Tarcísio sofre ataque até de aliados com disputa eleitoral em São Paulo

Pré-candidato ao governo paulista, ministro da Infraestrutura enfrenta críticas relacionadas a plano de concessão de Bolsonaro

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Brasília

A um mês de deixar o cargo para se candidatar à disputa pelo governo de São Paulo, o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, virou alvo de críticas e de ataques de aliados de João Doria (PSDB), de opositores de Jair Bolsonaro (PL) e até de grupos empresariais contrariados por decisões do ministro.

Garoto-propaganda de Bolsonaro por conduzir um programa de concessão considerado bem-sucedido pelo governo, Tarcísio não queria se arriscar em São Paulo.

Ministro faz imagem de coração com as duas mãos, em cima de palco, ao lado do presidente
O presidente Jair Bolsonaro e o ministro de Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, durante cerimônia de início do novo contrato de concessão da Dutra e da Rio-Santos - Clauber Cleber Caetano/PR - 04.03.2022

O ministro avaliava ter mais chances com uma candidatura ao Senado, mas Bolsonaro pediu que Tarcísio mudasse de ideia para ele próprio ter palanque garantido em São Paulo —berço do governador João Doria.

Os resultados das últimas pesquisas, no entanto, turbinaram os planos do governo com Tarcísio.

Em dezembro, o Datafolha apontou o ministro com 9% das intenções de voto. O Palácio do Planalto avaliou haver em Tarcísio potencial para avançar no segundo turno.

Desde então, Tarcísio vem aparecendo em eventos privados e palestras com um discurso mais alinhado com Bolsonaro, tecendo elogios à gestão da qual faz parte e direcionando críticas, e até palavrões, contra Lula e Dilma.

Em um evento privado para investidores em São Paulo, há cerca de um mês, Tarcísio disse que deixa a Esplanada até abril para se candidatar, e, sem citar nomes, fez ataques a Doria e aos ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff, ambos do PT.

"Corrupto tem de ir para o inferno, para o raio que o parta, para a puta que pariu", disse. "Por isso que eu não quero ver mais corrupto na Presidência da República. Me preocupa a saudade que alguns têm dessa época."

Engenheiro formado pela Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), fez carreira como servidor da Câmara dos Deputados até ser transferido para a CGU (Controladoria Geral da União), onde chegou a ser coordenador-geral de auditoria da área de transportes.

Escolhido por Dilma, Tarcísio foi diretor-executivo do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte) logo após a faxina contra esquemas de corrupção no órgão deflagrada pela ex-presidente.

Como número 2 do órgão, ele deu os primeiros passos mais concretos de sua jornada na infraestrutura até chegar ao PPI (Programa de Parceria de Investimentos), primeira medida do ex-presidente Michel Temer, em 2016.

Lá passou a monitorar todos os projetos de concessão de infraestrutura no PPI, principalmente o de rodovias. O ministro recentemente afirmou ter tido vontade de ser caminhoneiro devido à paixão pela boleia. A categoria é uma das principais aliadas do governo e Tarcísio até hoje participa de grupos de caminhoneiros.

Tornou-se ministro no momento em que teve a chance de entrar no gabinete de Bolsonaro ainda no governo de transição, na sede do Centro Cultural Banco do Brasil, em Brasília, para defender a manutenção do PPI.

O Ministro de Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, e o presidente Jair Bolsonaro - Alan Santos - 11.set.2020/PR

Naquele momento, o programa tinha leiloado somente 22 projetos de rodovias, ferrovias, portos e aeroportos, garantindo cerca de R$ 14,5 bilhões em investimentos.

Entre 2019 e 2021, foram 81 projetos de infraestrutura logística concedidos à iniciativa privada com investimentos de R$ 76,2 bilhões.

Tarcísio deixará o cargo com a previsão de conceder 25 aeroportos, 15 rodovias, 4 ferrovias e 30 portos e terminais, o que destravaria R$ 109,5 bilhões em investimentos.

Esse desempenho garantiu boas notícias a Bolsonaro que, nos últimos três anos, vem enfrentando quedas na sua popularidade devido a derrotas políticas decorrentes de projetos malfadados, aos estragos causados pela pandemia e, mais recentemente, à deterioração dos fundamentos da economia (inflação e juros, especialmente) com a guerra na Ucrânia —que fez disparar os preços de alimentos e do petróleo.

O ministro usa os resultados de sua administração e, em eventos e palestras, discursa com o tom de um realizador destemido que, segundo ele, não tem medo de "arregaçar as mangas" e passar por cima de qualquer dificuldade.

Seu crescimento nas pesquisas vem levando opositores a se articularem nas redes sociais para atacá-lo e até relativizar o sucesso de seu plano de concessão —carro-chefe da campanha.

