China desloca investimentos na América Latina para competir com EUA e Europa

Pequim muda o foco para tecnologia, energias renováveis e minérios no lugar de projetos de infraestrutura caros

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Michael Stott
Financial Times

A China deslocou seus investimentos na América Latina para setores estratégicos, como minerais críticos, tecnologia e energia renovável, à medida que desafia os Estados Unidos e a Europa em campos econômicos relevantes do século 21, segundo relatório.

A perda de relevância dos projetos de infraestrutura caros ocorreu à medida que novos investimentos na região diminuíram, mas a preocupação com a crescente concorrência chinesa pela supremacia econômica aumentou nos Estados Unidos e na Europa.

A queda nos níveis de investimento não refletiu falta de interesse na América Latina e no Caribe, mas sim o foco muito mais restrito da China em áreas de alta tecnologia e estratégicas, afirmou o relatório divulgado na segunda-feira (22) pelo Diálogo Interamericano.

Em média, o investimento direto estrangeiro (IDE) da China na América Latina atingiu US$ 14,2 bilhões por ano entre 2010 e 2019, mas caiu para uma média de US$ 7,7 bilhões de 2020 a 2021 e depois para US$ 6,4 bilhões em 2022, último ano completo para o qual os dados estavam disponíveis.

"Nossos dados mostram uma clara mudança no IDE chinês em direção a setores específicos na América Latina e no Caribe", disse Margaret Myers, coautora do relatório do think tank sediado em Washington.

"Muitas dessas novas áreas prioritárias são descritas pela China como 'nova infraestrutura', um termo que engloba setores —como telecomunicações, fintechs e transição energética— que são críticas para a estratégia de crescimento econômico da China."

O relatório constatou que Pequim investiu um total de US$ 187,5 bilhões na América Latina e no Caribe entre 2003 e 2022.

Projetos como os planos da fabricante de veículos elétricos BYD para uma planta no Brasil, a aquisição de ativos de lítio pela Tianqi Lithium no Chile e a expansão da Huawei e de outras empresas chinesas em toda a região em data centers, computação em nuvem e tecnologia 5G são emblemáticos da nova estratégia de investimento chinesa.

O Brasil recebeu de longe a maior parcela do IDE chinês na região ao longo das duas últimas décadas até 2022, com US$ 78,6 bilhões ou 42% do total. O Peru foi o segundo maior receptor, seguido por México, Argentina e Chile.

O investimento de Pequim no México está cada vez mais concentrado em manufatura de alto valor agregado, com empresas chinesas transferindo a produção de sua base doméstica para o México para aproveitar o acesso comercial privilegiado desse país ao mercado norte-americano.

Enquanto o investimento cresceu constantemente, o comércio entre a China e a América Latina disparou nas últimas duas décadas, passando de US$ 14 bilhões em 2000 para US$ 495 bilhões em 2022.

As exportações chinesas para a região consistem cada vez mais em bens e serviços de alta tecnologia, embora as importações de Pequim da América Latina e do Caribe ainda sejam compostas principalmente por matérias-primas, assim como eram há mais de uma década.

Autoridades do governo Joe Biden têm repetidamente alertado os governos latino-americanos sobre o que eles consideram ser os perigos da dependência excessiva de investimentos chineses, citando riscos de segurança, armadilhas da dívida e a possibilidade de infraestruturas, como portos, serem usadas para fins militares.

No entanto, a incapacidade dos Estados Unidos em muitos casos de oferecer produtos alternativos a preços competitivos, financiamento mais barato para projetos de infraestrutura ou novos acordos de livre comércio tem frustrado muitos governantes latino-americanos.

No ano passado, a União Europeia lançou sua iniciativa Global Gateway na região, anunciando financiamento de até 45 bilhões de euros para projetos, incluindo transição para energia verde e transformação digital, mas ainda não está claro quanto do dinheiro será gasto.

Angel Melguizo, outro coautor, disse que o novo foco da China em investimentos de alta tecnologia "desafia a estratégia de investimento europeia, já que o programa Global Gateway da UE identificou as mesmas prioridades. Também estabelece uma base para competir com os EUA em alguns mercados".

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