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Empresas podem definir seu próprio preço, diz presidente da Petrobras sobre fim do PPI

Após cinco meses no cargo, Prates diz que próximo desafio é aprovar nova política de dividendos

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Rio de Janeiro

Prestes a completar cinco meses no comando da Petrobras, Jean Paul Prates considera que tem encaminhado "sem traumas" a agenda prometida pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Uma prova, afirma, é que as ações da estatal subiram no dia da mudança na política de preços dos combustíveis.

"Ao contrário dos que alguns achavam, porque o PPI [preço de paridade de importação] é mais fácil de calcular", diz. "Mas não é possível que não se entenda que a empresa pode fazer o seu preço de acordo com as variáveis e restrições que tem".

Em entrevista à Folha, Prates diz que o próximo desafio de sua gestão é aprovar nova política de dividendos, que deve transferir parte dos recursos hoje direcionados a acionistas para investimentos em novos segmentos, como renováveis e petroquímicas, mas sem desassistir investidores.

E defende uma chance para testar a existência de petróleo na bacia da foz do Amazonas, após negativa de licença pelo Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis). "A possibilidade de vazamento é muitíssimo remota", alega.

Prates diz que uma missão de sua gestão é conciliar interesses políticos do acionista controlador com os interesses do acionista privado. O presidente Lula, afirma, participa de debates estratégicos do setor, mas a empresa não é um "departamento do governo".

O presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, no escritório da empresa, no centro do Rio de Janeiro - Eduardo Anizelli/ Folhapress

O sr. está completando cinco meses à frente da empresa. Que balanço o sr. faz desse período? A gente já conseguiu encaminhar sem traumas a maior parte do programa de governo do presidente Lula, um programa legitimamente eleito que não continha exageros, apenas repunha as coisas nos seus devidos lugares. Na questão do PPI, por exemplo, aconteceu algo que eu não esperava: no dia em que anunciamos nossa estratégia comercial, a ação subiu. Ao contrário do que alguns acharam, porque o PPI é mais fácil de calcular. Mas não é possível que não se entenda que a empresa pode fazer o seu preço de acordo com as variáveis e com e restrições que ela tem. As empresas fazem assim em qualquer mercado, com qualquer produto. E aí eu acho que a gente explicou isso com tranquilidade suficiente.

E também a questão de transição energética, o mercado realmente entendeu que a empresa passou a garantir um futuro. Antes era uma coisa de curtíssimo prazo. Estavam preparando a empresa para vender. O primeiro estágio foi torná-la altamente lucrativa, com a estrutura mínima, ficando só com o coração do coração da empresa, que é produzir pré-sal e quatro ou cinco refinarias do Sudeste.

Uma empresa tiro curto, uma empresa que certamente não duraria mais outros 70 anos, porque ia encontrar ali na frente a transição energética, não ia ter novas reservas porque já não estava fazendo mais exploração significativa. Vamos voltar a ser uma empresa nacional, vamos ampliar um pouco mais os raios de ação. Vamos buscar viabilidade em áreas novas para preparar o futuro. Sem cometer nenhum desatino, nenhum exagero. Mas vamos ver eólica, vamos ver solar, vamos olhar hidrogênio, vamos conversar com as nossas congêneres.

Acha que esse sentimento está se refletindo na valorização das ações? Acho que o pessoal está percebendo que é uma administração responsável, que a gente consegue conciliar a política, a relação com o acionista controlador com as expectativas de mercado. O grande desafio dessa gestão é mostrar justamente que é possível administrar uma empresa estatal mista.

E quando não for possível fazer isso, conseguindo explicar ao outro lado o porquê. Tanto explicar ao acionista que a Petrobras tem um papel na estruturação do desenvolvimento brasileiro, quanto explicar ao governo que não se pode fazer tudo como se fosse um departamento do governo, que tem que atender algumas expectativas dos outros acionistas para não quebrar esse laço de confiança.

