Descrição de chapéu Rússia

Novo confronto na Síria opõe forças dos EUA a russos

Kremlin minimiza episódio, que pode ter envolvido mercenários

Igor Gielow
São Paulo
Dois homens com trajes militares camuflados e armados com metralhadoras observam quem chega atrás de uma rocha e barricadas montadas com sacos de areia
Rebeldes sírios apoiados pela Tuquia montam guardo perto de Afrin, no noroeste da Síria - Khalil Ashawi/Reuters

Um confronto no leste da Síria pode ter deixado dezenas de cidadãos russos mortos nas mãos de forças americanas e seus aliados rebeldes contrários ao regime do ditador Bashar al-Assad.

O Kremlin, evitando uma escalada na já elevada tensão na área, sugere que, se algum russo morreu, era mercenário a serviço de Damasco.

Esse novo episódio, ocorrido na semana passada mas só detalhado em relatos agora, mostra o quão volátil está a situação nessa segunda fase da guerra civil síria, após a destruição da base territorial do grupo EI (Estado Islâmico) que é inimigo comum de Moscou, presente em campo desde 2015, e de Washington, envolvida em 2014 no conflito iniciado em 2011.

Num espaço de dias, talvez o maior embate entre as duas antigas superpotências da Guerra Fria tenha ocorrido.

Mas não foi só isso. Israel bombardeou alvos iranianos em solo sírio após ter o primeiro caça abatido em décadas na região. E a Turquia, um membro da aliança militar liderada pelos americanos, segue em sua violenta campanha contra os curdos sírios apoiados pelos EUA.

O incidente que emergiu nesta terça (13) ocorreu no fim da semana passada. Entre quinta e sábado, forças de Assad que haviam tomado em novembro o último bastião do EI no leste do país, Deir al-Zour, aparentemente fizeram um ataque contra uma base no território controlado por rebeldes curdos e aliados árabes, a 8 km da cidade.

Só que a base é gerenciada e municiada pelos padrinhos dos rebeldes, Washington, e possui um número incerto de soldados americanos. Eles revidaram, segundo os relatos disponíveis, e mataram entre 100 e 200 atacantes. Desses, segundo depoimentos em redes sociais de familiares e ONGs, dezenas eram russos.

A Síria admite 25 feridos, todos soldados seus. Os americanos falam em 100 mortos sírios. Desde 2015, há coordenação mais ou menos bem-sucedida entre os países para evitar choques, mas o fato de que ambos apoiam forças opostas aumenta os riscos.

Há centenas de mercenários russos na Síria desde que Vladimir Putin ordenou a intervenção com poderio aéreo na guerra civil, salvando a ditadura aliada de Assad com auxílio de tropas irregulares sob ordens do Irã. Por isso, a conta oficial de baixas russas é mínima: 46 mortos.

A Rússia já anunciou três vezes a diminuição de seu efetivo na Síria, mas ao mesmo tempo está ampliando sua base aeronaval no oeste do país para aumentar seu poderio no Oriente Médio.

Busca influenciar a tentativa de estabilizar a convulsionada Líbia, aliada ao Egito, abriu canais com a Arábia Saudita e está sendo ouvida na renovada crise entre israelenses e palestinos.

O equilíbrio da aliança pontual entre Rússia, Irã e Turquia é bastante precário, ainda que a cooperação de Moscou com Teerã seja mais longeva e estabelecida, o que deverá dar a Putin voz ativa no embate entre o país persa e o Israel, com quem tem bastantes canais diplomáticos.

O custo-benefício para Putin lhe garantiu amplo apoio interno à operação, já que a Rússia foi recolocada no papel de potência mediadora na região. Isso ocorreu muito em razão da política titubeante dos EUA nos governos Barack Obama e Donald Trump.

O presidente russo, com aprovação em 80%, deve ser reeleito no mês que vem, mas sofre questionamentos.

O candidato liberal Grigori Iavlinski cobrou, na terça, que Moscou explique a natureza das operações de mercenários na Síria. Eles trabalham principalmente sob o guarda-chuva da corporação Wagner, equivalente à antiga Blackwater americana (hoje Academi), fornecendo veteranos e aventureiros armados para ações tanto a mando do Kremlin quanto de Assad.

A Turquia protestou contra a ação dos americanos no leste sírio. Em seu plano ideal, Ancara quer limpar a área que vai de sua fronteira até o Iraque, controlando os curdos de lá. O faz porque teme que um Curdistão autônomo ao lado da fronteira estimule ainda mais os seus curdos, aliás a maior população da etnia no mundo, com quem vive disputa há décadas.

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