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Inteligência artificial ajuda jovens de baixa renda a se prepararem para entrevistas de emprego

Ferramenta de fundação indiana destaca pontos fortes e fracos dos candidatos; alunos do Ensino Técnico de SP terão acesso ao recurso

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São Paulo

Pedro Henrique Martins Silva, 19 anos, tem se preparado melhor para as entrevistas de emprego. Estudante de análise e desenvolvimento de sistemas, Silva aprendeu que precisa corrigir algumas gírias que usa "na quebrada", na comunidade onde mora na zona leste de São Paulo.

Expressões como "beleza", "tipo", "tá ligado?" deixaram de fazer parte do seu vocabulário quando está diante de um potencial empregador. Também tem se policiado para não usar tantas palavras repetidas. Por outro lado, se sentiu confiante ao saber que a sua entonação de voz, clara e pausada, é um ponto forte nas entrevistas –assim como o desenvolvimento das suas ideias, expressas de maneira concatenada.

Quem apoiou Silva com dicas sobre como se comportar em entrevistas para uma vaga não foram os amigos da faculdade, os pais ou professores. Foi a ferramenta "Meu Preparador de Entrevistas", lançada este ano pela Fundação Wadhwani, que usa inteligência artificial para treinar os candidatos sobre as perguntas mais comuns dos entrevistadores e sobre como se apresentar da maneira mais adequada para conquistar uma vaga.

A imagem mostra um homem em um ambiente externo, posicionado sob uma estrutura de madeira com ripas. O céu é visível entre as ripas, e a luz do sol ilumina a cena. O homem está olhando para o lado, com uma expressão pensativa.
O desenvolvedor de softwares Rarikmilkrai Souza: ferramenta de IA ajudou na dificuldade de comunicação com clientes e colegas de trabalho. - Karime Xavier/Folhapress

"A ferramenta identificou os meus pontos fortes e fracos, me disse que preciso mostrar exemplos de como melhorar meu desempenho. Isso me ajudou a deixar de encarar as entrevistas como uma prova mortal. Hoje fico mais tranquilo", diz o universitário.

Criada pelo empresário de tecnologia indiano Romesh Wadhwani no início dos anos 2000, a Fundação Wadhwani procura garantir que os jovens em vulnerabilidade social estejam preparados para o mercado de trabalho com o desenvolvimento de "soft skills", as competências socioemocionais, como boa comunicação, segurança, atitude positiva e trabalho em equipe.

Entre 2024 e 2027, a fundação deve investir US$ 25 milhões (R$ 128 milhões) em 15 países do mundo, sendo 10% disso no Brasil, onde se instalou há cerca de quatro anos e vem desenvolvendo trabalhos com empresas e instituições como Fundação Bunge, iFood e Trevisan.

"Em pesquisas com empregadores descobrimos que as soft skills representam 70% das competências necessárias para ter sucesso no emprego", diz Thiago Françoso, vice-presidente de empregabilidade da Fundação Wadhwani no Brasil. "Mesmo que o jovem tenha conhecimento técnico, muitas vezes ele tem dificuldades de relacionamento ou comunicação, por carência dessas competências. Isso pode colocar em risco a sua permanência no emprego."

O desenvolvedor de sistemas Rarikmilkrai Souza, 35 anos, nunca teve dificuldades com cálculos ou raciocínio lógico –habilidades naturais para este pernambucano que, aos 4 anos, já aprendeu a ler e a escrever. Mas o momento de informar os clientes leigos sobre as melhorias feitas no sistema para ele sempre foi um martírio.

"Eu não conseguia traduzir a linguagem técnica para algo informal", diz Souza. "Eu falava com segurança com outros que dominam a linguagem técnica como eu, mas não sabia me comunicar com os leigos."

A partir das ferramentas de inteligência artificial da Fundação Wadhwani, disponíveis pelo site e aplicativo, Souza conseguiu entender melhor onde estavam as suas limitações e como superá-las. O relacionamento com a equipe também costumava ser um problema. "Eu não curto BBB ou qualquer coisa do gênero", diz ele, que nem tem TV em casa. "Eu costumava me isolar das pessoas por não apreciar as mesmas coisas que elas. Mas hoje consigo interagir bem melhor."

Recentemente, a fundação fechou uma parceria com o Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial) e com a Seduc (Secretaria da Educação do Estado de São Paulo), através da Diretoria Regional de Ensino da Região Norte 2 da capital paulista.

Na Seduc, uma parte do programa foi implementada entre abril e novembro do ano passado. Desde então, foi observada uma redução de 30% nos índices de indisciplina entre os alunos da terceira série do Ensino Técnico, segundo a fundação. Com os jovens, foram desenvolvidos temas como comunicação, empatia, autocontrole e resolução de conflitos.

Por meio de uma plataforma que simula situações do cotidiano e do ambiente de trabalho, os estudantes foram estimulados a encontrar as melhores soluções. "Os alunos também demonstraram maior preocupação com entrevistas de emprego e com o ingresso no mercado de trabalho", afirma Françoso.

Segundo Daniel Barros, diretor pedagógico da Seduc, a partir do ano que vem, todos os jovens do 2º e 3º ano do Ensino Médio que estão matriculados Ensino Técnico das escolas públicas do estado terão acesso à ferramenta Meu Preparador de Entrevistas. Serão 170 mil alunos, o equivalente a 25% do total de alunos do 2º e 3º anos do Ensino Médio.

"No ensino técnico, os alunos têm um componente chamado carreira e mercado de trabalho, que os ajuda a se prepararem para a participação em processos seletivos. As ferramentas da Fundação Wadhwani ajudam muito porque dão devolutivas mais detalhadas, específicas, de como cada um pode melhorar as respostas de processos seletivos", diz Barros.

"Não basta apresentar o diploma: eles precisam saber contar sua história, serem convincentes, para atravessarem essa ponte da escola para o mercado profissional."

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