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Homens oferecem milhares de dólares para quem lhes apresente o 'amor verdadeiro'

Mercado de casamenteiros é reeditado em modelo que lembra o de investimentos em startups

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Angela Chen
The New York Times

Durante a maior parte da vida de Mati Roy, namorar estava longe de ser uma prioridade. Embora tenha tentado, sem muito entusiasmo, aplicativos de namoro, e tivesse aceitado um relacionamento se ele se desenvolvesse naturalmente, buscar o amor não parecia valer o esforço para ele.

Mas à medida que Roy entrou na casa dos 30 anos, suas prioridades começaram a mudar. Ele passou muito tempo refletindo sobre a ideia de ter filhos e decidiu que queria ter alguns.

Em dezembro de 2021, Roy montou um perfil de namoro online, também conhecido como "date-me doc", e incentivou as pessoas a compartilhá-lo na internet. Ele descreveu que tinha 1,88 metro de altura, não bebia, não fumava nem usava drogas e tinha menos interesse em passar tempo junto do que casais típicos teriam.

Sem sucesso em aplicativos de relacionamentos, adultos nos EUA buscaram até recompensa na internet para encontrar a amada

Crianças eram importantes, então, para tornar a oferta mais atraente, ofereceu US$ 2.000 (R$ 9.940) para quem o apresentasse à pessoa com quem ele acabaria dividindo a parentalidade –ele não descartava a adoção de uma criança.

O dinheiro era um experimento, e a quantia refletia uma soma que poderia motivar outras pessoas a se envolverem. Roy, agora com 33 anos e gerente de projeto na OpenAI, empresa dona do ChatGPT, chamou a a oferta de "recompensa de namoro" [um trocadilho para a expressão em inglês associada aos incentivos pagos a quem ajuda a localizar criminosos, os "bounty hunters" ou caçadores de recompensas].

Um amigo ofereceu mais US$ 1.000 (R$ 4.970) com um requisito mais fácil: iria para quem o apresentasse a uma pessoa que lhe trouxesse "muita alegria" por pelo menos 18 meses. Outro amigo, Anatoliy Zaslavskiy, conhecido como Toli, acrescentou US$ 500 (R$ 2.485) com a mesma condição de 18 meses, elevando a recompensa total para US$ 3.500 (R$ 17.395).

Zaslavskiy, agora com 31 anos e engenheiro na Dropbox, gostou tanto da ideia que decidiu oferecer sua própria recompensa de namoro: US$ 100 mil (R$ 497 mil) que seriam pagos em um cronograma conhecido do meio das startups, o vesting, ao longo de quatro anos.

"Eu realmente gostei da estrutura de aquisição que as startups têm e pensei: 'se isso funciona no mundo financeiro, por que não pode funcionar no mundo dos relacionamentos?'", diz Zaslavskiy, que escolheu o valor após analisar seus gastos e pensar em quanto ele queria investir no amor.

Após o primeiro ano de relacionamento, o casamenteiro amador receberia uma quantia única de US$ 25 mil (R$ 124,25 mil). Em seguida, a pessoa receberia pagamentos mensais de aproximadamente US$ 2.000 até que o valor total fosse pago ou o casal se separasse.

Para aqueles com maior tolerância ao risco financeiro, Zaslavskiy propôs uma alternativa: uma iniciativa de compartilhamento de lucros. Se o parceiro em potencial concordasse com os termos, o casamenteiro receberia 10% da renda combinada do casal em um cronograma de vesting semelhante. Se os ganhos deles aumentassem, a recompensa também aumentaria.

Zaslavskiy, assim como Roy, postou sua recompensa online. Conforme os documentos circulavam, os comentaristas ridicularizavam a ideia por ser não apenas incomum, mas constrangedora.

Amor e dinheiro na história

O termo "recompensa" evoca imagens de cartazes de recompensa para capturar criminosos e lembra as "recompensas por bugs" que as empresas de tecnologia oferecem a pessoas que encontram falhas em seus sistemas.

Mas as recompensas de namoro de Roy e Zaslavskiy podem ser consideradas um retorno ao casamenteiro tradicional.

