Grande incêndio atinge Beirute na área atingida por megaexplosão há 1 mês

Fogo de causas ainda desconhecidas começou na zona portuária da cidade; não há relatos de vítimas

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Beirute | Reuters

Um depósito de óleo e pneus no porto de Beirute pegou fogo nesta quinta-feira (10), pouco mais de um mês depois da megaexplosão que devastou mais da metade da capital libanesa.

De acordo com as primeiras informações, o incêndio começou na zona portuária e criou uma enorme coluna de fumaça sobre a cidade, mas não há relato de feridos.

O Exército libanês informou que seriam usados helicópteros para ajudar a extinguir as chamas. Ainda não se sabe o que pode ter iniciado o fogo, mas a ministra interina da Justiça, Marie-Claude Najm, determinou a abertura de uma investigação envolvendo as principais agências de segurança do país.

Bombeiros tentam conter as chamas de incêndio na zona portuária de Beirute, mesma área em que uma megaexplosão ocorreu há um mês
Bombeiros tentam conter as chamas de incêndio na zona portuária de Beirute, mesma área em que uma megaexplosão ocorreu há um mês - Anwar Amro/AFP

O presidente libanês, Michel Aoun, afirmou que o incêndio pode ter sido "um ato intencional de sabotagem ou o resultado de um erro técnico, ignorância ou negligência".

"Em todos os casos, a causa deve ser conhecida o mais rápido possível e os perpetradores, responsabilizados", disse em publicação no Twitter da Presidência.

Segundo o gerente interino do porto, Bassem El-Kaissi, as chamas começaram em um armazém de uma empresa privada que importava óleo de cozinha. De lá, o fogo se espalhou para um depósito de pneus. "É por isso que você vê as grandes nuvens pretas", disse ele ao jornal americano The New York Times.

Segundo El-Kaissi, o incêndio se concentrou em uma área onde empresas armazenam mercadorias importadas que ainda não foram liberadas pela alfândega. Como toda a zona portuária, a área foi gravemente danificada pela explosão ocorrida há cinco semanas.

Segundo a Cruz Vermelha, o incêndio atingiu também um galpão que armazenava alimentos para ajuda humanitária.

Emissoras libanesas mostraram bombeiros tentando apagar o incêndio no porto, e a imprensa local informou que o Exército chegou a evacuar pessoas nas proximidades. Em entrevista ao The Independent, Michel el-Murr, chefe da equipe de busca e resgate do corpo de bombeiros, disse que as autoridades precisaram pedir reforços.

“Não sabemos exatamente o que está queimando, estamos tentando apagar o fogo, mas é muito grande, precisamos de uma mistura de água e espuma”, afirmou.

O chefe da defesa civil, em entrevista à emissora libanesa AlJadeed, pediu aos moradores que ficassem calmos e disse que o fogo foi contido em um único lugar. De acordo com imagens feitas no local, o fogo está limitado à estrutura de um prédio danificado pelo explosão do mês passado.

Michel Najjar, ministro interino de obras públicas, disse à imprensa local que o incêndio foi controlado, e que os indícios sugerem que o incêndio começou durante uma série de obras de reconstrução do porto.

Embora não haja relato de mortos ou feridos nesta quinta, a dimensão das chamas e da coluna de fumaça, que pode ser vista a quilômetros de distância, deixou os moradores de Beirute em pânico.

“Estou dizendo a mim mesmo que nada vai acontecer e que provavelmente não se trata de grande coisa, mas não dá para você lutar contra a ansiedade de abrir todas as janelas, sentar em um corredor ou ficar nervoso o tempo todo. As pessoas ligam pedindo que você deixe a área”, disse Feras Abdallah, 27, um arquiteto cujos carro e apartamento foram destruídos na explosão de 4 de agosto.

Majed Hassanein, 49, estava levando a esposa e dois filhos de carro para fora da cidade. "Sou forçado a tirá-los de Beirute, da fumaça e do incêndio que está acontecendo no porto novamente", disse ele.

George Kettaneh, chefe da Cruz Vermelha do Líbano, disse que não há risco de uma nova explosão e que, embora não haja feridos, algumas pessoas mais próximas da zona portuária estão sofrendo de falta de ar.

"Está ficando cada vez mais difícil respirar, está literalmente chovendo cinzas", escreveu um usuário no Twitter. Nas redes sociais, libaneses que ainda se recuperam da explosão anterior expressam sua preocupação de que outro grande desastre esteja em curso.

"Eu simplesmente não consigo entender como um incêndio dessa escala é possível no porto", escreveu Aya Majzoub, da ONG Human Rights Watch. "As autoridades não garantiram que todo material fosse armazenado com segurança depois que a negligência destruiu metade da cidade?"

Algumas equipes de bombeiros que trabalham no local ainda trazem nas viaturas as fotos de dez de seus colegas que morreram enquanto tentavam conter o incêndio que precedeu a explosão do mês passado.

"Outro grande incêndio no porto de Beirute. Abrimos todas as janelas para nos proteger de outra explosão ou fechamos para nos proteger dos gases tóxicos?", questiona outra libanesa. "O céu está preto e meus pulmões doem. Meu coração também."

Pelo menos 190 pessoas morreram na tragédia em 4 de agosto, que também deixou mais de 6.000 feridos e 300 mil desabrigados. A causa foi um incêndio em um depósito que armazenava 2.750 toneladas de nitrato de amônio, um composto químico usado para a produção de fertilizantes e de explosivos.

Um conselho judicial que investiga a explosão deteve 25 pessoas, incluindo funcionários do porto, da alfândega e do setor de segurança.

​Após a explosão, o Líbano enfrentou protestos contra o governo do primeiro-ministro Hassan Diab, que, dias depois, anunciou a renúncia coletiva de seu gabinete e prometeu novas eleições.

Os manifestantes também pediram a saída do presidente Michel Aoun após a revelação de que o político fora alertado do risco que o nitrato de amônio representava para Beirute duas semanas antes da tragédia.

Em 31 de agosto, Aoun nomeou um novo primeiro-ministro, o embaixador Mustapha Adib, que foi eleito pelo Parlamento após um acordo mediado pelo presidente francês, Emmanuel Macron.
Adib é o terceiro nome a assumir o cargo em menos de um ano. Antes da renúncia de Diab, Saad Hariri também deixou a posição em outubro de 2019 dizendo ter chegado a um "beco sem saída" depois de um levante que ficou conhecido como "revolução do WhatsApp".
O novo primeiro-ministro prometeu reformas imediatas para garantir um acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI).
Para os libaneses e boa parte da comunidade internacional, a elite política do Líbano é responsável não apenas por negligenciar os fatores que provocaram a explosão, mas pela má condução do país no pior momento de sua história recente.
O país ainda sente reflexos da Guerra Civil (1975-1990) e vive um clima de tensões entre os diferentes grupos étnicos e religiosos, embora o sistema confessional libanês dê a cada um direitos políticos específicos.
Em manifestações nas ruas e nas redes sociais, a população demonstra não acreditar na classe política do Líbano e chega a pedir interferência externa, como a do presidente francês.
O país pode se recuperar da tragédia ocorrida em agosto e de situações como o incêndio desta quinta, mas a mistura de luto, raiva, indignação e descrença da população dá indícios de que o Líbano ainda terá muitos outros desafios pela frente.
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