Como Gisele Bündchen e Tom Brady perderam R$ 232 milhões com colapso da FTX

Celebridades lidam com as consequências da implosão da corretora e desvalorização das criptomoedas

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Erin Griffith David Yaffe-Bellany
San Francisco | The New York Times

Quando a corretora de criptomoedas FTX implodiu, no fim do ano passado, Tom Brady, o quarterback (atacante no futebol americano) sete vezes vencedor do Super Bowl, fez um telefonema urgente.

Ele ligou para Sina Nader, chefe de parcerias da FTX. A equipe da corretora estava no meio de uma reunião de gerenciamento de crise com seu encurralado fundador, Sam Bankman-Fried. Nader não pôde atender. "Nunca pensei em recusar uma ligação de Tom Brady", disse ele.

Brady tinha motivos para se preocupar. Como "embaixador" da FTX, ele já apareceu na conferência da empresa nas Bahamas e em comerciais de TV que promoviam a corretora como a instituição "mais confiável" no mundo pouco regulamentado das criptomoedas.

Seu dinheiro também estava em jogo. Como parte de um contrato de endosso assinado por Brady em 2021, a FTX pagou a ele US$ 30 milhões (R$ 146 milhões), um acordo que consistia quase inteiramente em ações da empresa, disseram três pessoas com conhecimento do contrato. A mulher de Brady na época, a supermodelo Gisele Bündchen, recebeu US$ 18 milhões (R$ 87 milhões) em ações da FTX, disse uma das pessoas.

Tom Brady e Gisele Bundchen, que juntos receberam R$ 232 milhões da FTX, se divorciaram em outubro de 2022 - Kevin C. Cox - 7.fev.2021/Getty Images via AFP

Agora a FTX está falida e Bankman-Fried enfrenta acusações criminais de fraude. Brady, 45, e Bündchen, 42, foram processados por um grupo de clientes da FTX que buscam indenização das celebridades que endossaram a corretora.

Além de tudo, os termos do acordo exigiriam que o ex-casal, que se divorciou no ano passado, pagasse impostos sobre pelo menos algumas de suas ações da FTX, agora sem valor, disseram duas pessoas familiarizadas com o acordo de endosso.

A situação deles é o exemplo de maior visibilidade de um acerto de contas humilhante enfrentado por atores, atletas e outras celebridades que correram para abraçar o dinheiro fácil e o hype online das criptomoedas.

Nos tempos do boom, Paris Hilton, Snoop Dogg, Reese Witherspoon e Matt Damon se entusiasmaram ou investiram em projetos cripto, trazendo um público comum para o mundo instável das moedas digitais. Foi divertido –e lucrativo– enquanto os preços disparavam.

Mas o crash do ano passado acabou com a cripto-bonança das celebridades.

Em outubro, a Comissão de Valores Mobiliários dos EUA (SEC, na sigla em inglês) ordenou que Kim Kardashian pagasse US$ 1,26 milhão por não fazer divulgações adequadas quando endossou o token EthereumMax. Em dezembro, um advogado na Califórnia processou duas empresas de cripto, MoonPay e Yuga Labs, acusando-as de usar uma "vasta rede de músicos, atletas e clientes famosos" para enganar investidores sobre os ativos digitais.

Em março, a SEC acusou a atriz Lindsay Lohan, o influenciador online Jake Paul e músicos como Soulja Boy e Lil Yachty por promoverem ilegalmente criptoativos. E no final de maio, após meses de tentativas frustradas, um oficial de Justiça entregou intimações a Shaquille O'Neal, o astro do basquete aposentado, que foi processado por promover a FTX, segundo documentos legais. O'Neal foi notificado durante a transmissão de um jogo de desempate da Associação Nacional de Basquete (NBA).

Representantes de Brady, Bankman-Fried e MoonPay se recusaram a comentar. Um porta-voz da Yuga Labs disse que a empresa "nunca pagou uma celebridade para ingressar no clube". Representantes de Bündchen e O'Neal não responderam a pedidos de comentários.

Startups de tecnologia e celebridades há muito tempo têm uma relação simbiótica. As startups oferecem às estrelas uma maneira de ganhar dinheiro enquanto se mantêm na vanguarda da cultura da internet; as celebridades ajudam empresas jovens a ganhar credibilidade e alcançar um público maior.