Eles queriam incentivar conexões para ajudá-los a encontrar um par —e, de fato, essa era a principal forma como as pessoas conheciam seus parceiros, diz Michael J. Rosenfeld, sociólogo de Stanford que pesquisou como os casais se conhecem e permanecem juntos.

Rosenfeld acredita que uma recompensa de namoro faz sentido, considerando que amigos e familiares perderam a prática de fazer apresentações.

"Isso é um esforço para colocar todas as mãos na massa, e isso faz sentido para mim", diz o especialista.

Além disso, acrescenta, as pessoas "não tratam a solteirice como uma emergência", mas sim como um estado de vida, "então, se você quer que as pessoas ao seu redor trabalhem nisso, você precisa incentivá-las mostrando que isso é realmente importante".

Carissa Cassiel exibe uma foto dela e de Mati Roy com seu filho Thane, na casa onde ela e Roy moram depois que ela respondeu à sua recompensa de namoro
Carissa Cassiel exibe uma foto dela e de Mati Roy com seu filho Thane, na casa onde ela e Roy moram depois que ela respondeu à sua recompensa de namoro - Dustin Chambers/The New York Times

Para Zaslavskiy, a estranheza da ideia faz parte de seu apelo. Ele não tinha medo de ser ridicularizado se isso abrisse mais opções para encontrar o amor e esperava que a recompensa atraísse o tipo de pessoa de mente aberta com quem ele gostaria de sair.

Na época, Zaslavskiy, que mora no Brooklyn, ganhava cerca de US$ 200 mil (R$ 994 mil) por ano, então os pagamentos mensais da recompensa de aproximadamente US$ 2.000 seriam cerca de 12% de seu salário.

"Eu olhei para todas essas coisas na minha vida que não me trazem tanto valor", diz. "Naquele ponto, eu estava gastando talvez US$ 13 mil (cerca de R$ 64,6 mil) por mês, mas eu precisava de todas essas coisas que estava comprando? Absolutamente não. Se eu pudesse gastar US$ 2.000 disso para encontrar alguém que eu amo, então isso definitivamente valia a pena".

Ele menciona o Blind, um aplicativo de fofocas anônimas usado por alguns funcionários de tecnologia.

"Basicamente, é um monte de pessoas de tecnologia reclamando de suas vidas, como um colega de trabalho colocou", diz ele. "Muitas pessoas lá ganham bem mais de meio milhão de dólares por ano e ainda têm dificuldades nos relacionamentos. Acho que as pessoas no Blind pagariam de bom grado mais de 10% para ter um relacionamento satisfatório".

Casamenteiro, Casamenteiro

Para a maioria das pessoas, US$ 100 mil seria uma quantia impressionante. Mas somas maiores já foram oferecidas. Um bilionário uma vez ofereceu a Rachel Greenwald, uma casamenteira profissional e membro executivo da Harvard Business School, uma recompensa de US$ 1 milhão (R$ 4,97 milhões) se ela encontrasse sua esposa. Ela recusou.

Greenwald disse que não era surpreendente que geralmente sejam os homens que oferecem recompensas por encontros: "As mulheres acham que soa desesperado, e os homens acham que soa como uma jogada de poder."

Não é que as "recompensas por encontros" não existam no mundo dos casamenteiros. "Bônus de casamento" e "taxas de sucesso", quando o "sucesso" é definido de forma mais ampla do que apenas casar, são comuns.

Greenwald estima que um terço dos casamenteiros tem algum tipo de taxa de sucesso em seus contratos. Ainda assim, não confunda a taxa de sucesso com o próprio serviço de casamenteiro, diz Greenwald.

Enquanto alguns profissionais —como agentes imobiliários, por exemplo— trabalham com comissão, o modelo de negócio de casamenteiros mais comum é uma mensalidade com uma taxa de sucesso.

Para os melhores casamenteiros, a mensalidade pode variar de US$ 10.000 (R$ 49.700) a US$ 75.000 (R$ 372.750) por mês, por três a seis meses, com uma taxa de sucesso de US$ 50.000 (R$ 248.500) a US$ 1 milhão (R$ 4,97 milhões).

