de 2%, a taxa já atinge valor superior a 10%. A ideia é que essa alta arrefeça as pressões de consumo e que isso ajude no controle dos preços.

De fato, os números do PIB (Produto Interno Bruto) do terceiro trimestre de 2021 já apontam uma acomodação no consumo das famílias. A expectativa é que isso se converta em pressão de baixa nos preços, corroborando as previsões do mercado.

O problema aqui é o outro lado da moeda: juros altos também geram menor crescimento econômico e um desemprego maior.

Apesar de a inflação ter registrado um resultado sofrível em 2021, o RMI tem alcançado, ao longo de sua vigência, um relativo sucesso. Nos 22 anos desde sua adoção, o regime ajudou a manter a inflação dentro da meta em 16 ocasiões.

Produto da implosão do sistema de câmbio fixo, que serviu de âncora de preços nos primeiros anos do Plano Real, o RMI tem história: resistiu a duas crises cambiais (1999 e 2002) e a três crises econômicas (2009, 2015 e 2020).

Mesmo diante desses bons resultados, o modelo enfrenta críticas contundentes. Apesar do eventual cumprimento das metas de inflação, o regime também é associado a um crescimento econômico medíocre. Desde a sua implantação, a taxa média de crescimento do PIB está em cerca de 2% ao ano.

Uma taxa de juros permanentemente elevada acompanha esse mau desempenho. Do lado do emprego, o cenário só esteve melhor durante o ciclo de alta das commodities.

Para reduzir a pressão sobre a política monetária, a adoção de uma política fiscal menos perdulária seria imprescindível. Moderar os gastos do governo ajudaria a dosar o consumo e a acalmar o mercado de câmbio.

Com a redução da demanda e com a queda do dólar, os preços tenderiam a se estabilizar. Essa estabilidade, por sua vez, abriria espaço para uma queda consistente da taxa de juros, o que impulsionaria o crescimento do PIB. A partir desse contexto, um círculo virtuoso poderia prosperar.

A corrida eleitoral tem sido um celeiro de políticas públicas excessivamente generosas. Objetivos eleitorais têm inspirado arranjos fiscais de diversos governos. Enquanto o atual cenário recomenda moderação e comedimento na política fiscal, o que se observa são iniciativas, como a PEC dos Precatórios, que driblou o chamado teto dos gastos, pressionando na direção contrária.

Ignorar as regras básicas de responsabilidade fiscal pode sobrecarregar a política de juros e, consequentemente, frear o crescimento econômico. Não parece uma boa ideia.

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