Governo define que BC descumprirá meta quando inflação ficar fora do alvo por 6 meses seguidos

Mudança no sistema foi oficializada nesta quarta-feira (26), em edição extra do Diário Oficial da União

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Brasília

O governo federal publicou nesta quarta-feira (26), em edição extra do DOU (Diário Oficial da União), o decreto assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que formaliza a mudança do sistema de metas de inflação.

O texto prevê que a meta será considerada descumprida quando a inflação, medida pela variação de preços acumulada em 12 meses, ficar por seis meses seguidos fora do intervalo de tolerância.

Com a nova regra, o Banco Central passa a perseguir, a partir de 1º de janeiro de 2025, a meta de inflação de forma contínua, sem se vincular ao chamado "ano-calendário" (período de janeiro a dezembro de cada ano).

Sede do Banco Central, em Brasília - Pedro Ladeira/Folhapress

A mudança no sistema já havia sido anunciada pelo ministro Fernando Haddad (Fazenda) em junho do ano passado, mas faltava a publicação do decreto para oficializar a alteração.

Na ocasião, também foi determinado o alvo de 3% para a variação de preços, com intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos, para o ano de 2026 e ratificado o mesmo objetivo para 2024 e 2025. Isso significa que a meta é considerada cumprida se oscilar entre 1,5% (piso) e 4,5% (teto).

De acordo com o decreto, a meta e o intervalo de tolerância poderão ser alterados pelo CMN (Conselho Monetário Nacional), mediante proposta do ministro da Fazenda, com antecedência mínima de 36 meses (três anos) para o início de sua aplicação. Cabe ao BC executar as políticas necessárias ao cumprimento da meta fixada.

A formalização ocorreu horas antes de novo encontro do CMN –colegiado composto por Haddad, pela ministra Simone Tebet (Planejamento e Orçamento) e pelo presidente do BC, Roberto Campos Netoalvo preferencial das críticas de Lula pela condução da política de juros do país.

O aval de Lula foi dado um dia antes, na terça (25), em reunião com o diretor de Política Monetária do BC, Gabriel Galípolo, o ministro Alexandre Padilha (Secretaria de Relações Institucionais), a secretária-executiva da Casa Civil, Miriam Belchior, como substituta do ministro Rui Costa (de férias), além de Haddad. Apesar de ser integrante do CMN, Tebet não participou do encontro no Palácio do Planalto.

O decreto também prevê que o BC, sempre que estourar a meta de inflação, deverá divulgar as razões do descumprimento em uma carta aberta endereçada ao ministro da Fazenda, como ocorre hoje, e em uma nota no Relatório de Política Monetária –atual RTI (Relatório Trimestral de Inflação), que será rebatizado.

Segundo o texto, o Relatório de Política Monetária deverá conter o desempenho do novo sistema de metas para a inflação, os resultados das decisões passadas de política monetária e a avaliação prospectiva da inflação. Ele será divulgado pelo BC, também a partir de 1º de janeiro de 2025, até o último dia de cada trimestre.

Na prestação de contas em caso de estouro da inflação, o BC deverá fazer uma descrição detalhada das causas do descumprimento, as medidas necessárias para assegurar o retorno da inflação aos limites estabelecidos e o prazo esperado para que essas medidas produzam efeito.

Se a inflação não voltar ao intervalo de tolerância da meta no prazo estipulado na nota e na carta ou o BC considerar necessário atualizar as medidas ou o prazo previsto para o retorno da inflação ao alvo fixado, a autoridade monetária deverá divulgar nova nota e carta.

"O Conselho Monetário Nacional poderá estabelecer mecanismos adicionais de prestação de contas pelo Banco Central do Brasil sobre a condução da política monetária na nova sistemática de meta para a inflação", diz o documento.

O decreto aponta ainda que o índice de preços a ser adotado deve ser escolhido pelo CMN, também mediante proposta do ministro da Fazenda. Hoje, o medidor usado como padrão é o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), o índice oficial de inflação do país.

