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Bitcoin age cada vez mais como uma mera ação de tecnologia

Traders estão tratando a criptomoeda, antes considerada reserva de longo prazo, como um investimento especulativo

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David Yaffe-Bellany
The New York Times

O bitcoin foi concebido há mais de uma década como "ouro digital", uma reserva de valor de longo prazo que resistiria a tendências econômicas mais amplas e forneceria uma proteção contra a inflação.

Mas a queda do preço do bitcoin no mês passado mostra que essa ideia está muito longe da realidade. Em vez disso, os traders estão tratando cada vez mais a criptomoeda como apenas um investimento especulativo em tecnologia.

Desde o início deste ano, o movimento dos preços do bitcoin se assemelha ao do Nasdaq, referência fortemente influenciada por ações tecnológicas, segundo uma análise da empresa de dados Arcane Research.

Isso significa que, à medida que o preço do bitcoin caiu mais de 25% no mês passado, para menos de US$ 30 mil (R$ 154 mil) na quarta-feira (11) –menos da metade do pico de novembro–, a queda veio quase empatada com um colapso mais amplo das ações de tecnologia, uma vez que os investidores enfrentavam taxas de juros mais altas e a Guerra da Ucrânia.

Representação da criptomoeda bitcoin - Dado Ruvic - 6.ago.2021/Reuters

A crescente correlação ajuda a explicar por que as pessoas que compraram a criptomoeda no ano passado, esperando que ela valorizasse, viram seu investimento despencar. Embora o bitcoin sempre tenha sido volátil, sua crescente semelhança com ações de tecnologia arriscadas mostra claramente que sua promessa como um ativo transformador ainda não foi cumprida.

"Isso deslegitima o argumento de que bitcoin é como ouro", disse Vetle Lunde, analista da Arcane. "As evidências apontam a favor de o bitcoin ser apenas um ativo de risco."

A Arcane Research atribuiu uma pontuação numérica entre 1 e -1 para captar a correlação de preços entre o bitcoin e o Nasdaq. Uma pontuação 1 indicava uma correlação exata, significando que os preços se moviam em conjunto, e uma pontuação -1 representava uma divergência exata.

Desde 1º de janeiro, a média de 30 dias da pontuação bitcoin-Nasdaq se aproximou de 1, atingindo 0,82 nesta semana, o mais próximo que já esteve de uma correlação exata de 1 para 1. Ao mesmo tempo, o movimento do preço do bitcoin divergiu das flutuações do preço do ouro, ativo com o qual foi comparado com mais frequência.

A convergência com o Nasdaq cresceu ao longo da pandemia de coronavírus, impulsionada em parte por investidores institucionais como fundos de hedge, doações e family offices que despejaram dinheiro no mercado de criptomoedas.

Ao contrário dos idealistas que promoveram o entusiasmo inicial pelo bitcoin na década de 2010, esses traders profissionais estão tratando a criptomoeda como parte de uma carteira maior de investimentos em tecnologia, de alto risco e alto retorno.

Alguns deles sofrem pressão para garantir retornos de curto prazo para os clientes e estão menos comprometidos ideologicamente com o potencial de longo prazo do bitcoin. E quando perdem a fé na indústria de tecnologia de forma mais ampla isso afeta seus negócios de bitcoin.

"Cinco anos atrás, as pessoas que estavam em cripto eram pessoas criptográficas", disse Mike Boroughs, fundador do fundo de investimento em blockchain Fortis Digital. "Agora você tem gente em toda a gama de ativos de risco. Então, quando eles são atingidos lá, isso afeta sua psicologia."

Preocupações no mercado de ações –afetadas por tendências econômicas desafiadoras, incluindo a invasão da Ucrânia pela Rússia e os níveis históricos de inflação– se manifestaram especialmente na queda das ações de tecnologia este ano. A Meta, empresa antes conhecida como Facebook, caiu mais de 40%. A Netflix perdeu 70% do seu valor.

Na quarta-feira (11), as ações da exchange de criptomoedas Coinbase despencaram 26%, depois de relatar uma queda na receita e perda de US$ 430 milhões (R$ 2,20 bilhões) no primeiro trimestre. As ações da empresa caíram mais de 75% no total este ano.

O Nasdaq já está em território de baixa, tendo encerrado a quarta-feira com queda de 29% em relação ao recorde de meados de novembro. Foi também em novembro que o preço do bitcoin atingiu um pico de quase US$ 70 mil (R$ 359 mil). A queda foi um choque de realidade para os evangelistas do bitcoin.

"Havia essa crença inegável no varejo de que o bitcoin no final do ano passado era uma proteção contra a inflação –era um porto seguro, substituiria o dólar", disse Ed Moya, analista de criptomoedas da trading Oanda. "E o que aconteceu foi que a inflação começou a ficar muito feia e o bitcoin perdeu a metade do valor."

Os preços de outras criptomoedas também foram esmagados. O preço do ether, a segunda criptomoeda mais valiosa, caiu cerca de 25% desde o início de abril, para menos de US$ 2.300 (R$ 11.800). Outras, como solana e cardano, também sofreram quedas vertiginosas este ano.

O bitcoin se recuperou de grandes perdas antes, e seu crescimento em longo prazo continua impressionante. Antes do boom dos preços das criptomoedas na pandemia, seu valor pairava bem abaixo de US$ 10 mil (R$ 51,3 mil hoje). Os verdadeiros crentes, que se autodenominam maximalistas do bitcoin, permanecem inflexíveis em que a criptomoeda acabará por romper sua correlação com os ativos de risco.

Michael Saylor, CEO da empresa de inteligência de negócios MicroStrategy, gastou bilhões de dólares em bitcoin, acumulando um estoque de mais de 125 mil moedas. Como o preço do bitcoin caiu, as ações da empresa despencaram cerca de 75% desde novembro.

Em um e-mail, Saylor culpou "traders e tecnocratas" que não apreciam o potencial de longo prazo do bitcoin para transformar o sistema financeiro global.

"No curto prazo, o mercado será dominado por aqueles com menos apreço pelas virtudes do bitcoin", disse ele. "No longo prazo, os maximalistas terão acertado, porque bilhões de pessoas precisam dessa solução, e a conscientização se espalha para milhões a cada mês."

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