Malásia nomeia como premiê Anwar Ibrahim, que havia 30 anos tentava chegar ao poder

Político chegou a ser preso por sodomia e diz que vai combater racismo, mas vê desafio com supremacistas no Parlamento

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Guarulhos

Após três décadas de mais reveses do que êxitos em sua trajetória política, Anwar Ibrahim, 75, foi nomeado nesta quinta (24) premiê da Malásia, país de 34 milhões de pessoas no Sudeste Asiático.

A nomeação foi feita pelo rei Al-Sultan Abdullah após um impasse entre as forças políticas malaias. O país foi às urnas no sábado (19), mas nenhuma coalizão conquistou maioria no Parlamento de 222 assentos. A Pakatan Harapan (pacto da esperança), do agora premiê, conseguiu 82 cadeiras —para a maioria, porém, são necessárias 112.

Anwar Ibrahim, nomeado premiê da Malásia, durante evento em Kuala Lumpur - Mohd Rasfan - 22.nov.22

A Malásia é, ao mesmo tempo, uma democracia parlamentar e uma monarquia constitucional. Ao rei, cabe a última palavra na nomeação de primeiros-ministros no caso de um impasse do tipo.

Abdullah até tentou um governo de unidade com a aliança conservadora Perikatan Nasional, do ex-premiê Muhyiddin Yassin, que obteve 73 cadeiras no Legislativo, mas o plano não vingou.

Em um comunicado, o monarca adotou tom conciliatório. "Lembro a todos que vencedores nem sempre vencem, assim como perdedores nem sempre perdem. Estendam as mãos e atuem como membros do Dewan Rakyat [Câmara baixa] para o futuro de nossa amada nação."

Anwar Ibrahim iniciou sua carreira política como aliado de Mahathir Mohamad, o premiê mais duradouro da Malásia, que ficou no cargo por 22 anos, mas a relação entre os dois azedou no final da década de 1990, quando Ibrahim começou a denunciar casos de corrupção.

O agora primeiro-ministro fundou um movimento de protesto chamado Reforma e, desde então, tornou-se líder da oposição. Também foi preso, duas vezes, acusado de sodomia —prática considerada crime punível com até 20 anos de prisão no país— e corrupção, alegações que ele e ONGs como a Anistia Internacional dizem ter motivações políticas.

Ele chegou a comparecer a uma audiência judicial com sinais de espancamento em 1998, época de sua primeira prisão. Na ocasião, quando estava com um dos olhos inchados e marcas na cabeça e no pescoço, disse que policiais o mandaram ficar em pé e o socaram.

Em entrevista à agência Reuters dias antes da eleição, Ibrahim afirmou que um eventual governo seu buscaria dar ênfase ao combate à corrupção, ao racismo e à intolerância religiosa. Por diversas vezes, ele pediu o fim de políticas que favorecem certos grupos e o fim do que chama de um sistema clientelista.

Para amenizar as críticas e, por vezes, desinformações disseminadas por opositores, o novo premiê usou sua primeira entrevista coletiva, pouco após a cerimônia de posse, para dizer que não deixará de defender os direitos de malaios étnicos e o islã como religião oficial.

"Nunca comprometeremos a boa governança, o combate à corrupção, a independência judicial e o bem-estar dos malaios", disse ele, antes de puxar palavras de ordem como "reformasi" (reforma), seu slogan político durante os anos em que esteve na oposição.

Nação multiétnica, a Malásia tem 61,8% de sua população formada por malaios, de maioria islâmica, além de 21,4% de chineses e 6,4% de indianos, segundo dados oficiais de 2016. A política local tem sido marcada por um amplo debate sobre a supremacia malaia, que parece ter ganhado força no pleito atual.

A legenda mais bem votada nas eleições foi o PAS, o Partido Islâmico, que conquistou sozinha 49 cadeiras no Parlamento. A sigla prega a rígida adoção da sharia, a lei islâmica, e seu líder, Abdul Hadi Awang, já defendeu que a Constituição ganhe uma interpretação islâmica.

Ele pediu a adoção de punições como amputação, espancamento e apedrejamento até a morte. Para muitos malaios, então, Ibrahim poderia representar uma espécie de antídoto aos ímpetos radicais e supremacistas. Resta saber se o novo premiê conseguirá governabilidade.

Com AFP, Reuters e The New York Times

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