O antigo sistema de metas para a inflação no Brasil foi instituído em 1999 com o objetivo de dar segurança à sociedade sobre os rumos da economia, evitando o risco de repetir a hiperinflação que atingiu o país na década de 1980 e no início dos anos 1990.

A meta de inflação serve para balizar as expectativas do mercado financeiro e vinha sendo reduzida a partir de uma decisão tomada pelo governo Michel Temer (MDB) em 2017, até chegar aos atuais 3%.

Em nota, após a divulgação do decreto, a Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda destacou que o novo modelo de metas reduz o risco de populismo a partir da adoção de medidas que reduzam a inflação de forma artificial.

"Com a mudança, deixam de existir estímulos para implementar políticas que levem à desaceleração ‘artificial’ da inflação à medida que o fim do ano se aproxime, apenas para garantir cumprimento da meta", disse.

O órgão ressaltou que essas distorções foram "muito observadas" no passado recente, "comprometendo por vezes a arrecadação (no caso de desonerações) e a inflação do ano seguinte (amplificada pela reoneração)".

Em 2022, o índice oficial de inflação chegou a bater em 12,13% no acumulado de 12 meses até abril. A perda de fôlego nos meses posteriores foi puxada pelos cortes tributários sobre itens como combustíveis.

Assim, o índice registrou três meses consecutivos de deflação (queda), de julho a setembro. O corte de tributos veio em meio aos planos de reeleição de Jair Bolsonaro (PL), que acabaram frustrados pela derrota para Lula nas urnas.


ENTENDA O QUE MUDA NO SISTEMA DE METAS DE INFLAÇÃO

SISTEMA DE METAS
A partir de 2025, o Banco Central terá de perseguir a meta para inflação de forma contínua, mês a mês, com base nos 12 meses anteriores. Hoje, o sistema está vinculado a um ano-calendário fechado, ou seja, ao período de janeiro a dezembro de cada ano.

ALVO DE INFLAÇÃO
No ano passado, o CMN (Conselho Monetário Nacional) definiu para 2026 a meta de 3%, com intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos (piso de 1,5% e teto de 4,5%, na prática). Com a mudança no sistema, o objetivo será de 3% de forma contínua, a partir do próximo ano, sem necessidade de o colegiado fazer novas confirmações anuais.

A meta e o intervalo de tolerância poderão ser alterados pelo CMN, desde que a proposta do ministro da Fazenda seja observada com antecedência mínima de 36 meses (três anos) para o início de sua aplicação.

DESCUMPRIMENTO DA META
A meta será considerada descumprida quando a inflação, medida pela variação de preços acumulada em 12 meses, ficar por seis meses seguidos fora do intervalo de tolerância. Atualmente, o estouro é medido ao término de cada ano.

PRESTAÇÃO DE CONTAS
Sempre que estourar a meta de inflação, o Banco Central deverá divulgar as razões do descumprimento em uma carta aberta endereçada ao ministro da Fazenda, como ocorre hoje, e também em uma nota no Relatório de Política Monetária –atual RTI (Relatório Trimestral de Inflação), que será rebatizado no ano que vem.

O decreto estabelece que o CMN poderá estabelecer mecanismos adicionais de prestação de contas pelo Banco Central sobre a condução da política monetária no novo sistema de metas para inflação.

O QUE MUDA NA PRÁTICA
Com uma atuação desvinculada do ano-calendário fechado, o Banco Central ganha mais flexibilidade no horizonte de tempo para perseguir seus objetivos e buscar a convergência dos preços à meta.

Mas há o entendimento de que a mudança apenas formaliza a maneira como o BC já conduz a política monetária atualmente, pois suas decisões sobre os juros levam em consideração o comportamento da inflação em um horizonte mais amplo, de cerca de 18 meses.

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