De todas as startups que recrutaram celebridades para divulgar criptomoedas, a FTX foi talvez a mais ávida. Enquanto Bankman-Fried tentava transformar a FTX em um nome familiar, ele fez uma lista de celebridades que poderia imaginar promovendo a empresa, lembrou Nader, o ex-executivo da FTX. O nome de Brady estava no topo.

Ex-jogador de futebol americano universitário, Nader foi encarregado de recrutar Brady e outras estrelas. Em junho de 2021, Brady e Bundchen fecharam um acordo com Bankman-Fried, elogiando a "equipe revolucionária da FTX". Brady parecia genuinamente interessado em criptomoedas, disse Nader, e de vez em quando conversava com Bankman-Fried.

"Imagine um tigre e um leão conversando", disse Nader. "Eles são um pouco diferentes, fazem coisas diferentes, mas são realmente formidáveis em suas próprias arenas."

Em 2021, Brady também cofundou a Autograph, que ajuda pessoas famosas a vender criptos colecionáveis, os NFTs. A Autograph arrecadou mais de US$ 200 milhões de investidores, e Bankman-Fried se juntou ao conselho.

No mesmo ano, Brady e Bündchen estrelaram uma campanha publicitária de US$ 20 milhões para a FTX, com comerciais veiculados durante os jogos da Liga Nacional de Futebol (NFL). Brady também postou vídeos do TikTok com Bankman-Fried na sede da FTX nas Bahamas, onde falou em uma conferência para centenas de pessoas.

Nos bastidores, Bankman-Fried comentou que poderia se imaginar comprando um time de futebol algum dia com Brady. Bundchen também apareceu na conferência como chefe de iniciativas ambientais e sociais da FTX.

Quando a FTX entrou em colapso, em novembro passado, a avaliação de US$ 32 bilhões da empresa –incluindo os US$ 48 milhões em ações de Brady e Bündchen (cerca de R$ 232 milhões, na cotação atual)– despencou para zero. O casal também recebeu uma pequena quantidade de tokens ethereum, bitcoin e solana para negociar na plataforma, disse uma das pessoas, que desapareceram na falência da FTX.

Brady não comentou publicamente sobre a FTX ou seu relacionamento com Bankman-Fried. Após a reunião de crise da FTX em novembro, Nader ligou de volta.

Sam Bankman-Fried, fundador e ex-CEO da corretora de criptomoedas FTX - Marco Bello - 21.dez.2022/Reuters

"Ele estava preocupado", disse Nader. "A primeira coisa que me perguntou foi: 'Sina, como você está? Eu sei que você colocou seu coração e alma nisso'."

Bundchen disse em entrevista em março à revista Vanity Fair que "confiou no hype" e se sentiu "pega de surpresa".

O outro empreendimento de Brady envolvendo cripto também teve dificuldades. A receita da Autograph caiu no ano passado em meio ao colapso das criptomoedas, disse uma pessoa familiarizada com suas finanças.

A startup mudou sua estratégia para se dedicar mais a ajudar as celebridades a encontrar maneiras de promover a lealdade de seus fãs e menos no marketing de cripto-tokens para os consumidores, disse a pessoa. A empresa também removeu parte da linguagem criptográfica de seu marketing, minimizando termos como NFT, disse outra pessoa com conhecimento da empresa.

A Autograph também cortou mais de 50 funcionários em rodadas de demissões, disse uma terceira pessoa. As reduções foram relatadas anteriormente pelo Insider. Um porta-voz da Autograph se recusou a comentar.

Brady também enfrentou problemas legais. Em dezembro, Adam Moskowitz e o escritório de advocacia Boies Schiller Flexner entraram com uma ação no tribunal federal da Flórida acusando a ele e Bundchen de enganar investidores. Entre outros réus estão o comediante Larry David, a estrela da NBA Steph Curry e a tenista Naomi Osaka, todos por endossar a FTX.

"Nenhum desses réus realizou qualquer diligência antes de comercializar esses produtos FTX ao público", disse o processo.

Algumas celebridades escaparam por pouco da confusão das criptomoedas. Katy Perry, a estrela pop, conversou sobre uma parceria com a FTX que não se concretizou, disseram três pessoas familiarizadas com a situação.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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