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União Europeia

Reforma da Previdência sai barata para a França, mas pode ser insuficiente

Turbulentas manifestações contra projeto de Macron reforçam tradição francesa de erguer barricadas contra a perda de direitos

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São Paulo

As turbulentas manifestações contra a reforma previdenciária branda perseguida por Emmanuel Macron reforçam a tradição francesa de erguer barricadas contra a perda de direitos. Mesmo que, neste caso, esteja em jogo o financiamento de um Estado capaz de bancar outras políticas igualitárias.

Os protestos contra a reforma acontecem quatro anos depois dos ruidosos atos dos chamados "coletes amarelos", que agiram, algumas vezes violentamente, contra aumentos de impostos.

Em Paris, são raros os meses ou semanas em que não há protestos de grupos específicos partindo da Praça da República ou da Concórdia, como de agentes da saúde, professores, estudantes ou imigrantes.

Manifestantes franceses protestam contra a reforma previdenciária na praça da Concórdia, em Paris - Thomas Samson - 16.mar.23/AFP

Essa tradição talvez ajude a explicar por que a França, em um mundo e numa Europa cada vez mais desiguais, siga como uma ilha de menor disparidade de renda entre ricos e pobres.

Num dos raros exemplos globais, a parcela da renda total apropriada pelos 10% mais ricos na França caiu de 33,3% para 31% nos últimos 20 anos. Já a dos 50% mais pobres aumentou de 20,7% para 23,2%.

Segundo a base de dados sobre desigualdade WID (World Inequality Database), da Escola de Economia de Paris e da qual participa o economista Thomas Piketty, vários países europeus não reduziram a desigualdade no período ou foram na direção contrária.

Na Alemanha, maior e mais eficiente economia da região, os 10% mais ricos detinham 32,3% da renda há 20 anos. Agora, concentram 37,4% –acima da média europeia, de 37%.

Se esses dados ajudam a corroborar a estratégia dos franceses para manter direitos e conter o aumento da desigualdade, outros indicadores mostram que o país não está levando em conta números que justificam a reforma previdenciária proposta –sobretudo a elevação de 62 para 64 anos na idade mínima geral para aposentadorias.

Nos últimos 20 anos, a expectativa de vida dos franceses aumentou quase o dobro dos anos a mais de trabalho que a reforma propõe. Passou de 79,3 anos para 83 (+3,7 anos), situando-se agora dois anos acima da média dos países da OCDE, clube dos 38 países mais desenvolvidos.

Reformas previdenciárias miram o futuro. Na França de 2050, segundo projeções do Instituto Nacional de Estatística e de Estudos Econômicos francês, a expectativa de vida superará os 88 anos e, mantidas as condições previdenciárias e migratórias atuais, somente uma em cada duas pessoas terá idade para trabalhar —descontando-se crianças, adolescentes e idosos.

Com terceira maior despesa global em aposentadorias e, segundo o FMI, o maior gasto público do mundo, bastante direcionado à área social, a atual proposta de reforma pode não só sair barata para a França como mostrar-se absolutamente insuficiente em poucos anos.

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