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Europa quer incluir mulheres e pessoas com deficiência em sua equipe de astronautas

Não é preciso ser super-homem ou supermulher para ir ao espaço, diz recrutadora

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Bruxelas | The New York Times

Numa oportunidade rara para europeus que sonham em deixar para trás os deveres mundanos da vida na Terra, a Agência Espacial Europeia (ESA) está recrutando novos astronautas pela primeira vez em mais de uma década, de olho no aumento da diversidade.

Dos sete astronautas da agência hoje prontos para serem enviados em missões à Estação Espacial Internacional (EEI), apenas a italiana Samantha Cristoforetti, 43, é mulher.

Mas agora a ESA está incentivando mulheres a candidatar-se às duas dúzias de novas vagas. E está lançando um esforço para permitir que pessoas com deficiências viajem para o espaço, dentro de um programa intitulado “Projeto de Viabilidade de Parastronautas”.

A astronauta italiana Samantha Cristoforetti, na Estação Espacial Internacional, em 2015 - Nasa/The New York Times

“Não é preciso ser super-homem ou supermulher”, disse em entrevista a diretora de recrutamento da agência, Lucy van der Tas. “Queremos motivar o maior número possível de pessoas a se candidatarem. Mas, em última análise, estamos à procura de candidatos muito específicos.”

A meta é selecionar quatro a seis astronautas, além de cerca de 20 suplentes, que pudessem participar de missões mais curtas. Recrutas com deficiências ingressariam primeiro no grupo dos suplentes e trabalhariam com a agência para identificar quaisquer modificações necessárias para que pudessem ir ao espaço.

“Pensamos realmente que, se não começarmos agora, isso nunca vai acontecer”, disse Van ter Tas. “Estamos abrindo a porta a certa parte da sociedade para que também seus integrantes possam sonhar em tornar-se astronautas.”

Não existe no momento uma garantia de que um astronauta com deficiência possa ir ao espaço.

O candidato que for aceito não será “um turista espacial que por acaso também é portador de uma deficiência”, disse David Parker, diretor do programa de robótica e voos espaciais da ESA. Van der Tas explicou que os recrutas precisarão ter as habilidades motoras necessárias para poderem trabalhar e sair da estação espacial sem ajuda em situações de emergência.

Dado que a vida na estação espacial se assemelha a um confinamento constante, os recrutas também precisam enxergar e ouvir. “A partir do momento em que todos os astronautas estiverem encerrados juntos em um espaço pequeno, a única maneira que conseguirão se comunicar com qualquer outra pessoa é através de uma tela”, disse Van der Tas.

O processo de seleção de astronautas leva 18 meses e inclui testes psicológicos, exames médicos, exames psicométricos e entrevistas.

Os poucos selecionados finais vão participar de missões à Estação Espacial Internacional ou, no mais longo prazo, até a Lua ou mesmo a Marte. Antes disso, contudo, terão que passar por vários anos de treinamento árduo que incluem aprender habilidades de sobrevivência, como operar a nave espacial, adquirir domínio da língua russa e passar até oito horas debaixo d’água simulando condições de ausência de peso.

Os candidatos precisam possuir algumas qualificações mínimas, disse a ESA, incluindo um mestrado em ciências naturais, medicina, engenharia, matemática ou ciência da computação, ou uma licença de piloto de testes, além de um mínimo de três anos de experiência de trabalho relevante.

Os candidatos precisam demonstrar que serão capazes de lidar com os desafios diversos das viagens espaciais. O dia a dia numa estação espacial envolve fazer a higiene pessoal com lenços umedecidos em vez de chuveiradas, esforço físico árduo, refeições compostas de comida desidratada e embalada e ausência contínua de gravidade, que transforma atividades cotidianas como dormir e urinar.

Os astronautas também precisam se dispor a participar de experimentos de ciências da vida. Uma de suas principais tarefas consiste em descobrir qual é o efeito do espaço sobre o corpo humano.

“O espaço é um ambiente bastante hostil aos humanos”, explicou Jennifer Ngo-Anh, coordenadora do programa de pesquisas e cargas da ESA. “Há altos níveis de radiação, as tripulações vivem de modo autônomo em naves confinadas e confinantes e são expostas à gravidade zero, que desencadeia adaptações corporais marcantes.”

Entre as consequências físicas temporárias de uma estadia longa no espaço estão a perda de massa muscular, massa óssea, força física e volume sanguíneo.

“O astronauta precisa ser uma pessoa versátil”, disse van der Tas. “Não precisa ser o melhor em nada, mas precisa ser bom em muitas coisas.”

Até agora, 90% de todos os astronautas foram homens. A Agência Espacial Europeia só enviou duas mulheres ao espaço: Samantha Cristoforetti e Claudie Haigneré, que participou de duas missões, em 1996 e 2001.

Durante o último recrutamento conduzido pela agência, em 2008, apenas 16% dos 8.000 candidatos foram mulheres.

Van der Tas explicou que recrutar mais mulheres traz benefícios científicos. “O espaço nos afeta de modos muito diferentes, dependentes de idade, gênero e etnia”, ela disse. “O pool mundial de astronautas é muito pequeno, por isso precisamos diversificá-lo o máximo possível.”

Para tentar incentivar mais mulheres jovens a seguir carreira científica, em 2019 chegou a ser lançada uma boneca Barbie inspirada em Cristoforetti. A astronauta italiana acaba de iniciar o treinamento para outra missão, que geralmente leva cerca de dois anos. Quando ela partir, deixará para trás sua filha, que hoje tem 4 anos.

E então ela poderá enfrentar alguns dos desafios destacados em um filme recente, “Proxima”, que conta a história de uma astrofísica francesa, mãe celibatária de uma filha pequena, que se prepara para uma missão de um ano no espaço.

Cristoforetti teve um encontro com a atriz principal do filme, Eva Green, e a diretora, Alice Winococour. Esta disse que quer que o filme seja “o mais próximo possível da realidade”.

“É raro o cinema mostrar mulheres como mães e super-heroínas também”, disse a diretora. “É hora de as mulheres pensarem que podem ser astronautas e mães ao mesmo tempo.”

Tradução de Clara Allain

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