A influencer de economia que virou alvo de haters bolsonaristas e esquerdistas

Mestre pela Universidade de Chicago, Olivia usa o que aprendeu com ganhadores do Nobel para comentar notícias do dia

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São Paulo

O futuro de Olivia Carneiro parecia definido em 2019. Ela continuaria nos Estados Unidos para seguir o caminho iniciado com o mestrado na Universidade de Chicago, instituição considerada berço dos liberais na economia.

Mas Woody Allen já disse que, se você quiser fazer Deus rir, conte a Ele seus planos.

A economista Olivia Carneiro na casa do seu pai na Santa Cecília, zona central de São Paulo
A economista Olivia Carneiro na casa do seu pai na Santa Cecília, zona central de São Paulo - Eduardo Knapp/Folhapress

A mãe de Olivia, Maria Eliza, sofreu um AVC (acidente vascular cerebral) e entrou em coma. Isso a fez voltar a São Paulo. Enquanto estava com ela no hospital, começou a se irritar com o que considerava "bobagens" que ouvia e lia em análises econômicas. Passou a gravar vídeos curtos com comentários sobre o assunto.

Era o nascimento de Olivia Sensata, influencer e podcaster que se propõe a analisar as notícias dos jornais sob o viés do liberalismo (que ela afirma não ser compreendido de verdade no Brasil). Uma "garota de Chicago" que se tornou influenciadora no TikTok, Instagram e é responsável pelo podcast EconOlivia. A especialista em finanças que não oferece fórmulas para ganhar milhões.

"Por algum motivo, no início eu meio que viralizei em grupos de mães de WhatsApp. Diziam que eu falava sobre economia com uma voz tranquila, que acalmava. Foi daí que surgiu o Olivia Sensata porque eu acreditava precisar de um apelido", afirma.

Era para ser temporário, mas não foi. A morte da mãe e o início da pandemia da Covid-19 a fizeram querer ficar próxima ao pai, o jornalista Paulo Carneiro.

A mestre em políticas públicas se tornou uma das criadoras de conteúdo mais populares sobre o assunto no Spotify e TikTok brasileiros. Nas redes sociais, ela bateu em 1 milhão de seguidores, antes de perder uma parte ao declarar o voto em Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no segundo turno das eleições presidenciais do ano passado. Constatou que, apesar de não elogiar o ex-presidente Jair Bolsonaro e mesmo após ter feito críticas ao antigo ministro da Fazenda, Paulo Guedes, havia sido "abraçada" por bolsonaristas.

"É muito estranho porque eu nunca defendi o Bolsonaro na minha vida. Nunca falei nada que desse a entender que eu simpatizava com Bolsonaro, mas os bolsonaristas me acolheram. E, quando eu disse que preferia o Lula presidente, foi a primeira leva de hate [ódio] que recebi", relembra.

Foram frases como "ah, você é uma comunista enrustida" ou "me sinto enganado", apenas para ficar nas mensagens publicáveis.

"Mas foi uma minoria. Teve gente que escreveu dizendo que continuava gostando de mim", completa.

A segunda onda de ódio foi mais recente. Em um gesto pouco comum na chamada "podosfera", ela convidou Elias Khalil Jabbour, professor da Faculdade de Ciências Econômicas da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) e de quem discorda quase integralmente no pensamento econômico, para dar uma aula em seu podcast. Olivia mais ouviu o autor de "China: o socialismo do século 21" do que falou.

Mas o debate de ideias atraiu a ira de parte da esquerda.

"É difícil, mas se não fizermos isso, nunca vamos convergir. A gente não converge e há coisas muito nocivas. Acho que o Elias tem as opiniões dele, com as quais não concordo, mas é melhor que defenda o ponto de vista dele com liberdade e que as pessoas conheçam do que calá-lo e assumir um monte de fake news para justificar."

Isso a deixa em uma situação única no cenário político-econômico brasileiro. É visto com desconfiança e atrai críticas da direita e da esquerda.

