Descrição de chapéu Folhajus

Secretário-geral da OEA terá de indenizar brasileiro tirado de órgão de direitos humanos

Declarações de Luis Almagro em processo de sucessão na CIDH causaram danos morais e profissionais, diz corte

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Washington | AFP

Uma corte administrativa da OEA (Organização dos Estados Americanos) decidiu que o secretário-geral da instituição, o uruguaio Luis Almagro, causou danos morais, pessoais e profissionais a Paulo Abrão, ex-secretário-executivo da CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos) por declarações feitas quando decidiu não renovar o mandato do brasileiro à frente do colegiado.

Abrão assumira o cargo no braço da entidade em agosto de 2016 e, em 2020, dias após o vencimento do mandato, Almagro não renovou sua permanência, sem consulta prévia, em meio a denúncias apresentadas contra ele à corregedora do órgão, Neida Pérez.

Paulo Abrão, ex-secretário executivo da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, durante debate na ONU, em Genebra, na Suíça
Paulo Abrão, ex-secretário executivo da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA, durante debate na ONU, em Genebra, na Suíça - Eric Bridiers/U.S. Mission Photo/Divulgação

À época, Almagro disse que "a seriedade e a gravidade das reclamações" não permitiam que o mandato fosse renovado. Uma fonte com conhecimento do assunto afirmou à agência de notícias AFP em 2020 que haviam mais de 60 denúncias de "assédio laboral" e de "manipulação de concursos e contratações" e que muitos funcionários acabaram saindo da CIDH por esse motivo.

A direção da comissão, porém, havia se manifestado de forma unânime favoravelmente à manutenção do brasileiro em seu posto e criticou a decisão de Almagro. Segundo a CIDH disse à época, até então o secretário-geral não tinha feito nenhum questionamento sobre o procedimento de renovação.

Em 2020, Colômbia, EUA e Brasil demonstraram insatisfeações com o trabalho de Abrão e pressionavam por sua saída —eles pediam para que Almagro controlasse a atuação da CIDH, que estaria intervindo excessivamente em temas domésticos desses países.

O Brasil já tinha na Presidência Jair Bolsonaro (PL), cuja gestão considerava que Abrão tinha uma orientação ideológica à esquerda, por ter trabalhado no governo de Dilma Rousseff (PT) como secretário nacional de Justiça. Comunicados da CIDH sobre o aumento da violência policial no país ajudaram a azedar a relação com o governo brasileiro.

Durante a disputa, tanto a comissão quanto Almagro fizeram declarações que, segundo a sentença da corte administrativa, causaram os danos a Abrão. Agora, a secretaria-geral da OEA deve indenizar o brasileiro com o equivalente a 12 meses de seu salário, além de pagar os custos legais do processo.

Almagro não terá de indenizar Abrão pela não recondução em si, pois a corte considerou que o contrato terminou "pelo vencimento de seu prazo".

Procurada pela AFP, a secretaria-geral da OEA disse que "sempre cumpriu as decisões e recomendações do tribunal" e insistiu que a corte "reconhece que o contrato em questão terminou não por conclusão decidida pela autoridade nomeadora, mas pelo vencimento do prazo".

Também à agência de notícias Abrão afirmou considerar que esse ponto também lhe é favorável, pois indica que sua estada no posto não chegou ao fim "por outros motivos" que não o fim do período estipulado no posto.

O secretário-geral da OEA, Luis Almagro, durante a 52ª assembleia geral do órgão, em Lima, no Peru
O secretário-geral da OEA, Luis Almagro, durante a 52ª assembleia geral do órgão, em Lima, no Peru - Cris Bouroncle/AFP

"Para mim isso é uma vitória muito significativa, porque limpa meu nome", afirma. O brasileiro diz ainda que, para ele, o mais importante era saber se Almagro havia cumprido todos os requisitos formais no processo de não recondução e que "o tribunal afirma de maneira contundente que não, ele não o fez".

Doutor em direito, Abrão foi secretário-executivo do Instituto de Políticas Públicas em Direitos Humanos do Mercosul e presidente da Comissão da Anistia no Brasil.

A AFP também procurou a CIDH, que não quis comentar. Dos seis juízes do tribunal, apenas dois discordaram da sentença.

Criada pela OEA em 1959 e com sede em Washington, a CIDH é uma instituição do Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos, junto com a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Em março de 2020, Almagro foi reeleito ao cargo de secretário-geral da OEA para o período 2020-2025, com 23 votos contra 10.

Na gestão do uruguaio, forte crítico do chavismo, a OEA deixou de ser um organismo facilitador do diálogo pelo fim de crises institucionais e pró-defesa de direitos humanos para ganhar contorno de instituição política, que adota uma linha clara de defesa da direita na América Latina.

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