O negócio de casamenteiros, diz Greenwald, não segue um modelo em que se paga apenas pela taxa de sucesso. Segundo ela, esse pagamento pelo "sucesso" desconsidera o tempo do casamenteiro, sua rede de contatos e sua expertise psicológica em entender e orientar a pessoa.

É por isso que uma recompensa por encontros pode parecer vulgar, mesmo que pagar por um coach de relacionamentos ou por uma assinatura premium do Hinge [aplicativo de namoro] seja aceitável, diz Michal Naisteter, uma casamenteira profissional na Filadélfia.

Um parece ser o pagamento por expertise e ajuda com o autodesenvolvimento, enquanto o outro parece "colocar um preço no amor".

Anatoliy Zaslavskiy diz que a estranheza da recompensa era parte do seu apelo e esperava que isso atraísse o tipo de pessoa de mente aberta com quem ele gostaria de namorar
Anatoliy Zaslavskiy diz que a estranheza da recompensa era parte do seu apelo e esperava que isso atraísse o tipo de pessoa de mente aberta com quem ele gostaria de namorar - Maansi Srivastava/The New York Times

Uma recompensa reivindicada

Depois que Zaslavskiy postou sua recompensa, ele recebeu cerca de cinco apresentações, duas das quais se transformaram em chamadas de vídeo, mas nenhuma se tornou um encontro.

Após uma reconciliação e separação com uma ex, ele está namorando novamente, e a recompensa de US$ 100 mil continua ativa. Ele é adepto do poliamor agora, então a recompensa será paga à pessoa que o apresentar a seu parceiro principal de longo prazo.

Após receber cerca de 27 apresentações, Roy teve cinco chamadas de vídeo e um encontro pessoal. Nenhum deles resultou em romance, mas sua amiga Carrie Radomski, que já havia tentado arranjar encontros para ele antes, compartilhou sua recompensa em sua página do Facebook.

Rapidamente atraiu ataques —e chamou a atenção da amiga de Facebook de Radomski, Carissa Cassiel.

A honestidade e especificidade de seu perfil (Roy queria ter pelo menos dois filhos) atraíram a atenção de Cassiel, e a recompensa parecia inteligente.

Mas o mais importante foi notar como ele lidava com as críticas. Comentadores diziam que a recompensa era estranha, ou que o perfil tinha informações demais ou que ele parecia autista, diz Cassiel, de 39 anos.

"Eu observei nos comentários como ele estava respondendo às pessoas", diz ela. "Ele era muito gentil e dizia: 'isso é um ótimo ponto' ou 'deveria mudar isso' ou 'posso adicionar algo assim' ou 'não é assim que me sinto'. Ele lidava com tudo de forma maravilhosa, e isso me pareceu muito significativo".

Cassiel decidiu comentar em defesa de Roy. Ela apontou que, como uma mulher solteira, gostava de ter muitas informações detalhadas ao avaliar possíveis encontros.

Roy estava no Canadá e Cassiel morava na Geórgia, mas os dois começaram a trocar mensagens e a passar tempo juntos durante encontros virtuais com amigos em comum. Para descobrir se funcionariam como casal, Roy foi morar com Cassiel por algumas semanas, depois passou um tempo no México com ela e Thane, filho de Cassiel de um relacionamento anterior.

Roy então se mudou permanentemente para a Geórgia. O casal se casou em abril passado e está criando Thane juntos.

Como o relacionamento já dura mais de 18 meses, US$ 1.500 da recompensa foram pagos a Radomski, que pretende doá-los para uma organização sem fins lucrativos. Roy ainda não adotou legalmente Thane, mas, se o fizer, ou se o casal tiver um filho biológico ou adotar outra criança, Radomski também receberá a recompensa original de US$ 2.000.

Roy e Cassiel estão entusiasmados com o potencial das recompensas por encontros. Ele acredita que é uma forma de as pessoas que conectam outras serem pagas por seu trabalho —que é um sinal de respeito. Cassiel acredita que, sem isso, ela e o Roy talvez nunca tivessem se conhecido.

"Acho brilhante e realmente envolve e importa as pessoas", diz ela. "Acho que também mostra motivação e determinação. É muito exemplar de sua personalidade. Quando ele decidiu que estava pronto, ele colocou seu dinheiro onde seu coração estava".

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