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Goshiwon: Brasileiras contam como é viver em microapartamento de 3 m² na Coreia do Sul

Entenda como são as moradias bem pequenas, com valores muito mais baratos do que os de apartamentos convencionais

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Priscila Carvalho
Rio Grande do Norte | BBC News Brasil

O primeiro contato da influencer Thais Midori, 27, com a Coreia do Sul foi há 16 anos, com as bandas de K-pop. Aos 20 anos, descobriu que podia fazer um intercâmbio para o país e estudar a língua. Desde então, viaja para o território coreano todo ano, sempre com o intuito de explorar a cultura. Na primeira vez, permaneceu seis meses e, depois, voltou durante as férias de janeiro e de julho.

Ao chegar lá, ela se deu conta de que a hospedagem era muito cara —e uma maneira de economizar seria ficar nos microapartamentos conhecidos como "goshiwon", que têm apenas cerca de 5 metros quadrados e, às vezes, 3. "Tem em todos os lugares, em toda esquina. São miniprédios e cada andar tem vários apartamentos", conta à BBC News Brasil.

Microapartamentos foram solução de Thaís Midori para alto custo de hospedagem em Seul
Microapartamentos foram solução de Thaís Midori para alto custo de hospedagem em Seul - Arquivo pessoal

Na maioria das vezes em que ia estudar no país, ela optava por dormir nesse tipo de alojamento. "Em um hotel barato, 17 dias, por exemplo, custam R$ 3.500", afirma. Já um aluguel desse tipo de acomodação sai, em média, por R$ 1.900 por mês, segundo ela. Assim como Thais, a influenciadora e mestranda Amanda Gomes, cearense de 30 anos, também é entusiasta da cultura oriental. Com uma bolsa de estudos que recebeu na faculdade, ela viajou para a Coreia do Sul e morou no local por um ano.

Ao retornar ao Brasil, resolveu que voltaria para Seul e passaria mais tempo. Para isso, fez um planejamento financeiro de um ano e foi estudar coreano. As acomodações, porém, estavam além do seu orçamento, e ela também recorreu a um "goshiwon". "Vivia na linha da sobrevivência, e essa moradia é muito barata aqui", conta ela, que mora na Coreia há quatro anos.

O que é um 'goshiwon'?

"Goshiwons" são moradias pequenas e bem mais em conta do que apartamentos convencionais coreanos.

Foram pensados para estudantes que desejam ficar muito tempo se preparando para concursos públicos, que usarão o alojamento somente para dormir, ou para idosos que moram sozinhos e não têm condições financeiras de arcar com aluguéis mais caros. Quando o inquilino escolhe morar em um desses, ele pode optar por apartamentos com janela, sem janela, com banheiro privado ou compartilhado. As cozinhas e lavanderia são coletivas, e alguns andares são divididos para homens e mulheres.

Cômoda, pia do banheiro e cama aparecem lado a lado em microapartamento de Thais Midori
Cômoda, pia do banheiro e cama aparecem lado a lado em microapartamento de Thais Midori - Arquivo pessoal

O "goshiwon" de Amanda, o modelo mais barato, tinha uma cama, uma porta como se fosse um armário, uma mesa e uma cadeira. "Eu tenho 1,68 m de altura, a cama era menor que eu, e meus pezinhos sobravam. As roupas ficavam [penduradas] em cima de mim, e eu tinha que deitar, pois se sentasse batia a cabeça nas peças", relembra, rindo. Se esticasse os braços, conta, encostava nas duas paredes.

"O meu não tinha ar-condicionado, só aquecedor. Aí ficava com ventilador. Uma vez fiquei com febre e pedi para me mudar de quarto para um que tivesse janela para ter uma ventilação melhor", lembra a cearense.

Já o de Thais era um pouco maior, pois tinha banheiro interno, uma cama e uma escrivaninha. "Sempre pego com banheiro. É normal molhar o banheiro toda vez que ia tomar banho", diz.

Segundo as brasileiras, a grande vantagem dessa moradia é a isenção de "aluguéis-caução" e um contrato de um ano. Diferentemente das outras habitações coreanas, que exigem um valor antecipado, basta a pessoa ter dinheiro para pagar o aluguel. A moradia é uma alternativa para quem não tem tantos recursos financeiros e, ainda assim, deseja morar na capital, Seul, e em outras cidades coreanas, segundo elas.

Dependendo do apartamento, o banheiro pode ser interno ou compartilhado
Dependendo do apartamento, o banheiro pode ser interno ou compartilhado - Gamaleldin Tarakhan

'Desconfortável'

Devido ao preço, não há muitas regalias em acomodações como essa. Quanto mais barato for, menos facilidades o apartamento terá. Há locais em que, mesmo com janela, a abertura dá para o corredor, e o inquilino nunca verá a rua. "Não conheço quem mora lá porque quer, mas por razões financeiras. Naquela época, eu não tinha condições financeiras. Se Deus quiser não volto mais, já que é bem desconfortável, você ouve tudo e não tem privacidade. Dá para ouvir as pessoas conversando e brigando", diz Amanda.

