Linha-dura e defensores de Cuba brigam por nova política de Trump

MICHAEL WEISSENSTEIN
MATTHEW LEE
DA ASSOCIATED PRESS, EM HAVANA

No passado, os melhores amigos de Cuba nos Estados Unidos eram alguns poucos esquerdistas e especialistas em política externa, que organizavam doações de ônibus escolares e computadores para a ilha governada por comunistas.

Depois de cinco meses de governo de Donald Trump, Cuba tem um novo conjunto de defensores nos Estados Unidos –uma coalizão de empresas de alta tecnologia, grupos de interesses agrícolas, companhias de viagens e jovens norte-americanos de origem cubana, e eles estão em ação por causa do anúncio iminente por Washington de uma nova política para Cuba.

Do lado oposto, a linha-dura da comunidade de exilados cubanos em Miami passou a ter linha direta para a Casa Branca, por conta de congressistas republicanos e funcionários da Casa Branca cujas origens estão na ilha.

O presidente Donald Trump planeja anunciar sua nova política na sexta-feira (16), em Miami, mas ainda não havia decidido todos os detalhes, de acordo com um funcionário da Casa Branca, que falou sob a condição de que seu nome não fosse mencionado, por estar discutindo deliberações internas.

A embaixada dos EUA em Havana continuará aberta, mas os norte-americanos podem esperar ações pelos departamentos de Estado, Tesouro e Segurança Interna para proibir o comércio norte-americano com qualquer entidade ligada às Forças Armadas cubanas.

Uma redução no número de categorias de viagem que dispensam licença do governo dos EUA para visitas a Cuba também está nos planos.

Os EUA exigirão mais acesso à internet para os cidadãos do país, a libertação de prisioneiros e o retorno de fugitivos norte-americanos radicados em Cuba. A revogação dos privilégios especiais de imigração para os cubanos ordenada pelo presidente Barack Obama não mudará, segundo a fonte.

"Se tivéssemos um ambiente político tradicional, estaríamos conseguindo muito sucesso", disse Colin Laverty, presidente de uma das grandes companhias de viagens que organizam excursões a Cuba e consultor de empresas norte-americanas que buscam negócios com os cubanos.

"Estamos certamente vencendo o debate na opinião pública e nos círculos de política externa, mas infelizmente a nova política deve vir de um acordo de bastidores entre o presidente e os membros de origem cubana do Congresso".

PRESSÃO CONTRA ABERTURA

As figuras mais proeminentes que continuam a buscar a reversão da política de abertura são o senador Marco Rubio e o deputado Mario Diaz-Balart, ambos descendentes de cubanos.

O governo Trump quer manter boas relações com ambos. Rubio é parte do comitê do Senado que investiga o relacionamento de Trump com a Rússia, e Diaz-Ballart é membro do poderoso Comitê de Alocações Orçamentárias da Câmara.

Laverty é uma das figuras mais proeminentes no novo lobby em favor de Cuba, que vem postando mensagens no Twitter e escrevendo cartas à Casa Branca em ritmo frenético, em um esforço de último minuto para convencer o governo Trump dos benefícios do relacionamento amistoso com Cuba, estabelecido pelo presidente Barack Obama em 17 de dezembro de 2014.

Um dos focos da campanha é preservar a redução decretada por Obama nas restrições de viagem a Cuba, que resultou em aumento de 300% no número de visitantes norte-americanos à ilha e despejou dezenas de milhões de dólares no setor cubano de hotelaria e turismo.

"Milhares de norte-americanos estão visitando Cuba e alimentando o mais rápido crescimento em seu setor privado desde 1959", escreveu o CubaOne, um grupo de jovens norte-americanos de origem cubana favorável à reaproximação, em carta aberta a Trump publicada na segunda-feira.

Depois de meses de silêncio público, o Airbnb na semana passada publicou um relatório sobre suas atividades em Cuba, que produziram US$ 40 milhões em faturamento para donos de pousadas privadas desde que o gigante online da hospedagem se tornou a primeira grande empresa dos EUA a investir em Cuba, logo depois do anúncio da reaproximação entre os dois países feito por Obama.

O Google, que instalou servidores na ilha para acelerar o serviço de Internet no país, no ano passado, pronunciou-se sobre o assunto pela primeira vez na segunda-feira, em favor de que as relações com Havana sejam preservadas.

"O Google desempenhou papel formativo no primeiro capítulo da história da conectividade em Cuba, mas isso é só o começo", disse Brett Perlmutter, diretor de estratégia e operações do Google Cuba, em entrevista em Miami na segunda-feira.

"Conectar Cuba vai requerer todo um ecossistema de participantes... também requererá que os Estados Unidos mantenham uma política que permita que empresas de telecomunicações trabalhem em Cuba."

PARCERIAS

Mesmo o governo cubano está entrando no jogo, com diplomatas importantes postando declarações em favor do engajamento no Twitter e correspondentes estrangeiros publicando uma série de entrevistas com funcionários do poderoso –e misterioso– Ministério do Interior sobre a nova cooperação entre EUA e Cuba em áreas como o tráfico de pessoas, contrabando de drogas e e perseguição a fugitivos.

Dois funcionários cubanos disseram à Associated Press que agora estão em contato regular com o FBI (polícia federal dos EUA), a DEA (Agência de Combate às Drogas) e outras agências policiais norte-americanas, trocando informações sobre investigações que abarquem as duas jurisdições.

"O estabelecimento de relações diretas entre as agências já mostrou resultados", disse o tenente-coronel Yoandris Gonzalez García, diretor da Polícia Nacional Cubana, à Associated Press.

"Voltar atrás agora seria mandar aos delinquentes e criminosos a mensagem indevida de que impunidade é possível", ele acrescentou.

Essas mensagens são recebidas com desdém por muitos membros da comunidade de exilados cubanos no sul da Flórida, que apelam pelo bloqueio de todos os recursos destinados a Cuba, com o objetivo de derrubar o governo comunista e levar à ilha o capitalismo e a democracia pluripartidária.

Embora a maioria dos norte-americanos apoie um relacionamento mais próximo com Cuba, os norte-americanos de ascendência cubana ainda podem influenciar a eleição dos 29 representantes da Flórida no colégio eleitoral, o que há muito lhes confere influência pesada sobre as políticas do governo dos EUA.

"Estamos confiantes em que o presidente tenha nos ouvido. Estamos confiantes em que ele dará um passo na direção certa", disse Marcell Felipe, presidente da Inspire America Foundation, uma organização hostil ao presidente Raúl Castro que vem veiculando comerciais em estações de rádio e TV de fala espanhola em Miami instando os norte-americanos de origem cubana a exigir de Trump uma política linha-dura.

"Para eles, a grande questão é por que temos uma conexão direta com a Casa Branca", disse Felipe. "Bem, é porque temos os votos".

Tradução de PAULO MIGLIACCI

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