Unicamp lança 'Refúgio Acadêmico' para receber estudantes de países em conflito

Instituição dará acolhida humanitária a pesquisadores de nações como Afeganistão e Ucrânia

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São Paulo

Neste ano, dois afegãos e duas afegãs que tiveram seus estudos interrompidos pela ascensão do regime fundamentalista Talibã ganharam a chance de recomeçar a vida universitária em uma instituição de ponta no Brasil.

Alunos de cursos de graduação e pós-graduação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), eles são os primeiros participantes de um novo projeto da instituição voltado para acadêmicos em situação de risco.

O programa Refúgio Acadêmico, lançado no dia 27 de abril, oferece acolhida humanitária a estudantes e pesquisadores afetados por conflitos ou perseguição em seus países de origem.

Campus da Unicamp, em Campinas; universidade criou programa para receber pesquisadores e estudantes de países em conflito - Adriano Vizoni - 6.set.17/Folhapress

Além de ofertar financiamento a esses estrangeiros por meio de bolsas, o programa também os apoia em toda a sua trajetória de migração, da obtenção do visto e da locomoção para o Brasil até as aulas de português na chegada, hospedagem, alimentação, assistência médica e outras etapas da integração deles e de suas famílias.

"É um programa institucional de acolhimento que articula várias frentes da universidade e aproveita a estrutura que já temos para dar suporte a eles: hospital, atendimento psicológico, moradia, restaurantes", explica a professora Ana Carolina Maciel, presidente da Cátedra Sergio Vieira de Mello na Unicamp.

A cátedra, existente em 28 instituições brasileiras e ligada ao Alto Comissariado das Nações Unidas para refugiados (Acnur), é voltada para pesquisa, extensão e ensino vinculados ao tema do refúgio. Um de seus programas é o ingresso especial nas universidades para refugiados, que no caso da Unicamp conta com 15 vagas disponíveis.

O projeto atual, porém, exige uma série de requisitos, como a pessoa já estar no Brasil, com status de refugiado aprovado, dominar o português e ter interrompido um curso superior no país de origem.

"Estamos flexibilizando essas regras e criando um projeto mais ativo, que aceita apátridas, solicitantes de refúgio, pessoas que não necessariamente deixaram um curso em seu país de origem", diz Maciel. "Vivemos a era dos deslocamentos forçados e temos que nos instrumentalizar para receber melhor as pessoas afetadas por essas crises humanitárias."

O projeto começou a ser elaborado em 2021, após o Talibã tomar o poder no Afeganistão. Neste ano, o conflito na Ucrânia, que já levou a um êxodo de mais de 5 milhões de pessoas, reforçou a necessidade de um projeto do tipo. "Todo dia a gente recebe mensagens de pessoas da Rússia e da Ucrânia pedindo socorro, oportunidades, asilo", conta Maciel.

Os quatro primeiros integrantes foram incorporados ao programa por uma força-tarefa emergencial, mas o projeto terá um edital para organizar a entrada dos próximos participantes.

São elegíveis não apenas pessoas oriundas de regiões de conflito, mas também as afetadas por desastres naturais, situações de insegurança alimentar, mudanças climáticas, regimes autoritários e constrangimento por razões étnicas, religiosas, políticas e de gênero.

O programa já vai começar a oferecer bolsas por meio de uma nova iniciativa da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) que destinará R$ 20 milhões, no total, para pesquisadores de países conflagrados como Síria, Ucrânia, Rússia e Afeganistão. O auxílio tem as modalidades de pós-doutorado ou pesquisadores visitantes, ou seja, é voltado para acadêmicos mais experientes. As inscrições (neste link) para a seleção vão até 30 de agosto.

A Unicamp agora busca parcerias para que o Refúgio Acadêmico atenda também outros alunos de graduação, mestrado e doutorado.

Atualmente, a universidade tem 480 alunos estrangeiros na graduação e 908 na pós-graduação, provenientes de 71 países. Desse total, 15 são refugiados.

Segundo o reitor da Unicamp, Antônio José de Almeida Meirelles, a temática do refúgio "está na origem da Unicamp". Fundada em 1966, período da ditadura militar, a universidade teve no seu corpo docente original alguns brasileiros vindos do exílio em outros países. A partir da década de 1970, também acolheu pesquisadores asilados políticos da ditadura argentina.

Mais recentemente, a instituição recebeu estudantes haitianos afetados pelo terremoto de janeiro de 2010, além de sírios que fugiram da guerra civil.

Ele observa que a motivação para a acolhida a refugiados é não só humanitária, mas também acadêmica. "A vinda desses talentos aumenta nossa interação com o mundo. Eles podem dar continuidade aos estudos, ganham um fôlego para reorganizar sua vida e ao mesmo tempo contribuem com a nossa atividade científica e com a nossa comunidade", afirma.

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