Descrição de chapéu Folhajus mercado de trabalho

Trainee só para negros não é discriminatório, decide Justiça em ação de R$ 10 milhões

Defensor da União processou Magazine Luiza pelo que chamou de 'marketing da lacração'; cabe recurso

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São Paulo

A 15ª Vara do Trabalho de Brasília (DF) decidiu nesta quinta (3) que o programa de trainee exclusivo para candidatos negros realizado pelo Magazine Luiza desde 2020 não é discriminatório.

"Ao contrário, demonstra iniciativa de inclusão social e promoção da igualdade de oportunidades", escreveu a juíza do trabalho substituta Laura Ramos Morais, na decisão.

A ação civil pública foi iniciada pela DPU (Defensoria Pública da União) em outubro de 2020, alguns dias depois de a varejista anunciar que apenas candidatos negros seriam aceitos em seu programa, e pedia R$ 10 milhões em indenização por danos morais.

Magalu realiza primeiro programa de trainee da empresa exclusivo para pessoas negras
Magalu realizou em 2020 o primeiro programa de trainee da empresa exclusivo para pessoas negras - Reprodução

O defensor público da União Jovino Bento Junior, que assinou a ação contra a iniciativa, chamou o programa de "marketing da lacração", que tem "por objetivo não só o ganho político, mas também a ampliação dos lucros e faixa de mercado da empresa."

No pedido, defendeu que a medida gerava a exclusão de outros grupos de trabalhadores –como mulheres, asiáticos, indígenas e estrangeiros (ele citou, segundo a juíza, venezuelanos que vivem no Brasil).

A DPU afirma, em nota, que o defensor público federal que assina a ação ainda avalia a questão.

O Magazine Luiza diz, em nota, que sempre esteve convicto da legalidade e legitimidade do seu programa de trainee exclusivo para negros. A decisão, segundo a rede de lojas, "é de extrema relevância, pois dá ainda mais segurança jurídica para que outras empresas também promovam ações afirmativas de natureza semelhante."

O MPT (Ministério Público do Trabalho) afirmou, em parecer, que a "defesa dos interesses da população branca ou de outros grupos não contemplados pelo processo seletivo" não integravam as atribuições constitucionais da DPU.

Defendeu também que a ação contra o programa de trainee era um "agir isolado" do defensor público.

O programa de trainee exclusivo para negros do Magazine Luiza atraiu atenção –e alguma oposição desde o anúncio. Na primeira edição, 22 mil recém-formados se inscreveram e 19 foram selecionados. Na mais recente, 10 viraram trainees da rede, entre 15 mil inscritos.

Depois dele, outras empresas como Bayer, Dow e Folha também realizaram treinamentos exclusivos para candidatos negros.

A juíza do trabalho Laura Ramos Morais escreveu na decisão que negou o pedido contra o trainee que o Brasil promulgou, em janeiro deste ano, a Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância.

A convenção define que medidas especiais e ações afirmativas "não constituirão discriminação racial, desde que essas medidas não levem à manutenção de direitos separados para grupos diferentes e não se perpetuem uma vez alcançados seus objetivos."

Para a magistrada, o programa de trainee está protegido pela convenção, pela Constituição Federal, pelo Estatuto da Igualdade Racial (lei nº 12.288/10) e pela jurisprudência do STF (Supremo Tribunal Federal).

Defensor pediu afastamento do cargo e proteção

O defensor público Jovino Bento Júnior chegou a pedir afastamento do cargo após relatar ter sido ameaçado, mas o pedido foi negado. Ele afirmou à DPU (Defensoria Pública da União) ter sido ameaçado em decorrência da proposição da ação. Em uma mensagem enviada a ele, afirma, um homem dizia que iria "descarregar duas pistolas na cabeça" do defensor.

A decisão do defensor de contestar a legalidade do trainee da rede varejista gerou reações entre os colegas de instituição. A Anadef (Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais) divulgou nota defendendo a promoção de ações afirmativas como instrumentos para a prevalência de direitos e liberdades.

A Defensoria Pública da União afirmou que a atuação dos defensores públicos federais se baseia no princípio da independência funcional. "Por isso, não depende de prévia análise de mérito ou autorização hierárquica superior."

A DPU diz ainda que é comum que membros da instituição atuem em um mesmo processo judicial em polos diversos e contrapostos e, por isso, é fundamental o respeito à pluralidade de pensamentos e à diferença de opiniões.

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