Descrição de chapéu Consciência Negra

Livro mostra tamanho da discriminação racial no país

Obra, organizada por Michael França e Alysson Portella, analisa indicadores de renda, educação, violência e representatividade

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São Paulo

Por que ainda é importante discutir a questão racial no Brasil? É possível medir a discriminação? Os dados mais recentes podem ajudar a repensar políticas públicas de inclusão?

Essas questões formam o fio condutor do livro "Números da Discriminação Racial: Desenvolvimento Humano, Equidade e Políticas Públicas".

Com organização e coautoria de Michael França, Alysson Portella, coordenador e pesquisador do Núcleo de Estudos Raciais do Insper, respectivamente, a obra será lançada nesta sexta-feira (27), em um evento no Insper, em São Paulo. As inscrições podem ser feitas no site da instituição.

A Esquerda, o economista Alysson Lorenzon Portella; A Direita, Michael França, doutorando, pesquisador do Insper e colunista do jornal
Alysson Portella (esq.) e Michael França - Arquivo pessoal e Adriano Vizoni/Folhapress

Segundo os organizadores, o objetivo do trabalho é fortalecer o debate sobre discriminação racial no Brasil, por meio de análises de indicadores de renda, educação, saúde, violência e representação política.

Ao longo do trabalho, o principal incômodo parece ser a persistência histórica da desigualdade racial como uma marca do país —há avanços a partir dos anos 2000, como ressaltam os próprios organizadores, mas a cidadania plena ainda parece distante de parte da população sob diferentes aspectos.

A ilustração da capa já convida a uma reflexão sobre o lugar, sobretudo das mulheres negras, na sociedade. Ela é inspirada em uma foto que viralizou nas redes, de uma babá negra uniformizada empurrando um carrinho de bebê com os patrões, brancos, à sua frente durante um protesto pelo impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).

Além de França e Portella, o livro conta com a participação de Mayara Smith (ilustrações), Alisson Gomes dos Santos, Bruno Komatsu, Erivelton Nunes, Daniel Duque, entre outros.

França, 35, que é colunista da Folha, considera que falar de raça importa, pois os brasileiros negros ainda são vistos e tratados de forma diferente, em várias dimensões da vida, da escola ao mercado de trabalho. E há uma série de evidências em estudos empíricos (que se baseiam em dados concretos para entender fenômenos da natureza ou da sociedade) mostrando que isso ainda acontece.

"Se fosse possível provar empiricamente que não existe um viés racial ou de gênero no cotidiano, nós poderíamos parar de falar sobre desigualdade de raça e de gênero e falar só de desigualdade social, mas é o contrário", diz.

França, que também foi visitante nas universidades Columbia e Stanford, nos Estados Unidos, ressalta que a forma como as pessoas são percebidas e tratadas impacta em sua trajetória ao longo da vida, por vários mecanismos diferentes. "A própria desigualdade racial afeta as escolhas das pessoas e comportamentos."

Por meio de análises a partir de bases de dados, como a Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) Contínua, do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o livro propõe uma reflexão sobre a persistência histórica da desigualdade e como essas diferenças se refletem na renda e nos salários, no acesso à saúde na exposição à violência.

Capa do livro 'Números da Discriminação Racial', lançado nesta sexta-feira - Reprodução

Apesar de avanços em anos recentes, muitas ocupações ainda têm sub-representação de mulheres e de negros, a própria economia é uma área dominada por homens, brancos e de alta renda, lembra o colunista.

Já Portella, 33, avalia que a pesquisa sobre desigualdade racial, do ponto de vista econômico, tem uma tradição relativamente longa nos Estados Unidos, mas ainda é recente no Brasil.

O economista é pesquisador de pós-doutorado do Insper e já foi aluno visitante na Universidade Columbia e na Universidade das Nações Unidas (Finlândia).

Para ele, o livro trata do assunto com um viés econômico, mas também olhando para a sociologia e a história.

"Temos estudos quantitativos feitos no campo da sociologia, mas ainda estamos mal servidos de estudos sobre a desigualdade racial. A nossa ideia era organizar ideias que estavam circulando nesses últimos 20 anos em diferentes trabalhos com vários tópicos, mas ainda sem uma obra introdutória.

Os dois pesquisadores estão entre os criadores do Ifer (Índice Folha de Equilíbrio Racial), indicador que, nas palavras deles, "padroniza as desigualdades pela composição racial da população local, permitindo comparar desequilíbrios raciais no país, regiões e estados, sem distorções".

Os números presentes no livro, que partem da mesma base de dados do Ifer, também oferecem uma oportunidade para repensar políticas públicas no Brasil, com o objetivo de tornar o combate à desigualdade racial algo mais efetivo.

As suas conclusões inspiraram uma série de reportagens sobre discriminação racial no Brasil, a ser publicada pela Folha a partir desta semana.

Números da Discriminação Racial

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