O Congresso Nacional recusou a medida criada pelo governo para restringir o uso de créditos tributários por parte de empresas, levando o ministro Fernando Haddad (Fazenda) a sofrer uma nova derrota no debate fiscal.
A MP (medida provisória) —que entra em vigor imediatamente, mas precisa ser aprovada posteriormente pelo Congresso— havia sido enviada pelo governo aos parlamentares apenas uma semana antes, alterando regras do PIS/Cofins para compensar a perda de receitas sofrida pela União com a desoneração da folha de pagamento de 17 setores.
O texto do governo logo gerou uma significativa reação de grupos empresariais que se viam prejudicados, enquanto o Ministério da Fazenda dizia que iria conversar melhor com parlamentares e com os setores afetados. A pressão continuou e levou o presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), anunciar nesta terça-feira (11) a devolução da medida.
"É sabido que, em matéria tributária, vigoram alguns princípios que são muito caros para se conferir segurança jurídica, previsibilidade, ordenação de despesas, manutenção dos setores produtivos. E um dos princípios é o de anterioridade e anualidade", disse Pacheco, fazendo referência à exigência de tempo para que entrem em vigor determinadas alterações em impostos.
"O que se observa em parte dessa MP, na parte substancial dela, é que há uma inovação com a alteração de regras tributárias, que geram um enorme impacto ao setor produtivo nacional, sem que haja a observância dessa regra constitucional da noventena na aplicação, sobretudo, dessas compensações do PIS/Cofins."
O presidente do Senado foi aplaudido por parte dos parlamentares após o anúncio —feito por ele no início da sessão do plenário desta terça. O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), estava sentado ao lado de Pacheco e posteriormente o elogiou.
Na discussão sobre a desoneração, Haddad também sofreu reveses. O ministro era contrário à prorrogação da medida, mas o Congresso acabou aprovando a iniciativa.
A MP foi editada pelo governo na terça-feira (4) da semana passada. Na sexta (7), Haddad disse que algumas pessoas sequer haviam lido o texto. Para ele, ninguém quer abrir mão de privilégios na discussão.
Na segunda-feira (10), o diretório nacional do Progressistas (PP) apresentou uma ADI (ação direta de inconstitucionalidade) ao STF com pedido de medida cautelar (decisão urgente) contra a MP.
A MP tem sete artigos. Pacheco devolveu os trechos que tratavam da limitação aos créditos de PIS/Cofins (parte do artigo 1º, além dos artigos 5º e 6º). Na prática, estes pontos perdem eficácia; os demais continuam valendo, até que haja decisão do Congresso.
Pacheco afirmou que não há adversidade entre o Legislativo e o Executivo e que a decisão foi tomada "com absoluto respeito" às prerrogativas do presidente. O senador também agradeceu a Wagner por ter sido "construtivo na solução" desde que a "celeuma" foi criada.
Wagner, por sua vez, fez elogios à tranquilidade e à capacidade negocial de Pacheco. Segundo o líder do governo no Senado, Lula "não estava confortável" e que a decisão de Pacheco "tem o aplauso do presidente da República".
"É melhor um final trágico do que uma tragédia sem fim. Nós estávamos vivendo uma tragédia que pareceria sem fim", afirmou.
É melhor um final trágico do que uma tragédia sem fim. Nós estávamos vivendo uma tragédia que pareceria sem fim
Pacheco havia se reunido com Lula e Haddad na segunda. Segundo relatos, o senador mineiro mencionou a possibilidade de devolver a MP e pediu uma posição do governo até esta terça.
O presidente do Congresso reclamou da decisão do governo de tratar do tema via medida provisória, instrumento com eficácia imediata, e demonstrou preocupação com a forte reação do empresariado.
Pacheco foi avisado pelo governo do teor da MP antes da publicação, na terça-feira da semana passada (4), mas pessoas próximas ao senador dizem que ele não recebeu detalhes da mudança —o que um auxiliar de Lula nega.
Pacheco também pediu um estudo à consultoria do Senado sobre o tema. O documento não foi divulgado. Segundo um senador a par das negociações, o parecer respalda a decisão de devolver a proposta ao governo.
O parlamentar afirma que a MP não atende ao requisito de urgência porque ainda há tempo hábil para cumprir a decisão do STF de 17 de maio, que exigiu a apresentação de uma compensação para a desoneração da folha em até 60 dias.
"Quero registrar o papel do próprio presidente da República [Lula], que o chamou [Pacheco] para um diálogo junto com o ministro da Fazenda, externou que não estava confortável, claramente. E vossa excelência teve a capacidade de encontrar um caminho que, na minha opinião, nada mais é do que o caminho legal e constitucional para interromper o que seria uma tragédia sem fim", disse Wagner.
Wagner também pediu ajuda dos senadores para encontrar uma fonte de compensação para a desoneração da folha de 17 setores da economia e prefeituras.
Na mesma linha, o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), afirmou que o Parlamento precisa estar "disponível" para ajudar a colocar as contas públicas em dia.
"Neste caso, o que nós precisamos responder é o seguinte: até o dia 11 de agosto, de onde sairão R$ 26 bilhões de reais para viabilizar a desoneração?", questionou o senador a jornalistas.
Entre os grupos beneficiados com a desoneração está o de comunicação, no qual se insere o Grupo Folha, empresa que edita a Folha. Também são contemplados os segmentos de calçados, call center, confecção e vestuário, construção civil, entre outros.
Pacheco disse que a discussão sobre a compensação a ser criada para a desoneração será tratada com prioridade na próxima reunião de líderes, na quinta (13).
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