Descrição de chapéu Banco Central copom

Liderança do governo no Senado vê PEC que amplia autonomia do BC como inconstitucional

Nota técnica afirma que proposta defendida por Campos Neto coloca em xeque fiscalização do mercado financeiro

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Brasília

Um parecer feito pela liderança do governo no Senado afirma que a PEC (proposta de emenda à Constituição) que dá autonomia financeira ao Banco Central é inconstitucional, cria insegurança jurídica para os servidores e coloca em xeque a fiscalização de instituições financeiras.

A nota técnica, obtida pela Folha, diz que a proposta viola a harmonia e a separação de Poderes (uma cláusula pétrea da Constituição) ao retirar o BC da estrutura administrativa do Executivo e submeter a instituição à supervisão do Congresso Nacional.

Entre outros pontos, o parecer afirma que a proposta é ambígua e gera "incerteza quanto ao regime jurídico" ao criar uma empresa pública com funções incompatíveis com a exploração de atividade econômica, como a emissão de moeda e a gestão de reservas internacionais.

A imagem mostra um edifício de cor escura e design geométrico, erguendo-se entre árvores frondosas sob um céu parcialmente nublado. A perspectiva é de baixo para cima, destacando a altura do prédio.
Fachada do Banco Central, em Brasília - Gabriela Biló/Folhapress

A nota também aponta incerteza jurídica para o funcionalismo. O documento diz que o reenquadramento dos servidores à CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) não tem precedentes e pode gerar impactos indesejáveis para outras categorias do serviço público.

"Há também implicações previdenciárias, uma vez que a migração de regime próprio para regime geral de previdência até poderia manter o tempo de contribuição, mas limitaria a aposentadoria ao teto do INSS", diz o documento interno.

Outro ponto de preocupação, segundo a liderança do governo no Senado, é a fiscalização do mercado financeiro. Ao transformar o BC em empresa pública, o Congresso pode comprometer o poder da instituição de investigar irregularidades e aplicar multas.

"A transformação do Bacen em empresa pública e, consequentemente, a transformação e/ou contratação de seus funcionários sob o regime da CLT [...] pode comprometer de forma muito séria a imparcialidade, segurança jurídica e demais aspectos essenciais ao regular exercício do poder de polícia inerente ao Bacen."

O parecer também afirma que há inconstitucionalidade por vício de iniciativa, uma vez que a proposta "usurpa" a atribuição privativa do presidente da República de deflagrar o processo de discussão de um tema como este no Legislativo.

"Ao constitucionalizar a autonomia técnica, operacional, administrativa e financeira, acrescentando, ainda, a autonomia orçamentária, a PEC consolida o distanciamento da gestão da política monetária do núcleo dirigente da política econômica e das escolhas democráticas, resultantes das urnas, sobre os melhores projetos políticos de governo."

Procurada, a liderança do governo no Senado afirmou que o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ainda não tem posição sobre a PEC e que a nota, elaborada pela assessoria técnica de forma preliminar, está sujeita a alterações.

Apesar do apoio do presidente do BC, Roberto Campos Neto, a PEC enfrenta a resistência de cardeais do Senado, como Omar Aziz (PSD-AM). O líder da União Brasil, Efraim Filho (PB), avalia que a medida está no radar dos senadores, mas não deve avançar a curto prazo.

A proposta ainda não tem data para votação. O relator, senador Plínio Valério (PSDB-AM), esperava ler o parecer na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) na quarta (12), mas o presidente, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), pediu a realização de uma audiência pública antes.

Governistas avaliam reservadamente que Campos Neto tenta imprimir uma marca de sua gestão com a aprovação da PEC. Um aliado de Lula afirma que a postura do presidente do BC nesta semana também pode ter comprometido o avanço das discussões.

Campos Neto sinalizou ao governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), que aceitaria ser ministro da Fazenda dele, como mostrou o Painel S.A. O governador de São Paulo é apontado como possível adversário de Lula nas próximas eleições.

O Sinal (Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central) também intensificou a pressão contra a medida. Sindicalistas protestaram em frente ao Senado na quarta com cartazes escrito "PEC 65 não" e dizem ter visitado todos os gabinetes.

O presidente do Sinal, Fábio Faiad, afirma que os defensores da proposta tentaram vender para a opinião pública um sentimento de "já aprovou" que não é verdadeiro. Ele avalia que os senadores começaram a se atentar para eventuais riscos.

"Uma coisa é você ser uma instituição de Estado com autarquia federal dentro da União. A outra coisa é você ser uma empresa pública celetista. Algumas prerrogativas que são exclusivas do poder público são perdidas", afirma.

Desde que foi apresentada pelo senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO), em novembro, a PEC contou com o apoio de Campos Neto. Apesar de ter autonomia assegurada em lei desde 2021, a autoridade monetária não tem autonomia financeira.

A partir da PEC, o Banco Central passaria de autarquia especial para empresa pública de natureza especial, o que daria maior poder sobre o próprio orçamento, como ocorre no BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).

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