Descrição de chapéu Em 1968

Mundo em 1968: protesto contra governo do México acaba em massacre

Episódio na praça de Tlatelolco, na capital mexicana, ocorre a dez dias do início da Olimpíada

López aparece posando para a foto apenas de cueca e com o resto de suas roupas destruídas. Além de sangramento na boca ele tem hematomas em outras partes do corpo.
O estudante Florencio López Osuna é fotografado após ser espancado pela polícia mexicana após manifestação em Tlatelolco - 2.out.68/Proceso/Associated Press
2 de outubro de 1968

Pouco mais de 10 mil pessoas participavam de uma manifestação pacífica contra o governo de Gustavo Díaz Ordaz na região central da Cidade do México, no final da tarde deste dia 2 de outubro. 

Liderado por estudantes, o protesto na praça das Três Culturas, também conhecida como Tlatelolco1, reunia ainda professores e operários, além de famílias.


1) Tlatelolco foi uma tribo asteca, que vivia em parte da área onde hoje está a Cidade do México. Foi dizimada pelas tropas do conquistador espanhol Hernán Cortés em 1521


Durante o discurso de um líder estudantil, dois helicópteros sobrevoaram a manifestação, emitindo uma luz verde. O sinal estava aberto, pareciam indicar as aeronaves. 

Atiradores localizados em um prédio vizinho à praça abriram fogo contra o público. Enquanto corpos caíam ao chão, os demais participantes do ato, desesperados, tentavam deixar o local, mas poucos conseguiram escapar.

Não bastassem as muralhas de um complexo de ruínas astecas no entorno da praça, bloqueios organizados por policiais impediam a fuga dos manifestantes. Alguns tentaram se proteger dos tiros entrando na histórica igreja de Santiago (construída pelos espanhóis no século 16), mas as portas estavam fechadas. 

De acordo com as fontes oficiais, foram cerca de duas dezenas de mortos. Os estudantes, por sua vez, indicaram centenas de mortos e mais de mil feridos. Considerando os cadáveres amontoados pelas ruas da área central da capital mexicana, os números anunciados pelos jovens opositores do governo Díaz Ordaz parecem mais factíveis2.


2) Até hoje, não há um número definitivo de mortos. Mas a maioria das fontes indicam entre 200 e 300


A jornalista italiana Oriana Fallaci, que cobria o protesto para a revista L'Europeo, foi atingida com três tiros3.


3) A jornalista foi tida como morta e deixada junto com cadáveres. Depois, hospitalizada, ela escreveu o relato para a revista. Experiente correspondente de guerra, disse à época que Tlatelolco foi o pior massacre testemunhado por ela


Os policiais chegaram a invadir casas próximas de Tlatelolco para prender manifestantes que tinham escapado do cerco organizado pelas forças de segurança.

Quatro corpos de homens aparecem em um chão de piso frio: dois enfileirados em cima e outros dois embaixo
Manifestantes mortos no Massacre de Tlatelolco no dia seguinte ao ataque militar no necrotério da Cidade do México - 2.out.68/El Universal/Reuters

O episódio acontece a dez dias da abertura da Olimpíada da Cidade do México. 

Díaz Ordaz se preocupa em mostrar ao mundo que o seu país está preparado para um evento desse porte, o que implica, entre outras medidas, manter os grupos antigoverno sob severo controle. O presidente disse recentemente que tomaria todas as ações necessárias para evitar a perda de prestígio do México. 

Os opositores acusam o mandatário de linha conservadora pelo massacre em Tlatelolco. Dizem que, depois de uma série de protestos nas últimas semanas, o presidente resolveu reagir com ainda mais truculência.

O governo negou responsabilidade pelo massacre4.


4) Três décadas depois, documentos mostraram que os atiradores eram membros de um batalhão sob comando direto do presidente Díaz Ordaz


Eleito em 1964, Díaz Ordaz, do PRI (Partido Revolucionário Institucional), passou a ter a legitimidade do seu governo questionada em meados de seu quarto ano de mandato.

A inquietação popular cresceu a partir de um episódio aparentemente prosaico. No dia 22 de julho, houve uma briga entre integrantes de duas escolas secundaristas rivais da Cidade do México. 

Um dia depois, aconteceu uma nova confusão, desta vez envolvendo estudantes e membros de gangues, seguida de uma reação excessiva da polícia. Alguns alunos e professores foram espancados por mais de três horas.

As manifestações ganharam força nas semanas posteriores. Os protestos se voltavam principalmente contra a violência policial, mas os estudantes também gritavam contra o comportamento da imprensa, muito alinhada ao PRI, e pediam mais autonomia para as universidades e liberdade para os colegas presos nas últimas semanas. 

Os jovens mexicanos também têm sido influenciados pelas insurreições estudantis recentes em outros países, como a França e os EUA.

A brutalidade das forças do governo vem aumentando a cada dia. Em 18 de setembro, o Exército cercou o campus da Universidade Nacional Autônoma do México (Unam), a maior do país. 

Na ocasião, estudantes e professores estiveram sob a mira de baionetas dos soldados, e mais de mil pessoas foram presas. O reitor da Unam pediu demissão. 

Cinco dias depois, policiais invadiram a Escola Politécnica, e os universitários reagiram com pauladas. O Exército interveio e disparou tiros contra os estudantes. Cerca de 40 pessoas ficaram feridas.

Nos dias seguintes, cresceu o apoio da população às causas estudantis, o que resultou em mais gente nos protestos pelas ruas da Cidade do México. 

Com esse episódio sangrento de 2 de outubro, em Tlatelolco, a tensão definitivamente dá lugar à tragédia. 

 

Livros sobre o massacre

La Noche de Tlatelolco
Autora: Elena Poniatowska. Editora: Era. Quanto: R$ 158 (saraiva.com.br). 324 págs. Em espanhol

68: El Otoño Mexicano de la Masacre de Tlatelolco
Autor: Paco Ignacio Taibo. Editora: Siete Cuentos. Quanto:  R$ 68,75 (amazon.com). 136 págs. Em espanhol

De Tlatelolco a Ayotzinapa - Las Violencias del Estado
Autor: Sergio Aguayo. Editora: Ink. Quanto: R$ 14,90 (e-book em amazon.com). Em espanhol

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