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Venda de ações detidas pelo BNDES liberaria R$ 60 bi para governo investir

Enquanto vendia ações no governo Bolsonaro, banco na gestão Lula diz que portfólio está 'alinhado às prioridades' de Lula

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São Paulo

O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) mantém uma carteira de investimentos correspondente a cerca de R$ 60 bilhões em ações de grandes companhias da Bolsa, enquanto o país discute investimentos.

O montante é superior ao valor previsto de bloqueio (R$ 53 bilhões) que o governo poderá ter de fazer no próximo ano em despesas não obrigatórias do Orçamento, como obras, caso mantenha a meta de zerar o déficit fiscal, o que está cada vez mais distante.

Embora o dinheiro com a venda de papéis não possa ser usado para ajudar o governo a alcançar resultado fiscal, o recurso poderia ser usado em linhas de financiamento do banco para fomentar infraestrutura, por exemplo.

Prédio do BNDES no setor Bancário Sul em Brasília.
Prédio do BNDES no setor Bancário Sul em Brasília. - Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

A volta de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao Palácio do Planalto levou a uma mudança de política para o BNDES. Enquanto na gestão Jair Bolsonaro (PL) a instituição vendeu papéis, a atual gestão afirma que o portfólio de ações "está alinhado às políticas e prioridades do governo federal".

Segundo dados fechados em 30 de junho disponíveis pelo BNDES, o banco detém ações que somam R$ 58,69 bilhões de 16 companhias de capital aberto que possuem liquidez, ou seja, que costumam ter um fluxo mais alto de negociações na Bolsa.

São elas: Petrobras, JBS, Eletrobras, Copel, Energisa, Cemig, Tupy, Embraer, AES Brasil, Copasa, CSN (Companhia Siderúrgica Nacional), Hidrovias do Brasil, Iochpe - Maxion, Coteminas, Springs Global Participações e Oi.

O valor que consta no site do banco está desatualizado e pode ser ainda maior. Somente as ações da Petrobras, por exemplo, que correspondem a 45% da carteira, aparecem somando o valor de R$ 31 bilhões.

Agora, porém, essa participação acionária está valendo R$ 36 bilhões, após uma valorização de aproximadamente 18% do papel de 30 de junho para cá. O BNDES detém 7,94% do total das ações da petroleira.

Na gestão Bolsonaro, o então presidente do banco, Gustavo Montezano, levou à frente o plano de se desfazer de ativos. Em 2020, o BNDES arrecadou R$ 22 bilhões em venda da ações da Petrobras.

Montezano criticava a atuação do banco na Bolsa. "Manter posição em Bolsa com ações dessas companhias é especulação. É preciso realocar esses recursos para o desenvolvimento do país", disse, em fevereiro do ano passado.

Na gestão Montezano, o banco passou a atuar mais na estruturação de projetos de desestatização e no apoio a operações de crédito para pequenas e médias companhias.

Lula agora busca recursos para seu programa de governo. "Eu não vou estabelecer uma meta fiscal que me obrigue a começar o ano fazendo corte de bilhões nas obras que são prioritárias nesse país", disse no fim de outubro.

No caso do BNDES, o governo poderia progressivamente redirecionar os recursos para investimentos, sem comprometer o orçamento e as metas fiscais. Não à toa o BNDES, sob gestão de Aloizio Mercadante, tenta adiar repasses do banco para o Tesouro sob o argumento de que isso afetaria linhas de crédito.

Várias das empresas das quais o BNDES tem ação não possuem nenhuma ligação com a administração pública —como JBS, que é do setor de frigoríficos; da Iochpe - Maxion, que produz rodas de aço e alumínio para veículos; da Coteminas, do setor têxtil; ou da Oi, empresa de telecomunicação.

"Vale a pena o governo ir saindo de algumas ações para investir em outras coisas. Principalmente em empresas em que ele tem participação minoritária", diz Elena Landau, ex-assessora da presidência do BNDES.

Landau, contudo, pondera que, se for para o BNDES vender ações e usar o dinheiro para subsidiar uma empresa ultrapassada, é melhor manter a carteira como está. "Eu acho que este governo tem uma ideia de usar o BNDES e crédito público para estimular a economia que não funciona", afirma.

A manutenção das ações, no entanto, amplia a influência política do governo ao vislumbrar nas empresas a possibilidade de distribuição de cargo.

Reportagem recente da Folha mostrou que as empresas que têm o governo como acionista relevante estão preocupadas com o uso de cadeiras em conselhos de administração e até no corpo executivo como instrumento de barganha no Congresso.

São cargos que remuneram os seus ocupantes com, ao menos, R$ 500 mil por ano.

Recentemente, causou polêmica a nomeação pelo BNDES dos ministros Anielle Franco, da Igualdade Racial, e Carlos Lupi, da Previdência Social, para assentos no conselho de administração da metalúrgica Tupy. A crítica se deu pela falta de experiência de ambos com o ramo de negócio.

Em nota, o banco afirmou que a política de investimentos da instituição "é definida de acordo com o planejamento estratégico do Sistema BNDES, que, por sua vez, está alinhado às políticas públicas e prioridades do governo federal".

"A reciclagem do portfólio da BNDESPar é uma prática constante ao longo dos anos", diz o banco, mas a venda de papéis deve ser conduzida com "cautela e respeitando o regramento local, sob pena de ocasionar variação indesejada no preço das ações das investidas".

A instituição afirma ainda que é "uma estatal independente" e que "distribui recursos ao seu acionista de acordo com a legislação aplicável".

"A má gestão do portfólio pode resultar em prejuízos ao erário e ao povo brasileiro. A alienação de ações por parte da BNDESPar em condições desfavoráveis não contribuiria para o resultado primário do Tesouro podendo, ao contrário, reduzi-lo mediante diminuição do lucro tributável do sistema BNDES."

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