Descrição de chapéu jornalismo

Entidade de jornalistas desmonta notícias falsas russas

StopFake foi criada após boato sobre crucificação de criança em conflito no leste da Ucrânia

Yurkova aparece ao lado do símbolo da conferência TED em versão 3D e fundo branco
Cofundadora do StopFake.org, Olga Yurkova realizou palestra na conferência TED em Vancouver - Glenn Chapman - 10.abr.18/AFP
Fernanda Ezabella
Vancouver (Canadá)

Em julho de 2014, auge do conflito na Ucrânia, o Exército entrou numa pequena cidade ao leste do país, reuniu a população na praça central e realizou a crucificação do filho de três anos de um militante separatista pró-Rússia.

Uma refugiada relatou o caso para uma emissora russa e a história tomou conta das redes sociais.

Só que era tudo mentira. Tratava-se de uma das primeiras fake news a serem desmascaradas pelo grupo StopFake, uma organização independente criada por jornalistas voluntários para enfrentar o bombardeio online de propaganda russa.

"A Ucrânia foi um laboratório de testes para ferramentas de notícias falsas, fomos as primeiras vítimas. Estes métodos foram depois usados em toda a Europa", disse à Folha Olga Iurkova, 36, uma das cofundadoras que apresentou o projeto no TED 2018, evento de palestras que se encerrou neste sábado (14) em Vancouver, no Canadá.

"No começo, achava que o site ia existir por três meses e resolveríamos o assunto. Meu sonho é que ele não seja mais necessário", continuou Iurkova, que hoje também lidera a cobertura num jornal local sobre a região de Donbass, ainda pertencente à Ucrânia, e a Crimeia, anexada pela Rússia em 2014.

Em quatro anos, o StopFake descobriu cerca de 1.500 notícias falsas, incluindo fotos e vídeos. O site publica entre duas por dia ou uma por semana, dependendo do grau de dificuldade. "As fake news estão ficando cada vez mais sofisticadas", disse.

O site publicado em 11 línguas (ainda sem português) não tem escritório próprio e os cerca de 30 jornalistas se encontram virtualmente. Nas reuniões diárias, em vez de sugerir reportagens para escrever, eles sugerem textos que querem desmascarar.

O foco é na imprensa russa, e não em criações apócrifas. As mentiras com maior alcance e sobre assuntos importantes ganham mais atenção. Muitas vezes o trabalho é puramente investigativo, checando placas de carro, endereços, documentos do governo ou simplesmente buscando no Google a qualificação de "especialistas".

NARRATIVAS

"Identificamos 18 narrativas criadas usando notícias falsas, como Ucrânia sendo um Estado fascista ou um Estado falido ou um Estado liderado por um presidente que chegou ao poder com um golpe de Estado", disse Iurkova em seu discurso. "Nós provamos que não é jornalismo ruim. É um ato deliberado de desinformação."

O site traz explicações e ferramentas para verificar imagens e afirma já ter treinado mais de 10 mil pessoas, entre jornalistas e professores escolares e universitários.

Em 2017, o país foi palco da edição do concurso musical Eurovisão, festival que reúne 43 países, alvo de inúmeras reportagens falsas.

"Era a chance de o país mostrar que está bem, que não somos fascistas ou nazistas. Mas a propaganda russa foi forte", afirma a jornalista Olga, cujo próprio pai é devorador de fake news. "Tento explicar sempre para ele. A população mais velha é um grande problema."

Tópicos relacionados

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.