Fracasso da Pixar revela que Disney está com dificuldade em recriar a magia

Estúdios foram pressionados a produzir filmes para o serviço de streaming da empresa durante a pandemia

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Christopher Grimes
Los Angeles | Financial Times

Em 2019 a Walt Disney lançou sete filmes que arrecadaram mais de US$ 1 bilhão cada nas bilheterias. Foi um feito notável, possível graças à série de aquisições de estúdios feitas por Bob Iger em seu primeiro período como executivo-chefe, que durou 15 anos.

Os estúdios de cinema da Disney estavam "pegando fogo", disse Jessica Reif Ehrlich, analista do Bank of America. "Bob apresentou uma estratégia de filmes com a marca Disney, e durante dez anos ou mais, nenhum outro estúdio conseguiu competir com eles."

Agora, porém, Iger está sendo questionado sobre a possibilidade de a centelha criativa estar começando a fraquejar nos estúdios da Disney, incluindo as potências de bilheteria Marvel, Pixar e Lucasfilm.

"Os motores criativos simplesmente não estão funcionando bem", comentou Rich Greenfield, da LightShed Partners, um grupo de pesquisas sobre investimento. "E, em se tratando da indústria do cinema, o problema é que não existe uma solução imediata para isso."

Logo da Disney - Patrick T. Fallon/AFP

A bilheteria decepcionante de "Elementos", da Pixar, no último fim de semana –uma história de um amor proibido entre personagens feitos de água e fogo— cristalizou a impressão de que os estúdios da Disney caíram na rotina.

"Elementos" foi bem recebido pela crítica e o público, mas arrecadou menos de US$30 milhões nas bilheterias dos EUA em seu fim de semana de estreia –valor decepcionante para um filme cujo orçamento é estimado em US$ 200 milhões. Essa performance fraca disparou alarmes, especialmente após os resultados decepcionantes no ano passado de "Lightyear", uma prequela de "Toy Story" que atraiu apenas um quarto da bilheteria do trabalho anterior da franquia.

Ehrlich disse: "Faz tempo que não aparece algo como ‘Toy Story’, algo extraordinário que é original e realmente mexe com todo o mundo".

Bob Iger estava aposentado, mas foi chamado de volta em novembro para ajudar a recolocar a empresa no rumo certo depois de seu sucessor, Bob Chapek, ter sido forçado a sair devido a uma disputa com o governador da Flórida, Ron DeSantis, e perdas que se acumulavam em seu negócio de streaming.

Iger reestruturou a empresa para devolver poder aos executivos criativos, e na semana passada a Disney anunciou as datas de lançamento de uma série de filmes, incluindo os das franquias "Avatar" e "Star Wars".

Mas, faltando menos de 18 meses para o término do contrato de dois anos de Iger, Greenfield questiona se este terá tempo hábil para fazer a magia da Disney renascer.

"Tudo na Disney flui de sua excelência criativa, quer sejam os parques temáticos, os produtos para o consumidor ou mesmo a Disney Plus", ele comentou. "Mais que qualquer outra empresa, a Disney está atrelada à sua produção criativa, e essa produção simplesmente não está desempenhando bem. E não está claro por quê."

Executivos da empresa reconheceram que a bilheteria de "Elemental" foi decepcionante, mas rejeitaram a ideia de que a Disney esteja passando por uma crise criativa. Eles chamaram a atenção para a performance forte nesta primavera da versão em live action de "A Pequena Sereia" e disseram que têm grandes esperanças para filmes que serão lançados em breve, incluindo "Indiana Jones e a Relíquia do Destino", "As Marvels" e "Wish: O Poder do Desejo". E acrescentaram que os filmes da Marvel continuam a atrair plateias grandes.

Mas a bilheteria de "Elementos" atraiu comparações desfavoráveis com filmes de animação recentes lançados pelo estúdio Illumination, co-pertencente à Universal. "Super Mario Bros – O Filme", lançado em 5 de abril, rendeu US$ 1,3 bilhão em todo o mundo, e "Minions 2: A Origem de Gru" –ambos da Illumination— arrecadou US$ 940 milhões desde que estreou no ano passado.

A Pixar é comandada por Pete Docter, animador premiado com o Oscar que fundou a companhia em 1990. Ele disse que a Pixar está trabalhando sobre uma série de sequências, incluindo "Toy Story 5" e uma sequência de "Divertida Mente".

Dentro e fora da Disney existe a visão de que algumas marcas chaves, especialmente a Marvel mas também Star Wars e Pixar, foram pressionadas em excesso para alimentar o serviço de streaming da empresa, Disney Plus. Durante a pandemia, três longas da Pixar foram lançados diretamente no Disney Plus, algo que não foi bem recebido por profissionais da empresa, para os quais isso condicionou as platéias a pensar que seus filmes não precisam ser vistos em um cinema.

"A questão é até que ponto isso é uso excessivo", teorizou Greenfield. "Estão tentando colocar tudo na Disney Plus na marra, com uma série? Será que foram longe demais com a Marvel e a Lucasfilm, diluindo o poder das franquias cinematográficas com a introdução de todos esses filmes no streaming?"

Depois que a Disney adquiriu a Marvel, em 2009, ela criou franquias que já renderam dezenas de filmes e arrecadaram dezenas de bilhões de dólares, fazendo dela a maior máquina produtora de sucessos de Hollywood. "Vingadores: Ultimato", da Marvel, lançado em 2019, rendeu espantosos US$ 2,8 bilhões, a segunda maior bilheteria da história do cinema.

Mas a performance mais recente da Marvel tem sido marcada por altos e baixos. Houve dois sucessos: "Guardiões da Galáxia Vol. 3" e "Pantera Negra: Wakanda Para Sempre", e um fracasso, "Homem-Formiga e a Vespa: Quantumania".

No início do ano, Bob Iger disse que "não há nada de inerentemente errado em termos da marca Marvel", mas sugeriu que a Disney precisa ser mais prudente com as sequências.

"O que temos que considerar com a Marvel não é necessariamente o volume de sua narrativa, mas quantas vezes voltamos à origem de determinados personagens", ele disse em conferência de mídia em março. "As sequências geralmente funcionam bem para nós. Mas será que é preciso um terceiro ou quarto filme?"

A mesma coisa se aplica aos filmes "Star Wars", que estão sob a supervisão da presidente da Lucasfilm, Kathleen Kennedy. Iger disse: "Ainda estamos desenvolvendo filmes ‘Star Wars’. Vamos nos certificar de que, quando fizermos um, que seja o certo. Então estamos agindo com muito cuidado."

Para Greenfield, a questão é se o público está preparado para ver a Disney diversificar em direções novas, em lugar de depender de seu catálogo de propriedade intelectual, que é reconhecidamente valioso.

"Se você olhar para trás, para os últimos dez anos e todo o primeiro período de Bob Iger na direção, verá que a melhora e o crescimento das franquias a cada ano foi incrível", ele disse. "Acho que a pergunta agora é: será que eles foram beber nessa fonte muitas vezes e já foi demais? Seria o caso de criarem propriedade intelectual nova?"

Tradução de Clara Allain

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.