A nova política de dividendos vai seguir essa linha? Já há alguma fórmula? É uma negociação com o acionista: 'deixa mais um real comigo, que ele vai render melhor do que ficando com você'. Não é partir de um percentual [específico de dividendos], mas da necessidade investimento. Eu tenho algumas reservas sobre essa questão de ter sempre uma regra. A empresa tem que ter alguma flexibilidade.

Nós não vamos deixar ninguém sem dividendos, desassistido. Mas há uma diferença enorme entre o exigido por lei e o modelo atual, um ponto aí no meio que dá para deixar todo mundo confortável. [A mudança] não vai ser no primeiro ano nem no primeiro mês, por isso a gente confirmou o mesmo nível de dividendos [no primeiro trimestre]. Talvez no próximo a gente faça alguma mudança ligeira, depois mais um pouco, tem que ser uma coisa parcimoniosa, que não gere um trauma muito grande.

Mas vocês devem antecipar essa redução de dividendos com um programa de recompra de ações, certo? A recompra de ações vai ser discutida. Enquanto não tem projetos para trocar [pelos dividendos], é uma forma de tratar isso. O diretor financeiro está trabalhando em uma proposta. Não estou confirmando que vai acontecer logo, mas a gente tem essa intenção. Pode ser que não seja uma proposta completa, pode ser o primeiro passo, ou o segundo passo. A gente não precisa fazer tudo de uma vez.

E o plano de negócios será revisto antes do fim do ano? Um ajuste do plano passado deve sair agora em julho ou agosto, incorporando as novas diretrizes que divulgamos, com um pouco de petroquímica, fertilizantes, um investimento mais forte em transição energética. Não tem surpresa nenhuma, tudo que a gente já falou é o que vai sair. Algum projeto de renovável provavelmente [vai entrar], estamos vendo coisas interessantes.

O plano anterior previa um valor significativo para a exploração da margem equatorial e agora vocês tiveram esse revés na foz do Amazonas... [Interrompe] Eu ainda não considero um revés, não. [A negativa da licença] é decepcionante, mas faz parte da atividade de petróleo. Antes [no governo Bolsonaro], houve entendimentos entre os órgãos governamentais e a Petrobras que nem sempre eram eficientes. É o caso do Ibama, por exemplo, ter exigido que a sonda fosse parar lá [na locação].

O atual Ibama entende que aquilo era para criar uma espécie de fato consumado. [A empresa] dizia assim: "a gente está com a sonda mobilizada, está custando não sei quantos milhões". É a bravata típica, né? O cara aluga uma terra em cima de uma duna, aí resolve fazer um negócio que não pode fazer e depois fica dizendo que o órgão ambiental não quer deixar, que está atravancando.

A gente não quer entrar nesse tipo de debate, a gente quer o debate técnico: o que vocês querem que a gente faça lá? Não existe nenhum operador de petróleo mais capacitado e mais cuidadoso com o meio ambiente e com a floresta amazônica do que a Petrobras. Não existe operador melhor para testar a hipótese de ter petróleo ali.

Então vocês não consideram um fim de linha? Não. Apresentamos um recurso, que contém novas argumentações, novos compromissos e já colocamos estruturas novas à disposição em cima das novas exigências do Ibama. Se, no limite, o estado brasileiro entender que aquilo é uma área interditada para a perfuração de petróleo, nós vamos respeitosamente sair de lá e explorar em outras áreas da margem equatorial.

Aquela área foi concedida pela União e há uma obrigação de cumprir um programa de trabalho que inclui esse poço. Se não, estamos sujeitos a multa. Agora, se for esperar a AAAS [avaliação ambiental de área sedimentar], eu acho que realmente inviabiliza esse contrato de concessão.