De acordo com Thais, o maior problema em seu "goshiwon" era a circulação de ar. Nesses apartamentos, quem controla o ar-condicionado e o aquecedor, segundo ela, são os donos do imóvel, o que dificulta a regulagem dos aparelhos caso a pessoa sinta muito frio ou calor. "Eu não podia tomar banho quente nem no inverno, porque o quarto ficava todo úmido. Mesmo se eu abrisse a janela não batia vento. O ar não sai."

Ela relembra que pediu para ligar o ar-condicionado por mais tempo, e a proprietária cedeu um ventilador. "No verão é muito quente. Tinha uma vizinha de Manaus que não conseguia acreditar. É um ar quente que fica em volta de você o tempo todo. Já no frio, eu tinha cobertor elétrico", diz Thais.

Neste goshiwon, a cama fica colada à porta do banheiro
Neste goshiwon, a cama fica colada à porta do banheiro - Gamaleldin Tarakhan

Em relação às cozinhas, alguns gostam dos "mimos" oferecidos pelos proprietários dos "goshiwons". No local, sempre há miojo e arroz para os moradores. "Tinha dia que comia miojo e arroz. Sempre vai ter um arroz pronto na panela, sacos de miojo para fazer e kimchi [acelga fermentada]", conta Thais.

As brasileiras afirmam que os valores dessas acomodações são razoáveis para morar no país. Geralmente, os preços dos imóveis são exorbitantes, e é melhor escolher um "goshiwon" e poupar dinheiro durante a estadia na Coreia do Sul, na avaliação delas. "Para quem quer viajar e passar muito tempo, como 60 ou 90 dias, pode ser uma boa alternativa", diz Amanda.

Nunca alugue sem visitar

É muito comum ver placas pelos bairros anunciando "goshiwons", além de conseguir indicações de amigos, segundo as entrevistadas. Também há sites que disponibilizam esse tipo de imóvel.

No entanto, há lugares que podem ter problemas com mofo, por exemplo, de acordo com os relatos. Por isso, as brasileiras dizem que é importante visitar a acomodação antes de fechar qualquer contrato.

Também é comum encontrar esses miniapartamentos em sites de hospedagem, como Airbnb, para estadias de longa ou curta duração. O valor mensal pelo aplicativo, por exemplo, pode sair por US$ 700 (cerca de R$ 3.500). "Você tem uma proteção do app, porque quando você lida diretamente com um coreano é mais difícil", afirma Thais.

Thais Midori mostra dimensões de microapartamento
Thais Midori mostra dimensões de microapartamento - Arquivo pessoal

As brasileiras alertam que há casos de encontrar cabelo no banheiro, lençol que não foi bem limpo e até de outra pessoa. E dizem que é necessário ir com a mente aberta, pois a experiência pode ser bem claustrofóbica, segundo as brasileiras. E elas recomendam que você domine um pouco de coreano ou vá com alguém que domine a língua, pois muitos proprietários são idosos e não falam inglês ou outro idioma.

'Miniapartamentos' maiores

Outra opção comum de moradia são os apartamentos menores que os tradicionais, mas um pouco maiores do que os de 5 ou 3 metros quadrados. Eles são chamados de one room (um quarto) —parecidos com quitinetes convencionais do Brasil. Alguns podem ter até 10 ou 16 metros quadrados. Para essas moradias, porém, é necessário um contrato de um ano, com depósito.

"O ser humano se adapta às situações. Questão de espaço já não me incomoda tanto", diz Amanda, que mora em um desses atualmente e em breve se mudará para um apartamento de dois quartos.

Amanda resolveu retornar à Coreia do Sul após morar no país por um ano
Amanda resolveu retornar à Coreia do Sul após morar no país por um ano - Arquivo pessoal

Mesmo sendo mais caro que os "goshiwons", esses também podem ser uma alternativa para quem tem um pouco mais de dinheiro, mas ainda assim não consegue pagar por um apartamento convencional de um ou dois quartos. "São apartamentos mais antigos e, às vezes, você precisa dar um caução de US$ 1.000."

Atualmente, a cearense trabalha criando conteúdo na internet sobre a Coreia e cursa mestrado em turismo e história, além de trabalhar para órgãos ligados à Unesco. Ela não pretende voltar ao Brasil.

"Trabalho com conteúdos de cultura e turismo e, atualmente, trabalho ajudando brasileiros que querem viajar ou estudar no país", diz. Thais também tem seus canais nas redes sociais, nos quais compartilha curiosidades sobre o território coreano.

- Este texto foi originalmente publicado aqui.

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