Descrição de chapéu Banco Central juros

Concessão de crédito para empresas cai em janeiro, mas ainda supera anos anteriores

Crédito fica ainda mais caro e inadimplência sobe em meio à preocupação com crise na economia

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Brasília

Em meio à preocupação crescente do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e de economistas com o risco de uma crise de crédito no país na esteira do caso Americanas, as concessões de novos empréstimos e financiamentos para empresas recuaram em janeiro, segundo dados divulgados pelo Banco Central nesta segunda-feira (27).

O volume de concessões para clientes corporativos, contudo, ainda supera anos anteriores, mesmo em um cenário de crédito mais caro –puxado pelo elevado patamar de juros, com a taxa básica (Selic) em 13,75% ao ano– e alta da inadimplência.

Nos recursos livres, em que as taxas são negociadas livremente entre bancos e clientes, foram R$ 201,6 bilhões concedidos a pessoas jurídicas em janeiro, ante R$ 213,6 bilhões em dezembro de 2022. Isso representa um recuo de 5,6% no período. Em 12 meses, por sua vez, houve um crescimento de 16,8%.

A série considera o valor ajustado, com a finalidade de minimizar os efeitos sazonais que incidem sobre os dados.

Sede do Banco Central, em Brasília - Pedro Ladeira - 4.mai.22/Folhapress

Para Michael Burt, economista da LCA Consultores, o nível ainda elevado das concessões de crédito se justifica pelo forte ritmo da atividade econômica ao longo do último ano, com a retomada do setor de serviços no pós-pandemia de Covid-19.

Outra explicação, segundo ele, é a manutenção do spread bancário (diferença entre o custo de captação dos bancos e a taxa final cobrada do cliente) dentro da média histórica, atualmente em 12,7%.

O especialista, entretanto, ressalta que a tendência é de queda. "Minhas projeções indicam que os juros vão continuar crescendo, o spread bancário vai continuar crescendo, isso vai afetar o volume de concessões de crédito. Mesmo que eles [empréstimos] estejam em um elevado nível histórico, eles vão sofrer queda ao longo desse ano", afirma.

Um eventual "efeito dominó" do caso Americanas, varejista que pediu recuperação judicial em janeiro após revelar problemas contábeis, acendeu o alerta de analistas e de membros do governo sobre os impactos na economia. Nos últimos dias, o Ministério da Fazenda passou a emitir recados mais contundentes sobre a possibilidade de uma crise de crédito no país.

Segundo o chefe do departamento de estatísticas do BC, Fernando Rocha, o impacto do caso da varejista nas estatísticas de janeiro ainda é "incipiente", apesar da redução no crédito a empresas no primeiro mês do ano.

Ainda assim, ele reforçou em mais de um momento durante a entrevista a jornalistas que a queda no crédito a pessoas jurídicas foi maior em janeiro de 2023 que em anos anteriores, indicando uma desaceleração na modalidade.

"É muito cedo para dizer. O primeiro anúncio do caso das Americanas aconteceu por volta de 9 de janeiro [a divulgação foi no dia 11 de janeiro], então, pegamos todas as concessões ocorridas no mês, o saldo no final de janeiro, o impacto ainda é incipiente, muito inicial", disse.

"O que a gente viu nos dados de janeiro é que a redução do crédito para pessoas jurídicas tem um forte caráter sazonal", acrescentou.

Segundo Rocha, a antecipação de duplicatas, recebíveis e faturas de cartão tradicionalmente apresentam redução em meses de janeiro após alta em dezembro. Isso porque há uma tendência de crescimento de liberação de crédito ao final de cada trimestre e uma reversão com queda no início de cada trimestre posterior.

"As principais modalidades que tiveram redução no saldo dentro das operações do crédito livre com pessoas jurídicas foram aquelas que apresentam comportamento sazonal, principalmente relacionadas à antecipação de recebíveis, seja por desconto de duplicatas e recebíveis, seja a antecipação de fatura do cartão", destacou.

De acordo com o técnico do BC, essas modalidades representaram 77% da queda do crédito livre para empresas no mês passado.

Burt, da LCA Consultores, também não viu um efeito nítido do caso Americanas sobre os dados de crédito relativos a janeiro. Mas o economista ressalta que os números mostram sinais do que pode estar por vir nos próximos meses.

O primeiro indicativo, segundo ele, foi o aumento de 2,4 pontos percentuais no spread bancário das novas operações em crédito livre para pessoas jurídicas. "Esse aumento na passagem mensal foi o segundo maior da série histórica, que tem início em março de 2011", disse.

O segundo sinal apontado pelo economista foi uma redução da participação de descontos de duplicatas no total de crédito desembolsado para as empresas para janeiro.

Para o especialista, os dados apresentados pelo BC em janeiro não afastam o temor de uma crise de crédito no país. A autoridade monetária mostrou que o estoque total de crédito no Brasil caiu 0,3% no mês, a R$ 5,317 trilhões.

Sem retirar o efeito sazonal, as concessões de financiamentos com recursos livres para pessoas jurídicas somaram R$ 181,6 bilhões em janeiro. O valor representa um recuo de 24,8% em relação a dezembro de 2022, quando foram concedidos R$ 241,4 bilhões.

A taxa de juros média anual cobrada de empresas nas operações de crédito livre variou de 23,1% em dezembro de 2022 para 25,3% um mês mais tarde –alta de 2,2 pontos percentuais.

Apenas entre pessoas jurídicas, a inadimplência no segmento de recursos livres atingiu 2,3% em janeiro deste ano, aumento de 0,2% na comparação com o mês anterior.

Como mostrou a Folha, o aumento da inadimplência, os sinais de maiores dificuldades financeiras enfrentadas por empresas e os riscos para a atividade econômica levam uma ala de economistas a acreditar que o BC pode ter de reavaliar seu cenário com a antecipação do corte da Selic.

Já outros consideram que o risco fiscal —traduzido na expansão de despesas e na ausência de um desenho concreto do novo arcabouço de gastos— e a inflação resiliente ainda são preponderantes e inspiram cautela, justificando a manutenção da política monetária adotada pelo BC.

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