Investimento em tecnologia leva a expansão do trigo na Bahia

Área de cultivo do cereal mais do que dobrou em sete anos, mas preços caíram

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Ruan Amorim
Salvador (BA)

Apesar do clima seco e do calor, o trigo está crescendo no sertão brasileiro. No oeste baiano, agricultores apostam no cereal em campos onde antes havia soja, milho e algodão.

A primeira safra de trigo no estado, em 2015, tinha 3.000 hectares. Em 2022, esse número já era de 10 mil hectares, segundo dados da Aiba (Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia). Em porcentagem, o crescimento chegou a 235% em sete anos.

A expansão das fronteiras agrícolas dessa cultura e o bom desenvolvimento da commodity nas terras baianas são acompanhadas por tecnologias como o melhoramento genético de sementes, mecanização e técnicas de cultivo. Na cidade de Luís Eduardo Magalhães (BA), a lavoura de trigo cultivada pelo produtor Jarbas Bergamaschi é totalmente irrigada e adaptada para o clima do oeste do estado, que faz parte da Matopiba, região composta pelo cerrado de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia.

Lavoura de trigo da JCC (Companhia de Cultivos), em Barreiras (BA)
Lavoura de trigo da JCC (Companhia de Cultivos), em Barreiras (BA) - Divulgação

Foi em 2016 que Bergamaschi decidiu apostar no cereal no lugar do milho. Os resultados foram promissores, incentivando a continuidade do plantio. "O trigo é uma ferramenta de manejo que ajuda no controle de pragas, o que impulsiona a produtividade de outras culturas, como a soja e o próprio milho. Devido a sua palhada densa, as ervas daninhas têm dificuldade de se desenvolver", diz ele.

O cereal também acaba com os nematoides, praga muito comum no cerrado, que afeta a capacidade de absorção de nutrientes da planta, causa doenças e danifica as raízes. "Além disso, a cultura ajuda no controle de erosão, já que a palhada ajuda a absorver e filtrar bem a água", acrescenta Bergamaschi.

Com todas essas características, o trigo ganhou espaço na JCC (Companhia de Cultivos), que fica em Barreiras (BA), conta o diretor de produção, Raul Jacobsen.

"Neste ano, agora em outubro, colhemos a nossa terceira safra de trigo. Plantamos 460 hectares, o que eu ainda não considero que seja uma produtividade boa. A nossa produção tem uma média de 80 sacos por hectare, mas acreditamos que o ideal seja cem sacos por hectare. Estamos no processo de aprendizado ainda", afirma Jacobsen.

O impacto positivo do plantio da commodity na produção de soja, carro-chefe do grupo, já é percebido pelo diretor de produção.

Apesar da desvantagem do clima mais quente, contornada pelo melhoramento genético do trigo, a Bahia apresenta algumas vantagens para os produtores do estado.

Uma delas, de acordo com o produtor Leandro Kohn, é a falta de chuvas e geadas no inverno. As chuvas, quando acontecem em períodos em que a lavoura já está pronta para ser colhida, afeta a qualidade da cultura e, consequentemente o preço —o maior medo de quem trabalha com essa cultura na região Sul.

"Por isso, apesar de ser uma cultura típica de locais frios, o trigo se adaptou bem ao oeste da Bahia, impulsionado, claro, pelo melhoramento genético realizado pela Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) e entidades privadas", afirma Kohn.

A altitude do oeste da Bahia —entre 755 e 1.000 metros— é mais um ponto positivo para o cereal. Com esse nível, nos meses de maio, junho, julho e agosto, as temperaturas passam a ser mais amenas, por volta de 10ºC a 15ºC.

Segundo o pesquisador Embrapa Cerrados Julio Cesar Albrecht, o trigo do cerrado é colhido em um período de entressafra da produção no resto do Brasil. Com isso, o produtor consegue melhores preços na hora da comercialização. A boa qualidade da lavoura também é um diferencial.

"O cerrado produz um dos melhores trigos do mundo em termos de qualidade industrial para panificação. A genética e as condições climáticas favorecem a produção dos grãos com essa característica", explica Albrecht.

Hoje, produz-se trigo no cerrado do Brasil central em uma área de aproximadamente 300 mil hectares. E a região tem potencial para produzir aproximadamente 4 milhões de hectares.

Nesse patamar, dizem os produtores, a expectativa é que se encerre o ciclo de importações do cereal para suprir a demanda interna.

"O Brasil vai alcançar a autossuficiência em trigo com a ajuda da produção do cerrado. É uma questão de segurança alimentar", afirma Albrecht.

Neste ano, um grande desafio tem sido a comercialização. Segundo Kohn, não houve opção de contrato futuro. "Por isso, infelizmente, ficamos descobertos quanto ao custo que bateu a maior alta já vista na lavoura."

Ele conta que outro problema foi a brusone, doença causada por um fungo.

"Os custos de produção, que variam de produtor para produtor, chegaram a R$ 8.300 por hectare", afirma.

Além disso, os preços caíram, diante da alta oferta, porque muitos agricultores bateram recordes de colheita. "O preço do grão no ano passado era de R$ 140 por um saco de 60 quilos. Em 2023, está em R$ 70", diz Bergamaschi.

Esta reportagem foi produzida durante o Lab Tereos + Folha - 2º Programa de Jornalismo Especializado em Agroindústria Sustentável

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