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07/01/2011 - 16h38

Paul Krugman: O augúrio do Texas

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PAUL KRUGMAN
DO "NEW YORK TIMES"

O momento é difícil para os governos estaduais norte-americanos. Imensos deficit existem em quase toda parte, da Califórnia a Nova York, de Nova Jersey ao Texas.

Calma lá -no Texas? O Texas teoricamente não estava prosperando enquanto o restante do país sofre? O governador do Estado não declarou, em sua campanha de reeleição, que "temos bilhões em superavit"? Sim, estava, e sim, ele fez essa declaração. Mas a realidade terminou por interferir, na forma de um deficit que deve atingir até US$ 25 bilhões nos dois próximos anos.

E essa realidade tem implicações para o país como um todo. Pois o Texas é o lugar no qual a moderna teoria orçamentária conservadora -a crença de que impostos jamais devem ser elevados, não importa a circunstâncias, e que sempre é possível equilibrar o orçamento por meio de cortes nos gastos perdulários- foi implementada da maneira mais completa. Portanto, se a teoria não funciona nem lá, não funcionará em lugar algum.

Qual é a gravidade do deficit texano? Comparar crises orçamentárias em diferentes Estados é complicado por motivos técnicos. Ainda assim, dados do Center on Budget and Policy Priorities sugerem que o rombo no orçamento do Texas é mais grave que o de Nova York, e tão sério quanto o da Califórnia, embora não seja tão severo quanto o de Nova Jersey.

O ponto, porém, é que ainda recentemente o Texas vinha sendo alardeado como modelo (e continua a sê-lo, por comentaristas que não acompanham o noticiário). Era o Estado ao qual a recessão supostamente não havia chegado, graças aos impostos baixos e às políticas favoráveis às empresas. O governador se vangloriava de que o orçamento estadual estava em boa situação graças a "decisões duras e conservadoras".

Em um momento de profundas críticas aos sindicatos de funcionários públicos como fonte de todos os nossos males, o Texas não sofre esse tipo de problema. Lá, menos de 20% do funcionalismo trabalha sob contratos coletivos sindicais, ante cerca de 75% do quadro dos funcionários estaduais de Nova York.

Assim, o que aconteceu ao "milagre do Texas" de que tanta gente falava ainda alguns meses atrás?

Parte da resposta é que as alegações de que o Estado havia resistido à recessão eram grande exagero. É verdade que o Texas não sofreu perdas de emprego tão severas quanto as do país como um todo, desde que a recessão começou, em 2007. Mas a população texana vem crescendo rapidamente -em larga medida, sugere Edward Glaeser, da Universidade Harvard, devido a políticas liberais de zoneamento, que mantêm baixos os preços dos terrenos. Isso nada tem de errado, mas se considerarmos essa população em alta, o Texas precisa criar empregos mais rápido que restante do país, para acompanhar o crescimento em sua força de trabalho.

E se considerarmos os números do desemprego, a situação texana não parece tão especial: o índice estadual de desemprego é inferior à média nacional, em parte devido aos preços elevados do petróleo, mas é comparável ao de Massachusetts ou Nova York.

E quanto ao orçamento? A verdade é que o governo do Texas há anos emprega truques contábeis para criar a ilusão de que suas finanças são sólidas, diante de um sério deficit orçamentário "estrutural", ou seja, um deficit que persiste mesmo quando a economia apresenta bom desempenho. Quando surgiu a recessão, a arrecadação tributária do Texas caiu como a de todos os demais lugares, e portanto a ilusão estava fadada a ser exposta.

A única coisa que permitiu que o governador Rick Perry continuasse, por algum tempo a alegar superavit é o fato de que o Texas só publica orçamentos a cada dois anos, e o anterior havia sido anunciado antes que a profundidade da recessão se tornasse evidente. Agora, o novo orçamento precisa ser aprovado, e o Texas talvez tenha um rombo de US$ 25 bilhões a cobrir. Que fazer?

Dado o completo domínio da ideologia conservadora no Estado, aumentar impostos está fora de questão. Por isso, será necessário cortar gastos.

Mas Perry não estava mentindo sobre as "decisões duras e conservadoras". O Texas adotou linha de fato dura, para não dizer brutal, quanto aos seus mais vulneráveis cidadãos. Entre os Estados norte-americanos, o Texas está entre os piores em termos de gastos por aluno do sistema educacional, e tem a maior porcentagem nacional de moradores sem cobertura de saúde. É difícil imaginar o que acontecerá caso o Estado tente eliminar seu imenso deficit orçamentário puramente por meio de cortes de gastos.

Não sei como a confusão no Texas será resolvida. Mas os sinais não parecem bons, para o Estado ou para o país.
No momento, os conservadores triunfantes em Washington estão declarando que podem cortar impostos e ainda assim equilibrar o orçamento, por meio de cortes severos nas as despesas. Mas não conseguiram fazê-lo nem mesmo no Texas, que se dispõe a causar grandes sofrimentos aos seus cidadãos (devido à sovinice nos gastos estaduais com a saúde) e a prejudicar o futuro (ao investir pouco na educação). Como conseguirão fazê-lo em nível nacional, especialmente se os novos legisladores republicanos já declararam que não reduzirão os gastos com o programa de saúde Medicare, a previdência social e a defesa?

As pessoas costumavam dizer que o futuro chega primeiro à Califórnia, mas hoje em dia o que acontece no Texas provavelmente serve como um augúrio melhor. E o que estamos vendo no momento é um futuro que não funciona.

TRADUÇÃO DE PAULO MIGLIACCI

 

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