Descrição de chapéu carro elétrico

Carros 100% elétricos depreciam mais que modelos híbridos no Brasil; veja cálculos

Dados da KBB Brasil mostram que problemas de infraestrutura, medo do novo e menor oferta de crédito influenciam valor

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Uma tendência global também é observada no Brasil: carros 100% elétricos tendem a desvalorizar mais que os modelos híbridos neste período de transição energética no setor automotivo.

Dados da KBB Brasil, empresa especializada em precificação de veículos, mostram que os problemas de infraestrutura de recarga, o "medo do novo" e a menor oferta de crédito influenciam o valor de revenda.

"O consumidor ainda tem desconfianças sobre os carros 100% elétricos, há respostas que não foram dadas, e isso é mundial", diz Ana Renata Navas, CEO da Cox Automotive, que é dona da KBB. "Já o híbrido é um sucesso absoluto."

Chinesa BYD lança utilitário esportivo Tan
Utilitário esportivo Tan da chinesa BYD - Divulgação

Um exemplo é o que acontece na linha BMW. Enquanto o X3 híbrido plugin –que pode rodar com gasolina e eletricidade, sendo também recarregado na tomada– registrou uma desvalorização de 5,2% ao longo de 2023, o iX3, que é apenas elétrico, perdeu 14,1% do seu valor no mesmo período.

A conta feita pela KBB Brasil considera os valores de compra dos automóveis zero-quilômetro em janeiro (R$ 395.960 no caso do BMW híbrido e R$ 471.580 para o 100% elétrico) e o preço estimado dos mesmos veículos em dezembro no mercado de usados.

Vale dizer, contudo, que o mais surpreendente é a baixa desvalorização do modelo que concilia gasolina e eletricidade. A perda do carro que pode ser abastecido na tomada está dentro das médias gerais do mercado.

Carro mais vendido no Brasil em 2023, a picape compacta Fiat Strada desvalorizou 16,1% ao longo do último ano, mesmo índice do hatch compacto Chevrolet Onix. Ambos são flex, sem nenhum tipo de eletrificação.

Ainda assim, os bancos ainda têm dúvidas na hora de aprovar o financiamento de um carro elétrico. Ana Renata Navas, da Cox Automotive, diz que isso ocorre pelo medo de se perder dinheiro caso seja necessário recuperar o veículo por inadimplência. "Levam em consideração a agilidade de revenda de um bem retomado."

Ela acredita que esse cenário deve começar a mudar. A Cox tem apresentado os cálculos de desvalorização para financeiras e, segundo a CEO, as empresas começam a acreditar mais nos elétricos.

A prova de fogo da depreciação será quando os mais procurados do segmento hoje, que são os hatches chineses BYD Dolphin e GWM Ora 3, completarem seu primeiro ano de vendas. Comercializados por R$ 150 mil, esses modelos são os principais responsáveis pelo crescimento dos carros elétricos no Brasil.

Se tais carros mantiverem bom valor de revenda, há chances de todo o nicho se valorizar. Ambas as marcas terão produção no Brasil, incluindo modelos híbridos flex (capazes de rodar com eletricidade, etanol e gasolina).

Concorrente da BMW, a sueca Volvo também oferece modelos híbridos plug-in e 100% elétricos no Brasil –não há mais nenhum carro zero-quilômetro da marca que rode apenas com gasolina. Da mesma forma, a perda de valor tende a ser mais acentuada entre os que não tem motor a combustão, mas a montadora prevê que isso vai mudar.

"O mercado de carros elétricos ainda está em crescimento e representa, hoje, cerca de 2% da frota mundial. Por ser um segmento mais enxuto, movimentações fortes de qualquer um dos players do mercado têm um impacto muito grande", diz Abdallah Madi, chefe da área de produtos da Volvo Car Global Importers.

O executivo menciona as ações feitas por empresas chinesas como BYD e GWM, que têm praticado preços agressivos em suas estratégias de expansão global. "A redução do preço dos veículos novos acaba impactando no valor dos usados", afirma Madi.

"Com o crescimento das vendas e a migração de um número maior de marcas para que seu portfólio seja 100% elétrico, o impacto desses players será menor, e a tendência é que o mercado encontre um equilíbrio."

Na visão do executivo da Volvo, as vantagens dos carros 100% elétricos irão se impor. "Está cada vez mais claro que o carro elétrico é uma máquina superior ao carro à combustão em eficiência energética e performance, e, com o tempo e a migração em massa do mercado, o consumidor passará a ter cada vez menos desconfiança."

Quem já superou essa desconfiança foi o empresário e músico Afonso Junior, que mora em Juiz de Fora (MG). Em novembro, ele trocou um sedã BMW 320i 2020 pelo BYD Seal (R$ 296,8 mil).

No início da relação, houve incômodos tecnológicos. "Tinha alguns problemas com o sistema de leitura de placas e de permanência em faixa, que voltavam a ser acionados todas as vezes que desligava e ligava novamente o carro", diz o empresário. Isso interferia no prazer ao dirigir o carro, mas houve solução.

Junior explica que a montadora disponibilizou uma atualização remota do sistema, tal e qual ocorre com os smartphones. Outras evoluções digitais permitiram incluir a chave virtual do carro no sistema iOS, sendo possível abrir as portas e dar a partida por meio do iPhone ou do smartwatch da Apple.

Por outro lado, a autonomia é um pouco menor do que o esperado. "O carro consome um pouco mais do que falam, pelo menos aqui na minha cidade, que tem muitas subidas", afirma o empresário. "Mas a autonomia na estrada é excelente. Andando tranquilo, consigo fazer uns 400 quilômetros."

Ele ressalta, contudo, que é preciso ter um planejamento para não correr riscos. "Vou fazer uma viagem de 530 quilômetros para o interior de São Paulo, mas já vi que há eletropostos no caminho."

Quanto aos custos de uso e à desvalorização, Junior afirma que o período de manutenção gratuita oferecido pela BYD –até cinco anos ou 100 mil quilômetros– pesou a favor do Seal. "E não me preocupo com a desvalorização, porque esses carros vão aumentar de preço", diz o empresário, mencionando a retomada da cobrança do Imposto de importação.

Porém, as mudanças frequentes no segmento também podem impactar o mercado de usados.

"A desvalorização dos carros elétricos e híbridos usados é muito influenciada pela rápida evolução das tecnologias relacionadas, com aprimoramento constante da autonomia e do desempenho, o que inclui a durabilidade das baterias", diz Alexandre Xavier, superintendente do IQA (Instituto da Qualidade Automotiva).

Ele menciona ainda outros pontos que precisam evoluir, como infraestrutura e melhor qualidade dos pontos de recarga, além de mais laboratórios de ensaio e aprimoramento das normas técnicas.

"Essas medidas contribuirão para a melhoria contínua, a inovação, a sustentabilidade e a competitividade do setor automotivo nesta rota tecnológica, o que influenciará diretamente a confiança dos consumidores."

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.