Descrição de chapéu ministério da fazenda

Contas públicas têm rombo de R$ 61 bi em maio, segundo pior para o mês na história

Pagamento de 13º do INSS e gastos com calamidade no RS contribuíram para resultado negativo; no ano, déficit é de R$ 30 bilhões

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Brasília

O pagamento do 13º aos beneficiários do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) e as despesas extras para enfrentar a calamidade no Rio Grande do Sul levaram as contas do governo central a acumularem déficit de R$ 61 bilhões em maio, informou nesta quarta-feira (26) o Tesouro Nacional.

Trata-se do segundo pior resultado para o mês na série histórica, iniciada em 1997. Um resultado mais negativo só foi observado em 2020, quando a União precisou abrir os cofres públicos para enfrentar a pandemia de Covid-19 e registrou um rombo de R$ 165,1 bilhões, em cifras atualizadas.

As contas do governo central incluem Tesouro Nacional, Banco Central e Previdência Social.

O ministro Fernando Haddad em evento de lançamento de programa de crédito, no Palácio do Planalto - Gabriela Biló/Gabriela Biló - 22.abr.2024/Folhapress

Em maio, houve crescimento expressivo da receita líquida (descontadas as transferências para estados e municípios), com alta real de 9% ante igual mês de 2023. Mas o desempenho da arrecadação foi insuficiente para fazer frente a uma despesa que avança em ritmo mais acelerado: 14% acima da inflação.

Com o resultado de maio, as finanças públicas revertem o quadro positivo observado nos primeiros quatro meses e agora acumulam um déficit de R$ 30 bilhões no ano. Nessa comparação, o dado também é o pior para o período desde 2020.

Em entrevista coletiva, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, ressaltou que a antecipação de pagamentos teve peso relevante nos resultados.

No ano passado, o governo quitou as duas parcelas do 13º de aposentados e pensionistas entre o fim de maio e o início de julho. Em 2024, o repasse foi feito entre o fim de abril e o início de junho.

No entanto, o gasto total de R$ 110,1 bilhões com benefícios previdenciários em maio ficou R$ 5 bilhões acima do havia sido previsto pelo próprio governo no último relatório de avaliação do Orçamento. Dessa diferença, R$ 2,7 bilhões correspondem à antecipação de pagamentos a segurados gaúchos, enquanto os outros R$ 2,3 bilhões foram, de fato, inesperados.

A trajetória dos gastos com a Previdência é um dos focos de preocupação de economistas. A aceleração nas concessões, com a redução da fila de espera do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), é benéfica para os segurados, mas impulsiona as despesas obrigatórias sob um arcabouço fiscal que limita o crescimento total a 2,5% acima da inflação.

Ceron reconheceu que algumas despesas têm seguido dinâmicas distintas, mas minimizou as preocupações com os gastos. "Os limites serão rigorosamente cumpridos", afirmou o secretário. "As medidas para garantir essa trajetória serão adotadas."

Na manhã desta quarta-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) colocou em dúvida a necessidade de efetuar um corte de gastos para melhorar o equilíbrio fiscal do governo. O chefe do Executivo afirmou que será preciso analisar se a questão pode ser resolvida com aumento da arrecadação.

"O problema não é que tem que cortar. Problema é saber se precisa efetivamente cortar ou se precisa aumentar a arrecadação. Temos que fazer essa discussão", afirmou Lula em entrevista ao portal UOL.

Questionado sobre a declaração, Ceron disse que o presidente mencionou um diagnóstico que está sendo feito pelas equipes e ressaltou que as sinalizações de Lula "são de total apoio à equipe econômica". Ele atribuiu as reações do mercado a "interpretações".

O secretário também fez questão de diferenciar corte de despesa e revisão de gastos. "Quando fala cortar gastos, na minha leitura técnica, é descontinuar um programa. Mas eu posso diminuir o crescimento do programa. Continua crescendo, mas numa dinâmica mais confortável", disse.

"Sempre foi claro, [a direção atual] não é uma política fiscal ou uma política econômica buscando um Estado mínimo. É uma política que vai equilibrar as demandas sociais importantes com responsabilidade fiscal", acrescentou. Segundo ele, a expressão "corte de gastos" está na categoria de termos e chavões que "atrapalham o debate mais sereno".

O secretário do Tesouro ainda fez coro à declaração de Lula de que não está em discussão mexer na política de valorização do salário mínimo —que assegura correção pela inflação mais a variação do PIB (Produto Interno Bruto) de dois anos antes e contribui para elevar a despesa do INSS.

Ele negou que, sem mudar a política do salário mínimo, o governo ficará "enxugando gelo" com outras medidas para conter despesas enquanto o piso impulsiona os gastos da Previdência em igual ou maior medida.

"A despesa pública não é determinada só pela variação do salário mínimo. Obviamente ela é importante, mas é um componente social importante. Dado que o governo entende que ele é um componente central, precisamos adequar a condução da política fiscal a esse pilar", disse.

Segundo Ceron, há caminhos para fazer isso sem que as medidas sejam apenas paliativos para o problema. O secretário, porém, não detalhou os diagnósticos apresentados pela equipe econômica a Lula, nem as medidas específicas a serem adotadas pelo Executivo para controlar a trajetória de gastos.

Pelo lado das receitas, também há incertezas. O ministro Fernando Haddad (Fazenda) traçou o objetivo de alcançar um déficit zero em 2024, mas a margem de tolerância criada pelo novo arcabouço fiscal autoriza um resultado negativo em até R$ 28,8 bilhões sem configurar estouro da meta.

Na segunda avaliação do Orçamento, divulgada em julho, o governo estimou um déficit de R$ 27,5 bilhões, incluindo R$ 13 bilhões em despesas extraordinárias decorrentes da calamidade no Rio Grande do Sul. Como esses gastos podem ser descontados da meta fiscal, o dado que vale para o cumprimento da regra é estimado em déficit de R$ 14,5 bilhões.

O alcance desse resultado, porém, depende de R$ 168,3 bilhões em receitas extras a partir de medidas aprovadas pelo Congresso Nacional —algumas das quais têm tido performance abaixo do esperado.

Como mostrou a Folha, a negociação especial para contribuintes derrotados pelo voto de desempate nos julgamentos do Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) —principal medida de arrecadação para 2024, calculada em R$ 55,6 bilhões— teve adesão zero até agora.

Diante das frustrações de receitas, economistas estimam que o governo precisará fazer um contingenciamento significativo no relatório bimestral de julho. O mecanismo implica segurar gastos para compensar a perda de arrecadação e evitar o estouro da meta fiscal.

Nas contas dos analistas, a trava precisaria ficar entre R$ 15 bilhões e R$ 46 bilhões para cumprir o alvo no limite do déficit permitido pela banda de tolerância. A realização do contingenciamento também tem sido colocada como uma demonstração simbólica importante de compromisso com a saúde das contas públicas.

Na entrevista coletiva, Ceron criticou o rumo do debate sobre esse ponto. "Fica se criando esses mitos, precisa ter contingenciamento para mostrar que pode ter contingenciamento. Não podemos conduzir dessa forma", afirmou.

O secretário disse ainda que, em sua avaliação, não houve mudança significativa nos parâmetros a ponto de justificar um forte congelamento de gastos. Ele não quis comentar a frustração no Carf e afirmou que a reestimativa dessas medidas caberá à Receita Federal.

"Até pode acontecer [o contingenciamento], mas numa primeira avaliação, acho exagerado os montantes que estão sendo sinalizados", disse Ceron.

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