"Eu estou ali, no meio", constata.

Ela não faz muita questão de esconder que o ódio a atinge de verdade. Postou que não saiu para comemorar seu aniversário porque não se sentia bem após mensagens recebidas. Quando se olha no espelho, vê a tatuagem escrita "be here now" (esteja aqui agora), em inglês, no braço direito. É antiga, de quando estava depressiva, e serve para se lembrar de viver o agora.

"É horrível, me faz muito mal [mensagem de ódio]. Faço terapia, tenho crises de ansiedade. Fico paralisada, olhando para o nada, pensando ‘o que vai acontecer comigo?’ Não sei disfarçar e nem quero. Não está tudo bem, gente. Não vou dizer que não estou sentindo nada. Estou sentindo pra cacete. Está me fazendo muito mal."

Acredita não ter sido aceita em círculos de produtores de conteúdo de direita porque é crítica de alguns de seus integrantes. Houve quem questionasse se ela realmente havia estudado na Universidade de Chicago.

Olivia não disfarça o desdém por produtores de conteúdo que oferecem cursos com mensagens que tentam convencer as pessoas de que "a economia dos Estados Unidos vai quebrar, mas vou te dizer o que fazer" ou "poupe R$ 100 por mês para ter uma renda de R$ 20 mil quando chegar aos 60 anos".

"[Eles] Mentem, né? Isso não vai acontecer. Não vai."

Formada em economia na USP (Universidade de São Paulo), ela ainda se lembra da bronca que levou no primeiro dia de aula da professora Leda Maria Paulani por ter respondido "não sei" quando perguntada por que havia escolhido aquele curso. Afirma ter ficado com vergonha de responder que queria melhorar o mundo.

Contratada para consultorias e campanhas políticas e ex-funcionária de instituições do mercado financeiro (trabalho que ela odiou), Olivia também elabora ranking do desempenho de deputados no Congresso Nacional. É algo que gostaria de aperfeiçoar, mas para isso precisa de algo que não tem no momento: tempo.

Quando recebeu a Folha na casa de seu pai, lia o trabalho da ganhadora do Nobel de economia deste ano, Claudia Godin para falar sobre o pensamento da vencedora em seu podcast.

Olivia tem orgulho de dizer que, no seu período em Chicago, entre 2017 e 2019, fez cursos de ganhadores do mesmo prêmio (ela diz ter sido "treinada" por eles). Teve mais contato com Roger Myerson (escolhido em 2007), mas também esteve nas aulas de Richard Thaler (2017) e Eugene Fama (2013). Este último, por pouco tempo, porque era "realmente difícil", constata.

O curioso é que seus pais foram comunistas na juventude, o que a faz ter várias obras marxistas na biblioteca da casa onde cresceu.

Ela almeja voltar à academia, fazer doutorado e, no futuro, dar aulas.

"É onde eu acho que vou me encontrar de novo, porque sinto muita falta de ter alguém que me ensine. Sou muito curiosa. Gosto de aprender com os outros. Posso discordar 100% do Elias, por exemplo, mas gosto de aprender com ele. E na internet eu acabo apenas ensinando, não tem troca. Quero voltar a ser treinada por Nobel, sabe?"

É uma curiosidade que a leva a chamar de "interessante" a teoria da economia cíclica, formulada pela italiana Mariana Mazzucato, guru de petistas. Em entrevista à Folha, Mariana chamou a ideologia dos "Chicago Boys" (economistas da Universidade de Chicago, onde Olivia estudou) de "estúpida".

"A teoria dela é interessante. Não é nada ruim. Mas é uma maneira de a esquerda falar de economia sem ter de falar de economia. De que o crescimento do PIB não necessariamente significa que a economia está de fato se desenvolvendo, que a população está feliz etc. É uma forma de concordar sem mostrar que está concordando."

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Erramos: o texto foi alterado

Olivia Carneiro é mestra em políticas públicas, não em economia, como afirmou incorretamente versão anterior deste texto.

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