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Senado estuda usar orçamento secreto para pagar piso da enfermagem

Proposta é vista com ressalvas por congressistas

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Brasília

Em reunião de líderes nesta segunda-feira (19), senadores discutiram a possibilidade de destinar uma parte das emendas de relator —instrumento usado como moeda de troca nas negociações com o Congresso— para garantir o pagamento do piso nacional da enfermagem.

A reunião foi convocada pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), exclusivamente para tratar do assunto, depois que o STF (Supremo Tribunal Federal) manteve a suspensão do piso, na semana passada.

A proposta de usar o orçamento secreto é vista, no entanto, com ressalvas por Pacheco e pelo relator-geral do Orçamento de 2023, senador Marcelo Castro (MDB-PI).

Segundo Castro, a ideia de usar as emendas de relator que já estão reservadas para a Saúde faria com que o governo federal descumprisse o investimento mínimo assegurado pela Constituição.

Paciente com Covid é atendido em UTI , no Hospital da Santa Casa de Misericórdia, em Araraquara (SP)
Paciente com Covid é atendido em UTI , no Hospital da Santa Casa de Misericórdia, em Araraquara (SP) - Rubens Cavallari - 11.mar.2021/Folhapress

Já Pacheco tem ponderado que existem ao menos outras quatro opções na mesa e que uma das alternativas pode ser o remanejamento de recursos de estados e municípios.

Horas depois, o presidente do Senado teve uma reunião com o ministro da Economia, Paulo Guedes, para tratar da fonte de financiamento para o piso da enfermagem. Pacheco afirmou que Guedes não se comprometeu com nenhuma das propostas, mas solicitou as ideias para que pudesse discutir com sua equipe.

Como mostrou a Folha, o governo Jair Bolsonaro (PL) enviou a proposta de Orçamento para 2023 com uma previsão de corte de 42% nas verbas discricionárias do Ministério da Saúde. Para cumprir o gasto mínimo assegurado pela Constituição, o Executivo vai depender do chamado orçamento secreto.

A pasta terá direito a R$ 20,3 bilhões para despesas não obrigatórias, segundo a proposta do Ministério da Economia. À primeira vista, o valor parece maior que os R$ 17 bilhões iniciais indicados no envio do projeto de Orçamento de 2022. No entanto, do montante previsto para o ano que vem, R$ 10,42 bilhões estão numa reserva de emendas de relator.

O líder da minoria no Senado, Jean Paul Prates (PT-RN), afirmou à imprensa que a ideia de usar o orçamento secreto foi bem recebida pelos senadores porque ajudaria a melhorar a imagem do Congresso.

"Esses recursos, R$ 10 bilhões, já estão no orçamento da Saúde. Ocorre que eles estão livres para os atendimentos paroquiais, individuais. O que se faria nesse caso seria carimbar isso para o piso da enfermagem, pelo menos neste Orçamento. Operacionalmente, em termos de Orçamento, ajudaria a pagar essa conta e, politicamente, ajudaria o Congresso a melhorar a sua imagem."

Já Castro afirmou que vai propor ao Senado que o piso da enfermagem fique de fora do teto de gastos do ano que vem, assim como os custos para manter o valor atual do Auxílio Brasil.

"Não basta você ter uma fonte para pagar porque nós temos a lei do teto de gastos, que é constitucional. Os dois principais candidatos à presidência são Lula e Bolsonaro. Ambos já se comprometeram a manter o Bolsa Família, que hoje é chamado de Auxílio Brasil, em R$ 600, porque os R$ 600 estão garantidos até dezembro", afirmou Castro.

"Todos sabemos que o Orçamento de 2023 não comporta essa despesa. Não tem espaço orçamentário. Só há uma alternativa, que é 'excepcionalizar' o teto de gastos. Se nós vamos realmente excepcionalizar o teto de gastos para cumprir a promessa que o Lula e o Bolsonaro fizeram, então vamos excepcionalizar para cumprir a questão da enfermagem, da farmácia popular", complementou.

Também estão em discussão ao menos outras quatro propostas: o remanejamento de recursos orçamentários; a reedição da repatriação de recursos alocados no exterior; a destinação direta de recursos da União para hospitais filantrópicos e Santas Casas; e o Regime Especial de Atualização e Regularização Patrimonial, proposta que já foi aprovada no Senado e está na Câmara dos Deputados.

Ainda na noite de segunda-feira, Pacheco afirmou que o remanejamento de recursos pode resultar na disponibilização de R$ 7 bilhões para o piso da categoria. Essa ação está prevista em um projeto de lei em tramitação no Senado que prevê o remanejamento de recursos orçamentários ociosos nos fundos de saúde de estados e municípios. Esses montantes poderiam ser destinados para cobrir o custo do piso nacional da enfermagem.

"Esse impacto do remanejamento orçamentário, que foi abordado pela consultoria, é de no mínimo R$ 7 bilhões, esse remanejamento de rubricas anteriores, de exercícios anteriores que poderiam ser utilizados em 2023 e 2024", afirmou Pacheco, após participar de evento da Associação dos Juízes Federais do Brasil.

O senador mineiro também apontou que a última repatriação de valores ao Brasil envolveu em torno de R$ 150 bilhões, resultando em arrecadação para os entes federados de R$ 46 bilhões. Esses recursos, argumenta, também poderiam ser usados para esse fim.

Pacheco afirmou que ainda não há data para a reunião com o ministro Luís Roberto Barroso, do STF. Ele afirmou que uma proposta que será levada se refere ao piso para as entidades privadas, que passaria por um processo de "inversão do ônus". Ou seja, antes de encontrar a fonte para bancar os custos extras, seria necessário medir o impacto para a iniciativa privada.

"Em relação a esse item específico, o que eu proporia como algo que considero absolutamente justo é que se pudesse ter a efetivação do piso nacional da enfermagem e uma aferição ao longo de 60 dias, 90 dias do que é o real impacto para o setor privado do piso nacional da categoria, para que, a partir desse impacto concretizado e demonstrado, nós possamos fazer uma desoneração que seja justa, uma desoneração que possa de fato equivaler ao impacto do que é para o setor privado", afirmou.

O piso nacional da enfermagem, aprovado pelo Congresso, fixou o salário de, no mínimo, R$ 4.750 para os enfermeiros. Técnicos em enfermagem devem receber 70% desse valor (R$ 3.325), e auxiliares de enfermagem e parteiros, 50% (R$ 2.375).

A decisão do STF que suspendeu o pagamento dos novos valores vale "até que seja esclarecido" o impacto financeiro da medida para estados, municípios, hospitais filantrópicos e Santas Casas.

Durante a reunião de líderes, senadores afirmaram que a questão foi "super dimensionada", já que alguns estados e municípios pagam acima do piso.

"Há aí um certo oportunismo de querer tirar proveito dessa situação. Fazendo as contas bem feitinhas, nós vamos ver que o problema não é tão grande assim, não", afirmou o senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR). "Eu acho que a gente deve caminhar para uma solução mista."

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