[O Ibama] poderia perfeitamente conceder o direito de nós furarmos, tirarmos um testemunho de rocha para mostrar que tem petróleo. Não produz petróleo, não escoa petróleo, portanto, a possibilidade de um vazamento é muitíssimo remota. A Petrobras é um operador diligente para fazer isso: comprovar ou não a existência de petróleo, tirar a sonda de lá e aguardar essa AAAS até desenvolver a produção. É o meio-termo.

Como a Petrobras pretende reverter o acordo com o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) que determina a venda de refinarias? Foi completamente descabido obrigar a Petrobras a vender refinarias, quando na verdade ela não foi acusada de nada. A Petrobras voluntariamente, sem o Cade jamais ter pedido nada, foi lá e entregou as refinarias.

O mercado é livre desde a lei de 1997, hoje a Petrobras compete com todas as refinarias do mundo, ainda mais num regime que tinha o PPI, que era um preço da paridade de importação. Quer dizer, o preço desse mercado que a Petrobras estava sendo acusado de dominância era o preço do importador.

Como é que eu posso ser dominante se eu garanto ao importador, que é o meu pior concorrente do ponto de vista da eficiência, o preço dele e não o meu? Então, na verdade, o Cade serviu de pretexto e eles sabem disso. Hoje, baixada a poeira e com muita racionalidade e sobretudo muito respeito à autoridade do Cade, nós temos que rediscutir esse processo todo.

A gente é monopólio, de fato, dessas regiões? Não é. Quando você vendeu a refinaria, melhorou o preço do consumidor? Não melhorou. Virou monopólio regional? Virou uma certa forma. Muitos compraram terminal com refinaria, com tudo. Então alguns lugares inclusive estão enclausurados no PPI.

Nós temos mais competitividade, podemos fazer um preço mais barato para a economia brasileira. Não é para povo, não é para eleitor só. É para a economia brasileira. É para o agro que carrega a soja no trem. É para a economia em geral, para o comércio, para o consumidor comum também, mas cada vez menos porque ele vai usar cada vez mais transporte público, Uber...

A gente consegue ganhar sendo autossuficiente em petróleo, ter isso como vantagem competitiva em relação aos países que não são. O PPI era uma miragem vendida como coisa essencial, quando na verdade ele era essencial para os importadores, para aqueles que complementam o suprimento do Brasil. Era o rabo abanando o cachorro.

A gente voltou ao normal. O cachorro que abana o rabo. O que falta eu compro fora. Pelo preço que o cara puder vender. Mas o que eu consigo produzir aqui eu vendo pelo preço do que o mercado doméstico pode pagar. Eu tenho que ter um preço mais competitivo não porque eu sou dominante, mas porque a Petrobras é a mais eficiente, é a melhor que conhece o país, é a que tem as refinarias mais eficientes.

O presidente do BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social], Aloísio Mercadante, disse que vocês estão esperando decisão de Lula sobre compra da Braskem. Vocês vão comprar? Pode acontecer de tudo, inclusive nada. Mas não existe isso [de decisão do Lula]. A gente vai avaliar isso e é claro que o presidente Lula faz parte do grupo de análise também. Ele normalmente concorda que petroquímica é uma das formas de a indústria do petróleo ir se apurando melhor, indo para uma coisa menos básica do que queimar diesel e gasolina.

Mas isso não quer dizer que ele diga "vá lá e arremate Braskem ou saia da Braskem". É mais no sentido de ouvir para entender o que está acontecendo. O presidente Lula hoje é muito criterioso, consciente. Não tem mais aquela coisa voluntarista do político em geral, do "vai lá e faz, porque o Brasil precisa e tal". As conversas com ele são muito técnicas. 'Vale a pena mesmo? Tem certeza do que vocês tão fazendo? Que que a gente vai ganhar com isso? Quais são as consequências pra um lado e pro outro?'

Ele é um acionista controlador criterioso, né? Vai também nos ajudar a tomar decisão, mas a decisão vai ser tomada com critérios técnicos, econômicos e estratégicos para a Petrobras.

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