Contaminação por chumbo trava reconstrução de Notre-Dame

Grupos alertam para problema no entorno da catedral de Paris, que ainda corre risco de desabamento

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Paris

Os trabalhos de reconstrução da catedral Notre-Dame, em Paris, parcialmente destruída por um incêndio em abril deste ano, serão retomados a partir da próxima segunda (19).

O governo francês disse na quarta (14) que é preciso acelerá-los, pois o prédio corre o risco de desabar –pedras soltaram-se do teto na última onda de calor a atingir o país, no fim de julho.

O canteiro foi fechado em 25 de julho, depois de autoridades locais reconhecerem lacunas nas medidas para evitar a contaminação de pessoas que trabalham no edifício ou nas redondezas por partículas de chumbo.

Funcionários instalam tapumes para isolar a área da catedral para descontaminação 
Funcionários instalam tapumes para isolar a área da catedral para descontaminação  - Bertrand Guay - 13.ago.19/AFP

Avalia-se que o fogo que consumiu o telhado e a torre fina conhecida como flecha tenha liberado no ar o equivalente a 400 toneladas de chumbo. A inalação ou ingestão do metal (pelo contato com objetos/alimentos em que ele se deposita) pode causar perturbações digestivas, renais e até neurológicas.

Crianças são especialmente vulneráveis ao contato com a substância. Por isso, uma escola e uma creche dos arredores da igreja onde estavam funcionando colônias de férias (o ano letivo começa em setembro) tiveram suas atividades suspensas.

No pátio que elas compartilham, medições apontaram uma concentração de chumbo muito superior ao tolerável. Esta e outras áreas comuns de instituições de ensino localizadas no miolo de Paris são alvos de uma operação de limpeza que inclui jatos d’água superpotentes e géis aos quais a poeira plúmbea adere.

Os tetos fixados pela Agência Regional de Saúde são de 70 microgramas/m² dentro de escolas, 1.000 microgramas/m² em pátios e 5.000 microgramas/m² nas ruas. A prefeitura da capital disse não ter detectado níveis exorbitantes de presença do metal em um raio de 500 metros em torno da catedral –as escolas ficam fora desse perímetro.

“Não há nenhum perigo”, disse um dos vice-prefeitos, Emmanuel Grégoire, na semana passada.

Mas um grupo de associações e sindicatos contesta o diagnóstico. No último dia 5, eles convocaram a imprensa para mostrar que, de 51 amostras recolhidas entre o fim de abril e meados de julho em uma esquina ao lado de Notre-Dame, 31 vieram acima do patamar de contaminação aceito.

A mais de um quilômetro dali, no jardim do Luxemburgo, outro endereço muito visitado da cidade, também havia muito mais chumbo do que o aceito.

O coletivo, que acusa a prefeitura de negligência, pede a realização de medições periódicas enquanto as obras estiverem em curso e a criação de um centro de referência para pessoas expostas à poeira tóxica, com médicos e psicólogos.

A principal demanda das associações, no entanto, já foi descartada pelo governo municipal, por causa de seu custo: o isolamento integral do canteiro –ou seja, a instalação de uma cobertura sobre a catedral.

Dentro da “redoma”, operários usariam uniformes especiais, espessos. Antes de sair de lá, passariam por cápsulas de descontaminação.

Esse protocolo de acesso à obra será implantado, segundo a prefeitura, que havia previsto originalmente uma suspensão curta dos trabalhos, de apenas uma semana.

A reabertura foi em seguida adiada para o dia 15 de agosto e, agora, para a semana do 19, enquanto prossegue a limpeza da île de la Cité, onde fica a igreja. A concentração de metal na esplanada em frente ao templo, ponto preferido de turistas para selfies, ainda preocupa as autoridades.

Pouco após o incêndio, o presidente francês, Emmanuel Macron, anunciou a intenção de reabrir o monumento, visitado anualmente por 13 milhões de pessoas (ou seja, mais de 30 mil por dia, em média), em até cinco anos. O prazo, contestado por especialistas, permitiria uma reinauguração a tempo da Olimpíada de 2024, que será realizada em Paris.

Além da pressa presidencial, outros pontos sensíveis ligados à obra são os contornos que deve assumir a nova catedral (idêntica à parcialmente destruída ou modernosa, como sinalizou preferir Macron?) e o financiamento do canteiro mastodôntico.

As doações prometidas por particulares ultrapassaram 1 bilhão de euros (R$ 4,5 bilhões), mas muitos veem oportunismo na generosidade de grandes corporações, de olho na vitrine midiática e em deduções fiscais.

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