Sabesp privada terá limite de votos por acionista, menos conselheiros e nova regulação

Governo paulista propõe desconto de até 10% na tarifa social; veja detalhes da modelagem da privatização

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São Paulo

O Governo de São Paulo definiu nesta quarta-feira (17) detalhes sobre o modelo de privatização da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo).

As novidades, adiantadas pela Folha, envolvem mudanças na regulação e no estatuto da empresa, além do formato da oferta pública de ações, que deve ocorrer no meio deste ano.

Um dos principais pontos do anúncio foi uma proposta de desconto de até 10% na tarifa social de água, destinada a população mais vulnerável, conforme antecipou a coluna Painel.

A gestão estadual também afirma que haverá redução para as demais categorias, sendo 1% para consumo residencial e 0,5% para comercial e industrial.

Estação de tratamento de água da Sabesp, em Santo Amaro, na zona sul de São Paulo
Estação de tratamento de água da Sabesp, em Santo Amaro, na zona sul de São Paulo - Gabriel Cabral-26.jul.2019/Folhapress

"A gente quer um saneamento mais barato, melhor, mais rápido e para todos", disse o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos).

O desconto na tarifa virá por meio de aportes feitos com recursos do Fausp, fundo criado pelo governo que receberá 30% dos valor obtido na privatização e os dividendos da Sabesp que são hoje pagos ao estado.

Uma das principais definições apresentadas nesta quarta é sobre como será o follow-on, a oferta pública de ações. A gestão Tarcísio optou por um modelo inédito no Brasil.

O formato de oferta pública será o chamado sequencial, com dois blocos. Uma tranche prioritária para os agentes privados interessados em serem acionistas de referência da Sabesp e outra para investidores do mercado.

O acionista de referência será uma espécie de sócio estratégico do governo paulista no negócio, que deverá ser comprometido com a empresa no médio prazo, mas sem assumir o controle das decisões.

Pelos cálculos atuais, esse grupo investidor deverá levar sozinho 15% da Sabesp, tornando-se o maior acionista depois do governo (que ficaria com algo em torno de 20%). Hoje o governo tem 50,3% das ações da Sabesp.

Pelo formato sequencial, os sócios estratégicos deverão confirmar ao governo antes que possuem em caixa o valor para arrematar os 15% (calculado hoje em cerca de R$ 8,5 bilhões) e as garantias exigidas. Também precisarão mostrar o preço que aceitam pagar por ação.

Deverão ainda concordar com a trava de cinco anos que o governo vai estabelecer, o chamado "lock-up", que restringe a possibilidade de esse investidor vender os papéis.

O acionista estratégico só poderá vender a parte de suas ações a partir de 2030, após o prazo de universalização. Se optar por ficar com mais de 10% da companhia, o acordo de parceria com o governo valerá até 2034.

Feito isso, o governo então seleciona os dois melhores preços e leva para o mercado escolher qual oferta é mais atrativa. As duas melhores propostas geram dois "books", como chamado no jargão do setor. O que gerar mais interesse é escolhido. Esse modelo sequencial, segundo fontes a par do trâmite, já aconteceu fora do país, mas nunca no Brasil.

Oferta com dois preços

A grande dúvida sobre a oferta, porém, é quanto à precificação. A ideia é fazer o follow-on com dois preços distintos, um para o acionista de referência e outro para os investidores do mercado. No entanto, ainda não há garantia sobre a viabilidade jurídica desse modelo.

Isso porque a resolução 160 da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) define que o preço de um mesmo ativo precisa ser único.

O temor do governo é sobre o que pode acontecer com os valores de compra. É possível, por exemplo, que o sócio estratégico ofereça um preço por ação maior do que o investidor comum está disposto a pagar, e vice-versa.

A necessidade de nivelar os valores traria uma complexidade adicional ao processo. Por isso, o governo ainda estuda formas de conseguir fazer o leilão com dois preços distintos.

Novo estatuto

O Governo de São Paulo também definiu as linhas gerais do novo estatuto da Sabesp. O documento, porém, ainda precisa ser aprovado pelo Codec (Conselho de Defesa dos Capitais do Estado) e pela CVM. Em seguida, passar por assembleia geral extraordinária da Sabesp.

O novo estatuto vai diminuir o número de conselheiros de 11 para 9, sendo três indicados pelo estado, três do acionista de referência e três dos independentes.

Além disso, o acordo vai limitar o máximo de votos a 30% do capital da empresa. Ou seja, mesmo que um acionista acumule mais ações que isso, seu direito a voto estará limitado a 30%.

Mudanças na regulação

A gestão de Tarcísio concluiu também o contrato da Sabesp que precisará ser aprovado pela Urae (Unidades Regionais de Abastecimento de Água e Esgotamento), que agrupa municípios em bloco.

O contrato vai reger a operação nas 375 cidades que a Sabesp atende até 2060, definindo as obrigações e o plano de investimentos.

Outra novidade é sobre a regulação da companhia. Atualmente, o setor de saneamento é regulado em São Paulo pelo modelo chamado discricionário, que dá mais liberdade de atuação para a Arsesp (Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo).

É diferente, por exemplo, do modelo das rodovias, que segue a regulação contratual, na qual o contrato de concessão já define tudo o que vai acontecer ao longo do período de prestação do serviço.

A nova regulação vai limitar a atuação da agência. Uma das restrições será sobre o uso das despesas operacionais da Sabesp. Com a companhia privatizada, a Arsesp terá menos autonomia para aplicar esses recursos. Haverá regras e pré-requisitos a serem cumpridos para que a entidade goze desses valores.

A mudança regulatória é um agrado aos agentes privados, que viam no modelo discricionário uma fonte de incertezas, além de interferência excessiva.

O novo modelo aprovado pelo Governo de São Paulo será uma mistura entre o discricionário e o contratual, que vem sendo chamado internamente de "regulação Sabesp" ou "híbrida".

Mudança de investimentos

Outra novidade será a forma como os investimentos serão incorporados na tarifa. Atualmente, a companhia opera o capex "olhando para frente", ou seja, já considera na tarifa de hoje o investimento que será feito no futuro.

O novo formato vai trazer o investimento para a tarifa só quando ele começar a ser executado. A avaliação é que esse formato serve de estímulo para melhorias, enquanto o anterior incentivava mais promessas do que obras.

O novo contrato, porém, ainda precisará ser aprovado no âmbito da Urae. Como o órgão funciona com o colegiado, os municípios não vão aprovar individualmente, mas coletivamente.

A reunião deve acontecer em meados de maio. Até lá, é possível que alguma cidade saia da Urae, o que pode impactar nos cálculos de desconto da tarifa, por exemplo. Por isso, a divulgação sobre os valores foi adiada.


RAIO-X DA SABESP

Fundação: 1973
Lucro líquido 2023: R$ 3,5 bilhões
Valor de mercado: R$ 57 bilhões
Funcionários: 11.170
Municípios atendidos: 375
População atendida: 28,4 milhões

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