Até mesmo em partidos aliados, como o Republicanos, PP, de Ciro Nogueira, e o PL —partido ao qual Tarcísio se filiou— correm críticas.

Empresários ligados a esses políticos fizeram circular nas últimas duas semanas uma postagem em redes sociais mostrando que o ministro é citado pela PF em investigações de corrupção no Dnit, uma forma de desgastar a imagem de "bom moço" do ministro. Tarcísio nunca foi alvo da PF.

Aliados de Doria, que apoia Rodrigo Garcia (PSDB) para o governo de São Paulo, partiram para o ataque contra a concessão da NovaDutra, arrematada pela CCR em leilão no final do ano passado, e que trará R$ 14,8 bilhões em investimentos.

Em tom de campanha, o contrato teve cerimônia de assinatura e contou com o presidente Bolsonaro.

O governo federal divulgou um vídeo institucional do projeto, que vem sendo questionado em São Paulo.

Aliados de Doria criticam o fato de o projeto só prever a duplicação da rodovia Rio-Santos, uma contrapartida de investimento, e o fato de os pedágios da NovaDutra nos trechos de São Paulo terem ficado com descontos muito menores (3%) do que os do Rio de Janeiro (21%).

Fundos de investimento de infraestrutura e grupos empresariais que falaram sob anonimato com a Folha avaliam que a modelagem de muitos projetos, principalmente de ferrovias e rodovias, favoreceu a Rumo e a CCR.

Essas críticas também surgem nas conversas com terminais portuários que viram seus planos de renovação afundar depois de recusas de Tarcísio, que pretende modernizar a rede de acesso ao porto de Santos (SP), antes de privatizá-lo.

Segundo eles, no caso da Rumo, as concessões adquiridas em ferrovias especialmente consolida sua posição como grupo de logística, integrando rodovias e ferrovias para o escoamento de produtos.

A CCR, consolida sua posição na oferta de soluções de transportes integrados —aeroportos, rodovias, e mobilidade urbana.

A crítica é de que os projetos teriam sido precificados para menos, o que explica ágios muito elevados que só poderiam ser pagos por grupos bem capitalizados.

A secretária de Fomento, Planejamento e Parcerias do Ministério de Infraestrutura nega qualquer tipo de direcionamento.

À Folha ela afirma que todos os projetos foram desenhados com base no apetite do mercado e que a precificação (valor da concessão) foi calculada dentro de parâmetros adequados e aprovados pelo TCU (Tribunal de Contas da União).

"De fato, grupos como a Rumo e a CCR se fortaleceram nos últimos leilões, mas isso por uma questão de estratégia deles", disse Marcassa. "Os projetos foram elaborados inclusive prevendo a entrada de novos grupos estrangeiros, mas eles desistiram devido ao risco-país."

Sócio da Inter B, consultoria Internacional de Negócios, o economista Cláudio Frischtak, assessorou diversos grupos nacionais e estrangeiros nas concessões de infraestrutura.

Para ele, Tarcísio escolheu projetos que dariam mais exposição e o problema não foi de modelagem, mas de idealização da concessão.

"A BR-163, por exemplo, é uma ativo cujo desenho foi mal feito", disse Frischtak. "Foi feito para não dar competição."

Segundo ele, o governo seguiu o modelo de concessão da gestão do ex-presidente Michel Temer e selecionou os projetos mais "sexies" para levar adiante.

"Veja que poucas deram vazio. O único caso de insucesso foi o da BR-381 [conhecida como Rodovia da Morte, entre MG e ES], que o ministério tenta pela segunda vez tornar o projeto atrativo", diz Frischtak.

O Ministério informa que "vem aprendendo com a modelagem dos projetos" e que a BR-381 é um desafio, pela geografia (serra) e riscos de investimento atrelados à obra em um momento de alta de custos de insumos. O projeto "voltou à prancheta" e deve ser leiloado novamente ainda neste ano.

Por meio de sua assessoria, o ministério afirma que Tarcísio "não figura como alvo em nenhuma das investigações". Diz que, como gestor, ele assinou contratos seguindo "trâmites e exigências legais", amparado por pareceres técnicos e jurídicos do órgão e que "não tinham como antever a ocorrência de eventuais irregularidades".

A pasta diz ainda que, no caso da NovaDutra, as críticas não têm fundamento porque os valores das tarifas de pedágio variam de acordo com a distância de cobertura de cada praça de pedágio. "Quanto maior a distância de uma praça para outra, maior será o preço de pedágio entre elas."

"Cabe esclarecer ainda que os investimentos definidos no projeto são provenientes de estudos de demanda e capacidade viária, sem distinção entre os estados, considerando-se tão somente critérios técnicos para a decisão", diz a pasta.

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