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Tropas do Tigré tomam Lalibela, patrimônio cultural da humanidade

Conflito no norte da Etiópia tem se espalhado por outras regiões

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Adis Abeba | Reuters

Tropas da região do Tigré assumiram o controle da cidade de Lalibela, patrimônio cultural da Unesco onde ficam as famosas igrejas esculpidas na rocha, levando à fuga de moradores, de acordo com o relato de testemunhas à agência de notícias Reuters nesta quinta-feira (5).

Igreja Bet Medhane Alem, esculpida em pedra, em Lalibela, cidade patrimônio cultural da Unesco
Igreja Bet Medhane Alem, esculpida em pedra, em Lalibela, cidade patrimônio cultural da Unesco - Flora Bagenal - 23.abr.11/Reuters

A tomada da cidade é mais um desdobramento do conflito na região do Tigré, que começou em novembro, quando o primeiro-ministro etíope, Abiy Ahmed Ali, iniciou uma ofensiva militar contra a Frente de Libertação dos Povos do Tigré (FLPT), partido nacionalista que governa a região. Ele justificou a medida acusando as tropas adversárias de atacar uma base militar do governo para roubar armas e outros equipamentos.

Por trás do argumento estão, na verdade, disputas étnicas históricas no país, uma vez que o atual premiê —o primeiro da etnia omora a assumir o poder— vem sendo acusado de perseguir os tigrínios, que governaram a Etiópia por três décadas. Abiy assumiu o posto em 2018 com o discurso de privilegiar o sentimento nacional em detrimento das divisões, algo posto em xeque com o conflito.

No fim de novembro, o governo chegou a declarar vitória após assumir o controle da capital regional, Mekele. A FLPT, no entanto, retomou a cidade no fim de junho, após uma escalada de tensões no conflito. Já nas últimas semanas, os combates se espalharam para Amhara e Afar, também no norte do país.

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Seyfu, morador de Lalibela que falou com a Reuters por telefone, relatou que centenas de homens armados falando o idioma da região do Tigré —e não amárico, língua oficial do país— circulavam pela cidade nesta quinta, usando uniformes diferentes dos militares do Exército oficial.

Segundo o etíope, as tropas da região de Amhara, onde fica a cidade e que são aliadas ao governo de Adis Abeba, fugiram na noite desta quarta (4). “Pedimos a eles que ficassem ou ao menos nos dessem suas Kalashnikovs [fuzis russos], mas eles recusaram e partiram levando cinco ambulâncias e vários carros e caminhões”, relatou Seyfu. “Eles mataram com um tiro um amigo meu que implorava que ficassem para proteger os civis.”

Um outro homem, Dawit, disse à Reuters por telefone que deixou Lalibela na manhã desta quinta, enquanto as forças do Tigré chegavam à região. “Tivemos que ir a pé.” Já Daniel, também morador da cidade, afirmou ter visto centenas de soldados chegando à cidade por volta do meio-dia. Ele disse que fugiu para as montanhas nos arredores e que apenas mulheres e crianças foram deixadas no local.

A Reuters não conseguiu confirmar com as autoridades a informação fornecida pelos moradores. Porta-vozes do primeiro-ministro, dos militares e da força-tarefa do governo no Tigré não responderam aos pedidos de entrevista. Um representante das tropas do Tiré também não conseguiu ser encontrado para confirmar a tomada de Lalibela.

O vice-presidente da região de Amhara, Fanta Mandefro, disse que não tinha informação sobre a situação na cidade, que é também um local sagrado para cristãos ortodoxos do país e atrai muitos turistas por suas igrejas monolíticas dos séculos 12 e 13. O número de visitantes, no entanto, despencou com o início do conflito no fim do ano passado.

Altos funcionários da ONU e dos EUA que visitaram a Etiópia nesta semana chamaram a atenção para o crescimento da guerra no Tigré para outras regiões do norte do país. O porta-voz do Departamento de Estado americano, Ned Price, pediu nesta quinta que as forças rebeldes respeitam a herança cultural da cidade, à medida que cresce a preocupação em Washington do aumento do conflito.

De acordo com estimativas da ONU, os embates já levaram 350 mil pessoas à beira da fome e milhões a abandonarem suas casas rumo a outros países, em especial o Sudão.

Erramos: o texto foi alterado

Versão anterior desta reportagem dizia, incorretamente, que a língua oficial da Etiópia é o aramaico. O correto é amárico. O texto foi corrigido.

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