Descrição de chapéu Diplomacia Brasileira

Lideranças judaicas exigem desculpas de Ernesto por analogia com campos de concentração

Em blog, chanceler comparou isolamento social para conter coronavírus a centros nazistas

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Bauru

O Comitê Judeu Americano exigiu um pedido de desculpas do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, depois que o brasileiro comparou o isolamento social para conter o coronavírus aos campos de concentração nazistas que mataram milhões de judeus.

"Essa analogia usada por Ernesto Araújo é profundamente ofensiva e totalmente inapropriada. Ele deve se desculpar imediatamente", escreveu o Comitê no Twitter, nesta terça-feira (28).

A analogia foi feita no dia 22, quando o chanceler brasileiro publicou um texto em seu blog pessoal criticando um livro escrito pelo filósofo e psicanalista esloveno Slavoj Zizek.

Sob o pretexto de uma afirmação de Zizek, segundo a qual os nazistas fizeram um "péssimo uso" do lema "o trabalho liberta", gravado em alemão na porta do campo de concentração em Auschwitz, Ernesto escreveu: "Os comunistas não repetirão o erro dos nazistas e desta vez farão o uso correto. Como? Talvez convencendo as pessoas de que é pelo seu próprio bem que elas estarão presas nesse campo de concentração, desprovidas de dignidade e liberdade".

Ernesto Araújo, ministro das Relações Exteriores, durante seminário em Brasília - Adriano Machado - 21.nov.19 / Reuters

A declaração também foi repudiada por outras associações da comunidade judaica.

Em nota, o Instituto Brasil-Israel disse à Folha que, ao colocar os campos de concentração nesses termos, Ernesto "anula e relativiza a memória do Holocausto. E ainda pior, acaba por reproduzir a lógica nazista: transformar os campos da morte em fábricas do esquecimento".

"Impressiona o uso excessivo e absurdo que membros do atual governo brasileiro fazem do nazismo e do Holocausto. Desde as afirmações do atual presidente de que o nazismo seria de esquerda (feitas em frente ao Museu do Holocausto, em Jerusalém) até a reprodução do discurso do ministro da propaganda nazista pelo ex-secretário especial de cultura, os absurdos se multiplicam", diz a nota do Instituto.

A Confederação Israelita do Brasil repudiou o comentário do chanceler.

"Não há comparação possível entre uma medida sanitária, adotada em todo o mundo para combater uma pandemia, a uma ação persecutória e racista contra uma minoria inocente, que culminou com o extermínio de 6 milhões de judeus na Europa. Esperamos uma retratação imediata", diz a nota da Conib, publicada nesta quarta-feira (29).

Em entrevista ao jornal israelense The Times of Israel, o brasileiro Ariel Krok, membro do comitê diretor do Corpo Diplomático Judaico do Congresso Judaico Mundial, disse que a declaração de Ernesto "é de mau gosto, perigosa e demonstra completa ignorância do assunto".

"A comparação bizarra é um claro exemplo da trivialização do que os campos de concentração foram, em que tantas vidas foram tomadas e que causaram tanto sofrimento."

Em carta aberta ao chanceler, o grupo Juventude Judaica Organizada diz que a comparação "não só foi infeliz como desrespeitosa".

"Ao fazer esse tipo de comparação, vossa Excelência e todos aqueles que insistem em fazer esse tipo de analogia, não só utilizam de maneira grosseira uma barbárie sem precedentes como também desrespeitam a memória de mais de SEIS milhões de judeus e suas famílias", diz o texto.

O grupo também pediu que o ministro se desculpe publicamente, afirmando que essa é a condição para que possa manter a "confiança no bom senso e respeito do Itamaraty, que é a parte do governo que mais se aproximou de nossa comunidade e de Israel na história do Brasil".

Em resposta à declaração de Ernesto, segundo o qual "o nazista é um comunista que não se deu ao trabalho de enganar as suas vítimas", o grupo Judeus pela Democracia, que reúne judeus de esquerda no Brasil, escreveu uma nota de repúdio em sua página no Facebook.

"Equiparar nazismo e comunismo é um dos revisionismos históricos mais perigosos da atualidade. O regime nazista foi de extrema direita em toda a sua essência. Comparar isso com os erros do comunismo é um absurdo", diz a publicação.

Em 2019, durante visita a Jerusalém, o ministro afirmou que uma nova vertente de pesquisadores vê semelhanças entre o movimento nazista e a extrema esquerda e sugeriu que as pessoas “estudem” e “leiam a história de uma perspectiva mais profunda”.

No mesmo dia, o chanceler visitou, junto com o presidente Jair Bolsonaro, o Museu do Holocausto, que atribuiu a criação do Partido Nazista a "grupos radicais de direita na Alemanha".

Em seu texto, Ernesto afirma, entre outras teorias da conspiração, que a pandemia de coronavírus faz parte de um "projeto globalista" que é um "novo caminho" e um "estágio preparatório ao comunismo".

De acordo com o chanceler brasileiro, o "comunavírus", "vírus ideológico" que se sobrepõe ao coronavírus, faz "despertar para o pesadelo comunista".

Ele também questiona entidades internacionais como a Organização Mundial da Saúde (OMS).

Para o ministro, "transferir poderes" à OMS esperando que ela seja mais "eficiente para lidar com os problemas do que os países agindo individualmente" é um pretexto "jamais comprovado" e "o primeiro passo na construção da solidariedade comunista planetária".

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